A missão da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), que se deslocou a Bissau para tentar encontrar uma saída para a crise política e uma data consensual para as eleições, deixou o país no fim de semana, denunciando, em comunicado, ter sido alvo de uma ameaça de expulsão por parte do Presidente guineense.
Após uma controversa visita de Estado à Rússia, Umaro Sissoco Embaló deverá regressar esta segunda-feira (03.03) a Bissau. À sua espera, diz à DW o analista político Tamilton Teixeira, está um país “cansado” do modus operandi a que “foi obrigado a viver nos últimos cinco anos”.
Domingos Simões Pereira (DSP), tido como o maior opositor do Presidente Umaro Sissoco Embaló, disse-se, entretanto, “disponível para os guineenses”. Uma declaração que, aos olhos de Tamilton Teixeira, foi “precipitada”.
Para o sociólogo, mesmo com o fim do mandato de Sissoco Embaló, DSP “não deve assumir a Presidência da República automaticamente. “Não é uma prioridade a substituição imediata de Umaro Sissoco Embaló enquanto Presidente da República”, assevera.
DW África: O trabalho da missão da CEDEAO começou por ser muito contestado, tendo havido denúncias da oposição de que a missão só estava a ouvir as alas pró-Sissoco. A missão reuniu, mais tarde, com os partidos da oposição. E acaba por sair do país ameaçada de expulsão pelo Presidente guineense. Que avaliação se pode fazer de toda esta situação?
Tamilton Teixeira (TT): Talvez fosse necessário a CEDEAO experimentar o que tem sido a atitude de Umaro Sissoco Embaló, porque o seu comportamento não é estranho aos guineenses, nomeadamente àqueles que têm chamado a atenção desde há muito tempo sobre o que tem sido, de facto, o modus operandi de Umaro Sissoco Embaló. Se ao longo deste tempo a CEDEAO esteve a fazer vista grossa, talvez agora tenha sido obrigada a acordar para a realidade.
Há muito tempo que temos vindo a chamar atenção sobre o comportamento muito estranho da CEDEAO em relação à Guiné-Bissau. Em matéria de mediação de conflito, a CEDEAO parecia estar a ignorar a realidade das coisas e a acompanhar posicionamentos e tendências que não são propriamente corretas.
DW África: Este “abre-olhos” poderá trazer consequências a Sissoco Embaló ou ao país?
TT: Se poderá trazer consequências, eu não sei. O importante é que isto vai chamar a atenção da União Africana e das Nações Unidas. Quanto à CEDEAO, ninguém sabe o que a move nos últimos tempos.
A CEDEAO foi alertada várias vezes para a violação deDireitos Humanos [na Guiné-Bissau], para a agressão às pessoas, a jornalistas, analistas, políticos, oposição política. Ou seja, sempre foi comunicado à CEDEAO o que tem sido o comportamento e a atitude de Umaro Sissoco Embaló. Porque nós não estamos a falar de uma simples crise ou uma certa instabilidade que acontece normalmente nos países como Senegal, Angola, Moçambique, ou nos países que compõem a CEDEAO. Nós estamos a falar de algo que é muito sui generis.
Sissoco Embaló é uma figura política muito estranha. É algo jamais visto no cenário político guineense.
DW África: Sissoco Embaló deverá regressar ao país esta tarde. Que país o espera, depois de todo este imbróglio?
TT: Do ponto de vista da sociedade civil, é notório um certo cansaço pelo estilo a que o país foi obrigado a viver nos últimos cinco anos.
Acho que o que causa irritação a Umaro Sissoco Embaló é o facto de se ter dado conta de que perdeu os cinco anos [do mandato] a fazer outros expedientes que não são os de um Presidente da República. [A Guiné-Bissau continua a ser] um país que continua a ser um país muito pobre, o mais pobre da sub-região. Apesar da propaganda, o guineense continua sem poder de compra e acesso à escola. O país continua numa situação de imprevisibilidade. Eu costumo dizer que, em relação à Guiné-Bissau, imprevisibilidade é a única certeza que podemos ter.
DW África: Domingos Simões Pereira disse-se, entretanto, “disponível para os guineenses”. DSP tem também defendido que a solução para o país passa pela reposição da comissão permanente da Assembleia Nacional Popular. Concorda que esta seja a solução para o país? E como é que avalia as palavras de DSP?
TT: Eu não estou totalmente de acordo com a primeira afirmação, a segunda sim. Eu acho que é preciso restituir a comissão permanente na sua composição, que é oriunda da última eleição.
Mas acho que, tendo em conta a situação que se criou, ele não deve assumir a Presidência da República automaticamente. Não é prioridade a substituição imediata de Umaro Sissoco Embaló enquanto Presidente da República. É prioridade repor as instituições como o Supremo Tribunal da Justiça, CNE e outras. Portanto, acho que foi uma resposta precipitada.
Crédito: Link de origem