Realização de uma cimeira Rússia-África na Guiné Equatorial “não diz respeito à CPLP” | Guiné Equatorial
A possibilidade de a próxima cimeira da Rússia-África se realizar num país da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) não mereceu ainda qualquer comentário oficial da parte do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) e assim se manterá, por agora, tendo em conta que as negociações entre a Guiné Equatorial e a Rússia continuam e ainda não está decidido se a cimeira de Julho será mesmo na capital equato-guineense.
O que o PÚBLICO pôde apurar junto de fontes diplomáticas é que “nada afecta a posição portuguesa sobre a Ucrânia” e não será esta cimeira, se se realizar mesmo em Malabo, que irá abalar essa convicção. Além disso, “cada país tem a sua própria política externa” e a realização de um evento político como este “não diz respeito à CPLP”.
Não se espera, por isso, que da parte do MNE saiam grandes considerações sobre a cimeira, mesmo numa altura em que a Ucrânia solicitou a adesão à CPLP como observador associado, um pedido que “Portugal apoia”, dizem as mesmas fontes, e que poderá enfrentar a oposição de alguns Estados-membros, que têm assumido uma atitude divergente sobre a invasão russa da Ucrânia à adoptada pela diplomacia portuguesa.
No entanto, como lembram essas fontes, nenhum Estado-membro da CPLP votou contra a Ucrânia ou a favor da Rússia nas resoluções das Nações Unidas; a posição divergente da maioria tem sido expressa por meio da abstenção. Aliás, referem, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Timor-Leste e Brasil votaram, junto com Portugal, a condenação da invasão da Ucrânia pela Rússia.
A 11.ª Sessão Especial da Emergência da Assembleia Geral das Nações Unidas, aberta a 28 de Fevereiro de 2022, em consequência da invasão russa da Ucrânia, adoptou até agora seis resoluções e em nenhuma delas houve um voto contra dos Estados-membros da CPLP. Moçambique absteve-se em todas as votações, a Guiné Equatorial absteve-se em quatro e não votou em duas e Angola só não se absteve na ES-11/4, que condena a anexação de quatro regiões ucranianas russas.
Portugal foi o único Estado-membro que votou favoravelmente todas as resoluções, algo que nem mesmo Cabo Verde fez, já que se absteve na ES-11/3, a 7 de Abril de 2022, que suspendeu a participação da Rússia na Conselho de Direitos Humanos da ONU pela “grande preocupação grave com a crise humanitária e de direitos humanos na Ucrânia”.
Timor-Leste também votou sempre como Portugal, com excepção da resolução ES-11/5, de 11 de Novembro de 2022, em que se absteve. Aliás, essa resolução a defender que seja a Rússia a pagar os custos da guerra foi a que mereceu o maior número de abstenções (seis) entre os membros da CPLP. A ES-11/3 também teve quase a mesma recepção, com a excepção de que em vez de abstenção, a Guiné Equatorial optou por faltar à votação, algo que São Tomé e Príncipe fez nas duas.
Como diz Fernando Jorge Cardoso, investigador do Centro de Estudos Internacionais do Iscte-IUL, “Portugal está em clara minoria” dentro da CPLP no que diz respeito à guerra na Ucrânia e é, por isso, que o pedido de Observador Associado feito por Kiev “não tem impacto”.
As mesmas fontes diplomáticas lembram que na XIV Conferência de Chefes de Estado e de Governo da CPLP, em Agosto do ano passado em São Tomé, em que se decidiu a atribuição da categoria de Observador Associado ao Paraguai, foi aprovada a Alteração do Regulamento dos Observadores Associados, elaborada na reunião extraordinária do Conselho de Ministros em Luanda. A segunda alteração desde que em 2017 se aprovou o reforço da cooperação com os Observadores Associados.
O processo burocrático é moroso, passa por várias etapas até se concretizar, daí que o mais provável é que ninguém se vá posicionar em relação ao pedido da Ucrânia antes de se ver obrigado a tomar uma posição — de preferência quando a guerra já tiver acabado. O Paraguai, o 34.º a conseguir o estatuto de Observador Associado da CPLP em Agosto do ano passado, entregou o pedido em Julho de 2020.
“Não estou a ver que haja qualquer drama ou posição do lado português que possa pôr em causa o relacionamento de Portugal com os seus outros parceiros da CPLP”, diz Fernando Jorge Cardoso, também professor catedrático convidado na Universidade Autónoma de Lisboa.
Com a Assembleia da República dissolvida e um Governo de gestão nos próximos meses, Portugal “nem precisa de fazer grandes declarações” sobre a cimeira ou sobre a Ucrânia na CPLP, acrescenta o investigador.
“Seguramente, vamos ter uma declaração de João Cravinho a condenar de uma maneira ou de outra, mais ou menos diplomática”, uma declaração “que não será seguramente simpática”, mas de maneira a não provocar muitas reacções, conclui.
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