Vivemos um impasse político profundamente preocupante. Graves suspeitas de corrupção pairam sobre figuras centrais do Estado, e o país enfrenta uma situação absurda: o governo avança com uma moção de confiança para tentar restaurar a sua legitimidade, apesar de reconhecer o dilema de provocar eleições. O principal partido da oposição enfrenta também o seu próprio paradoxo: apesar de ter recusado recentemente uma moção de censura para evitar eleições antecipadas, anuncia agora o voto contra essa moção de confiança, mesmo sabendo que isso levará precisamente a tais eleições. Estas contradições dão novos contornos à crise profunda de desconfiança sobre a integridade ética dos nossos representantes políticos, agravando-a dramaticamente com tamanhas evidências de calculismo político-partidário.
Declarações de interesse estáticas e moções partidárias táticas revelam-se claramente insuficientes. Não conseguem acompanhar a complexidade e dinâmica da vida político-económica dos nossos dirigentes, nem evitar eventuais práticas eticamente questionáveis. É precisamente aqui que a tecnologia blockchain oferece uma solução segura e eficaz.
A blockchain funciona através de uma rede descentralizada de computadores, onde cada transação é validada coletivamente, sem necessidade de intermediários que possam manipular a informação. Esta tecnologia já provou a sua eficácia em criptomoedas como a Bitcoin, onde milhares de utilizadores, desconhecidos entre si, confiam, ainda assim, nas transações efetuadas, precisamente porque os registos dessas transações são transparentes e invioláveis. “Este sistema é extremamente resiliente e seguro (se não fosse, o Bitcoin pouco ou nada valeria).
Esta lógica praticamente infalível deve ser imediatamente replicada no sistema político. Assim, urge criar uma blockchain pública, embora com acesso moderado, conhecida como “blockchain pública permissionada”, para restabelecer a confiança política em Portugal. Neste sistema, os políticos beneficiam de uma confiança à prova de bala, devido ao registo contínuo das suas relações empresariais e patrimoniais. Nesta rede blockchain, as informações sobre as transações e rendimentos de cada político vão sendo registadas de forma imutável e inviolável, mas 100% auditável e disponível em tempo real, garantindo que os cidadãos possam sempre verificar a coerência entre a vida pública e privada de cada governante.
Mas como manter a privacidade em dados sensíveis, por exemplo, nomes de clientes ou de parceiros comerciais? A solução existe e está comprovada. Esses detalhes nevrálgicos devem ser protegidos por criptografia avançada, tal como acontece na rede Bitcoin, ficando acessíveis apenas mediante prévia autorização judicial. Instituições credíveis, como o Tribunal de Contas, o Banco de Portugal, a Comissão Nacional de Proteção de Dados, a Comissão Eventual para o Reforço da Transparência no Exercício de Funções Públicas e Estatuto dos Deputados, o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, a Ordem dos Advogados, entre outras, estão em posição de assegurar coletivamente a descentralização da confiança necessária para se operacionalizar com eficácia uma rede blockchain segura e eficaz nos molde descritos.
Na prática, tal descentralização digital é garantida por uma prévia divisão e partilha, entre essas instituições independentes, de parcelas das chaves criptográficas necessárias para se conhecer a identidade de cada político e aceder aos detalhes específicos das respetivas transações. O essencial é que apenas fragmentos dessas “senhas” estejam, a todo o momento, em poder de cada uma dessas entidades, para evitar abusos de poder. Trata-se de distribuir por tais organismos a gestão dos códigos das identidades dos políticos englobados, protegendo a sua privacidade até que investigações fundamentadas confirmem suspeições. Não pode ser ao contrário: há que aceitar a existência de casos de polícia, não o policiamento de todos os casos. Se assim não for, estamos a caminho de viver num estado policial.
Desta forma, elimina-se a desconfiança generalizada que vai criando custos inaceitáveis para toda a sociedade. Tanto é assim que o preço a pagar por todos nós inclui agora o custo de eleições legislativas altamente indesejáveis! Só uma reforma política baseada num modelo tecnológico que proteja tanto os políticos íntegros quanto os cidadãos que os elegem pode acabar com o absurdo em que todos são considerados culpados até provarem o contrário.
A blockchain é mais do que uma mera promessa tecnológica. É um instrumento decisivo para reformar estruturalmente a democracia portuguesa, recuperar a credibilidade perdida e restabelecer a confiança. É hora de Portugal abandonar o folhetim político das suspeitas constantes e dar um passo decidido rumo à transparência ética. Esta é a inovação que o país precisa para garantir uma democracia saudável, justa e sustentável no século XXI.
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