A Venezuela realiza neste domingo (25) sua primeira eleição geral desde o pleito de 2018, que garantiu um novo mandato a Nicolás Maduro sob fortes acusações de fraude. Desta vez, o governo chavista convoca os venezuelanos às urnas para eleger 569 autoridades públicas — entre deputados nacionais, governadores e legisladores regionais — em meio a uma crise social e com o nacionalismo como retórica dominante.
O pano de fundo deste domingo é marcado por repressão, fragilidade institucional e êxodo contínuo. Mas o foco estratégico recai sobre um velho impasse territorial: a Guiana Essequiba.
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Essequibo nas eleições: disputa por soberania territorial
Reivindicada desde o século XIX, a Guiana Essequiba tornou-se o centro da mobilização política do chavismo para inflamar o sentimento patriótico e reafirmar a soberania territorial. A eleição em áreas estratégicas como El Dorado e Las Claritas ocorre após o referendo de dezembro de 2023, quando 96% dos votantes apoiaram a anexação do território.
A ação contraria recomendação da Corte Internacional de Justiça, que pediu à Venezuela que se abstivesse de alterar unilateralmente a situação do território disputado. Ainda assim, o Conselho Nacional Eleitoral organizou 12 centros de votação no estado de Bolívar para acolher mais de 21 mil eleitores.
Hegemonia chavista e divisão da oposição
A liderança do PSUV transmite uma imagem de normalidade institucional. Diosdado Cabello declarou que o povo “não será parado pelo ódio”, enquanto a prefeita de Caracas, Carmen Meléndez, chamou a eleição de “celebração democrática”. O discurso oficial, porém, esbarra em denúncias sobre cerceamento de campanha, desequilíbrios de mídia e falta de recursos para candidatos opositores.
Do outro lado, a oposição está rachada. María Corina Machado mantém o boicote, enquanto Henrique Capriles e outros grupos optaram por disputar o pleito, mesmo apontando práticas desleais. A falta de unidade opositora enfraquece qualquer tentativa concreta de alternância no poder.
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Abstenção em alta: desconfiança popular e ceticismo político
Dados preliminares apontam abstenção de até 84,9%, superando os 70% registrados em eleições anteriores. A população demonstra cansaço e desconfiança quanto ao sistema eleitoral, participando sem entusiasmo e sem expectativa real de mudança.
Esse número reforça a percepção de um eleitorado que, apesar de votar, o faz com distanciamento crítico. A abstenção, nesse contexto, torna-se uma forma de resistência civil silenciosa.
Guiana Essequiba mobilizada: presença do Estado e mensagem geopolítica
Mais de 21.500 venezuelanos se mobilizaram neste domingo em áreas da Guiana Essequiba. As imagens de filas em centros de votação indígenas e mineradores — como o Miguel Antonio Mejías, em El Dorado — foram amplamente divulgadas por veículos como a
O ministro da Defesa, Vladimir Padrino López, afirmou que a Venezuela “não ameaça nem aponta armas, mas reafirma sua soberania por vias políticas e diplomáticas”. A mensagem é clara: o governo busca legitimar, por meio das urnas, uma reivindicação histórica.
Narrativas em disputa: mídia internacional e vozes locais
A cobertura da eleição fora da Venezuela é tímida. Observadores internacionais, como os enviados de Burkina Faso, relataram “normalidade e profissionalismo” nos centros visitados, sem registro de incidentes.
Curiosamente, eleitores têm recorrido à imprensa estrangeira para expressar sua experiência: “foi um dia civilizado e sem problemas”, disseram à teleSUR. É uma tentativa de combater o silêncio midiático e mostrar ao mundo uma outra versão da realidade venezuelana.
O que está em jogo: projeções e impacto internacional
A incorporação eleitoral da Guiana Essequiba abre um novo capítulo na diplomacia regional. O processo pode fortalecer a narrativa interna do governo, mas também intensifica o isolamento diplomático de Caracas.
Embora o resultado não deva alterar significativamente a composição de poder no país, ele será determinante para o futuro da mediação internacional via OEA e ONU — além de influenciar diretamente as relações com Brasil, Colômbia e EUA.
Soberania popular e autodeterminação nas urnas
A eleição deste domingo reafirma a soberania do povo venezuelano e a vocação democrática do país, que, mesmo diante de desafios institucionais e pressões externas, mantém sua capacidade de decidir seus rumos políticos por meio do voto. A ampla participação em regiões estratégicas, como a Guiana Essequiba, simboliza um esforço de autodeterminação nacional.
Nenhuma potência estrangeira tem legitimidade para interferir na vontade expressa por milhões de venezuelanos, num processo conduzido com institucionalidade, paz e presença popular.

Jornalista e Advogado. Especialista em política nacional e bastidores do poder. Desde 2009 é autor do Blog do Esmael.
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