Venezuela: Repressão brutal desde as eleições

  • As autoridades venezuelanas e os “coletivos” cometeram violações generalizadas desde as eleições presidenciais de 28 de julho de 2024. As autoridades eleitorais declararam que Nicolás Maduro havia sido reeleito, apesar das evidências sólidas em contrário.
  • O governo venezuelano assassinou, torturou, deteve e fez desaparecer à força pessoas que buscavam mudanças democráticas, e muitas outras fugiram do país.
  • Os governos deveriam apoiar os esforços para garantir a responsabilização pelas graves violações dos direitos humanos cometidas na Venezuela, pedir às autoridades venezuelanas que libertem as pessoas detidas arbitrariamente e que revelem o paradeiro das pessoas submetidas a desaparecimentos forçados, além de ampliar o acesso à proteção internacional para venezuelanos que fogem da repressão.

(Washington D. C.) – As autoridades venezuelanas e os “coletivos” cometeram violações generalizadas desde as eleições presidenciais de 28 de julho de 2024, disse a Human Rights Watch em um relatório divulgado hoje.

O relatório de 104 páginas, “Punidos por buscar mudanças: assassinatos, desaparecimentos forçados e detenções arbitrárias após as eleições de 2024 na Venezuela”, documenta violações de direitos humanos cometidas contra manifestantes, transeuntes, líderes da oposição e críticos durante os protestos pós-eleitorais e nos meses que se seguiram. O relatório associa autoridades venezuelanas e grupos armados pró-governo conhecidos como “colectivos” a violações generalizadas de direitos humanos. Essas violações incluem o assassinato de manifestantes e transeuntes, desaparecimentos forçados de membros da oposição e de cidadãos estrangeiros, detenções arbitrárias e processos judiciais contra adolescentes e outras pessoas, além de tortura e maus-tratos a detidos.

“O governo venezuelano assassinou, torturou, deteve e fez desaparecer pessoas que lutaram pela democracia na Venezuela”, disse Juanita Goebertus, diretora da Divisão das Américas da Human Rights Watch. “A comunidade internacional deveria reafirmar seu compromisso com a democracia e os direitos humanos na Venezuela e pressionar para que o governo de Maduro seja responsabilizado por suas atrocidades.”

A Human Rights Watch entrevistou 101 pessoas, incluindo vítimas e suas famílias, testemunhas, defensores de direitos humanos, jornalistas e outras fontes locais, por telefone e pessoalmente, entre julho de 2024 e abril de 2025. A Human Rights Watch também analisou e verificou 76 vídeos e 17 fotografias relacionados a episódios de repressão pós-eleitoral encontrados em plataformas de mídia social ou enviados diretamente aos pesquisadores, certidões de óbito de pessoas que morreram durante os protestos e outras documentações relacionadas a detenções e processos criminais.

Após as eleições, o Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela (CNE) anunciou que Nicolás Maduro havia sido reeleito presidente. Observadores internacionais das eleições, em especial o painel de especialistas eleitorais das Nações Unidas e o Centro Carter, levantaram sérias preocupações sobre a legitimidade dos resultados. O Centro Carter concluiu que as atas eleitorais coletadas pela oposição mostravam que, com grande probabilidade, o candidato da oposição Edmundo González havia vencido por uma margem significativa.

Vinte e quatro manifestantes e transeuntes foram mortos durante os protestos em todo o país imediatamente após as eleições. As evidências coletadas pela Human Rights Watch indicam que as forças de segurança venezuelanas seriam responsáveis por algumas dessas mortes. Em outros casos, os “coletivos” seriam os responsáveis. Inicialmente, as forças de segurança usaram gás lacrimogêneo e efetuaram detenções durante os protestos, seguidas por ataques ou intimidações por membros dos “coletivos” contra aqueles que continuavam se manifestado. 

Desde as eleições, mais de 2.000 pessoas foram detidas por protestar, criticar o governo ou apoiar a oposição. As autoridades acusaram centenas de pessoas de delitos definidos de maneira ampla, como “incitação ao ódio” e “terrorismo”, que acarretam penas de até 30 anos de prisão.

Vários detidos foram vítimas de desaparecimento forçado, obrigando seus familiares a procurá-los em diversos centros de detenção e até mesmo em necrotérios. Entre as vítimas de desaparecimentos forçados, encontram-se membros da oposição e seus familiares, bem como dezenas de cidadãos estrangeiros.

Em 14 de setembro de 2024, as forças de segurança venezuelanas detiveram o colombiano Manuel Tique, de 32 anos, funcionário do Conselho Dinamarquês para Refugiados, quando ele cruzava a fronteira terrestre entre a Colômbia e a Venezuela para trabalhar. As autoridades venezuelanas se recusaram a fornecer à sua família informações sobre o seu paradeiro ou sobre as acusações criminais contra ele. Sua família suspeita que ele esteja detido na prisão Rodeo I, de acordo com informações obtidas por um ex-detento que esteve preso lá.

Em 8 de janeiro, Lucas Hunter, um turista franco-americano de 37 anos, disse à sua irmã que as forças de segurança venezuelanas o detiveram perto da fronteira com a Colômbia. Em uma mensagem de áudio enviada à sua família naquele dia, ele disse que as forças de segurança o interrogaram por quatro horas e que provavelmente o levariam para Caracas. Desde então, sua família não teve mais notícias dele. As autoridades lhes negaram informações sobre o seu paradeiro e o motivo de sua detenção.

As autoridades venezuelanas detiveram arbitrariamente um grande número de pessoas em flagrante violação do devido processo legal. Muitos tiveram negada a representação por um advogado de sua escolha ou o acesso aos seus processos. Alguns foram processados em audiências virtuais e em grupo, o que comprometeu os seus direitos.

Em 10 de dezembro, Jesús Armas, ex-vereador de Caracas e membro da campanha da oposição, foi detido à força por homens encapuzados ao sair de uma cafeteria na capital. Durante quase uma semana, as autoridades se recusaram a divulgar seu paradeiro ou a aceitar o pedido de habeas corpus apresentado por sua família. Mais tarde, Armas disse a seu parceiro que havia sido mantido em um centro de detenção clandestino, onde agentes do Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (SEBIN) o torturaram, sufocando-o com um saco, enquanto o interrogavam sobre pessoas da oposição. Armas continua detido sem acesso a visitas de sua família ou advogado.

O Ministério Público afirma que libertou centenas de detidos, embora muitos continuem com processos criminais em aberto. Muitos foram obrigados a assinar documentos que os proíbem de revelar informações sobre sua detenção ou processos judiciais. Alguns foram forçados a gravar vídeos afirmando que seus direitos foram respeitados durante a detenção.

Desde o início da repressão, muitos venezuelanos fugiram do país em busca de proteção no exterior. Muitos enfrentam sistemas de asilo com atrasos na América Latina e processos de reassentamento nos Estados Unidos que foram suspensos sob a administração de Trump.

O governo Trump parece estar priorizando a cooperação em questões de migração e a libertação de cidadãos americanos detidos na Venezuela em detrimento de esforços mais amplos para defender os direitos humanos e o Estado de Direito na Venezuela. Dada a influência diplomática dos Estados Unidos na região e as preocupações com a migração na América Latina, é provável que outros governos sigam o exemplo, disse a Human Rights Watch.

É provável que Maduro explore essa cooperação de curto prazo para tentar legitimar sua concentração de poder. Ao fazer isso, ele lançaria as bases para o aumento da repressão na Venezuela, o que poderia desencadear uma nova onda de refugiados e migrantes venezuelanos.

Os esforços internacionais deveriam se concentrar em combater o sistema de incentivos do regime de Maduro, que recompensa autoridades e forças de segurança abusivas para garantir sua lealdade, enquanto pune, tortura e força críticos ao exílio, opositores e até mesmo membros das forças de segurança que apoiam a democracia e os direitos humanos. Eles deveriam apoiar os esforços para garantir a responsabilização, inclusive impondo sanções individuais e apoiando o trabalho da Missão Internacional Independente de Apuração de Fatos sobre a Venezuela (FFM, na sigla em inglês) e do Tribunal Penal Internacional (TPI).

Os governos estrangeiros deveriam ampliar a assistência às organizações da sociedade civil venezuelana, a jornalistas independentes e às organizações que defendem a democracia e os direitos humanos. Eles também deveriam ampliar urgentemente a proteção às pessoas forçadas a deixar o país.

“Com oito milhões de venezuelanos no exterior, a situação na Venezuela constitui a crise de direitos humanos com maiores consequências no hemisfério. Uma resposta internacional continuada e baseada em princípios é crucial para toda a região”, disse Goebertus. “Os governos estrangeiros deveriam garantir que qualquer aproximação com o governo de Maduro tenha como objetivo alcançar melhorias verificáveis nos direitos humanos, incluindo a libertação de vítimas de desaparecimento forçado ou detenção arbitrária.”

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