O que ainda é seu quando a criação envolve tecnologia e IA?

Já se perguntou como funciona uma ferramenta de inteligência artificial como o ChatGPT? Se você, em algum momento, teve a curiosidade de explorar essa tecnologia, saiba que a criação gerada por ela talvez não seja tão “sua” quanto parece. 

A OpenAI revelou que o ChatGPT já ultrapassa 180 milhões de usuários mensais (dados de 2025), o que mostra o quanto a ferramenta se popularizou. A empolgação é grande, mas será que todos sabem o que realmente está por trás de sua utilização? Ou melhor: como essas máquinas são alimentadas?

Em 2023, o The New York Times processou a OpenAI e a Microsoft, acusando-as de utilizar, sem autorização, conteúdos jornalísticos para treinar seus modelos. E se uma dessas fontes “invisíveis” acabar influenciando diretamente a sua produção?

Quando modelos de IA são treinados com milhões de obras, textos, imagens e músicas produzidas por pessoas reais, muitas vezes sem consentimento, entramos em um território nebuloso entre inspiração e apropriação.

Quem assina uma obra criada com inteligência artificial?

Mas e se você usar a IA para publicar um texto, esse material seria realmente seu? A pergunta pode parecer simples, mas a resposta é tudo, menos óbvia. Isso porque em uma era em que ferramentas como o ChatGPT, Midjourney ou outras plataformas de geração de conteúdo se tornam cada vez mais comuns na rotina de criadores, profissionais e empresas, o debate sobre autoria e originalidade ganha novas camadas de complexidade.

Nos Estados Unidos, a Justiça já se posicionou: trabalhos desenvolvidos exclusivamente por inteligência artificial não são elegíveis para proteção legal nesse âmbito. Foi o que decidiu o tribunal no caso Thaler vs. USPTO (2023), ao negar o pedido de registro de uma obra inteiramente elaborada por sistemas, sem qualquer intervenção pessoal.

O argumento é que os direitos autorais, por definição, existem para reconhecer a expressão intelectual humana. Sem alguém por trás das ideias, não há base jurídica para esse tipo de proteção.

No Brasil, não existe uma legislação específica sobre o tema. Mas sabe-se que usar a tecnologia como apoio é diferente de deixar que ela crie sozinha. Quando a IA atua como ferramenta, ainda há espaço para o reconhecimento autoral. Mas se todo o processo criativo for delegado à máquina, será difícil reivindicar prerrogativas sobre o que foi publicado.

Segundo a Gartner, empresa global de consultoria e pesquisa em tecnologia, a expectativa é que mais de 30% de todo o conteúdo textual publicado online até 2026 será gerado por computação cognitiva. Ou seja, estamos caminhando para um mundo onde parte das palavras que lemos todos os dias não terá um autor humano, isso muda tudo.

Não apenas do ponto de vista jurídico, mas também ético, profissional e até emocional. O que significa ser responsável por uma criação em que as máquinas escrevem, pintam, compõem e editam? Como garantir que a expressão individual continue sendo valorizada e protegida nesse cenário cada vez mais automatizado?

A criatividade humana ainda é necessária?

Um estudo da McKinsey & Company publicado em 2024 é direto: até 2030, 40% das tarefas criativas poderão ser automatizadas por sistemas inteligentes. Mas será que a tecnologia tem, de fato, suas próprias ideias?

A verdade é que tudo que vem da IA não nasce do nada. Mesmo as obras mais surpreendentes, que parecem inovadoras e originais, são como colagens refinadas: pedaços de textos, imagens e sugestões reunidas a partir de vastos bancos de dados. O sistema não “pensa” como nós, ele combina padrões com base em probabilidades. O que parece novo é, na verdade, uma reconfiguração engenhosa do que já existia.

E se de fato parte do trabalho intelectual pode ser automatizado, o que acontece com os especialistas por trás dele? Segundo o levantamento recente da Reuters Institute, 49% dos jornalistas já utilizam inteligência artificial no processo de redação e pesquisa, seja para organizar informações, propor pautas ou estruturar textos. No entanto, 72% desses profissionais dizem temer uma desvalorização da sua atuação.

Infelizmente, lidamos com um paradoxo, a computação cognitiva amplia o alcance da criatividade, mas, ao mesmo tempo, desafia a relevância de quem cria. Afinal, se um software consegue entregar um layout bonito, uma legenda “pronta para engajar” ou um artigo técnico em segundos, onde fica o valor da sensibilidade, da bagagem e da intuição humana?

Como manter a autenticidade usando inteligência artificial?

O impacto da IA não se limita ao jornalismo. Redatores, designers, roteiristas, publicitários, social media, ilustradores, fotógrafos, artistas plásticos e tantos outros profissionais estão diante do mesmo dilema. Não basta mais só ser bom no que faz, é preciso saber como usar a tecnologia estrategicamente, sem perder a autenticidade.

Mas e nós, humanos? Temos realmente ideias “nossas”? A resposta não é tão simples. Afinal, grande parte do que consideramos originais também nasce daquilo que vimos, lemos, ouvimos e sentimos ao longo da vida. Somos feitos de memórias, referências e experiências. Mas há algo que nos diferencia: a maneira como transformamos tudo isso.

A imaginação não é somente um mecanismo de associação, é um campo fértil regado por emoção, intuição e subjetividade. É o olhar pessoal que conecta o trivial ao extraordinário. É a dor que vira poesia. É o silêncio que se torna teoria. É o caos interno que encontra forma.

Um sistema também conecta ideias, sim, mas de forma fria, estatística e baseada em padrões previsíveis. Já nós, indivíduos, conectamos com significado. Criamos porque sentimos. Porque vivemos. E talvez seja justamente isso que torne a autoria humana insubstituível. Não é sobre ter propostas inéditas o tempo todo, é sobre dar sentido a elas de um jeito que só você conseguiria dar.

Como proteger sua autoria

Se a inteligência artificial pode escrever, desenhar, compor e até desenvolver campanhas publicitárias em minutos, o que garante que uma obra seja realmente sua? Essa é uma das grandes questões do nosso tempo e, mais do que uma dúvida filosófica, é um desafio prático para quem vive da criatividade.

A verdade é que, na era da IA, o conceito de autoria está em transformação. Não basta mais criar algo. É preciso saber como provar que foi você quem criou e de que forma a ferramenta participou (ou não) do processo.

O primeiro ponto importante é documentar as etapas de produção, se você usou a inteligência artificial como apoio, por exemplo, para gerar rascunhos de texto, ideias de design ou trechos musicais, guarde esse histórico. Registre os prompts usados, as versões elaboradas, suas alterações manuais e as decisões que nortearam o resultado final. Esse material pode ser útil para comprovar sua intervenção pessoal em caso de disputas.

Ao utilizar os recursos, não abra mão da sua protagonismo. Dê seu toque. Reescreva. Escolha. Edite. Interprete. É a combinação entre tecnologia e sensibilidade humana que faz com que não seja algo inteiramente do sistema, mas um conteúdo seu que pode ser protegido. Além disso, sempre que possível, registre sua obra. No Brasil, textos, músicas, ilustrações, vídeos e outros materiais podem ser registrados.

No campo jurídico, por exemplo, plataformas jurídicas de IA, vêm mostrando como a tecnologia potencializa a produtividade sem apagar a autoria humana.

Nesse momento, a legislação brasileira ainda está se adaptando ao impacto da computação cognitiva na produção intelectual, e propostas estão sendo discutidas no Congresso. No entanto, seja você advogado ou de outro setor, é indispensável ficar por dentro dessas mudanças, isso pode ser o que garantirá suas prerrogativas nos próximos anos. Também é ideal buscar por soluções que sejam confiáveis e claras quanto ao uso da ferramenta, à proteção de dados e aos direitos autorais.

Como manter sua identidade criativa em meio à automação?

Não. A inteligência artificial não é a inimiga da criatividade. Ela é, na verdade, um reflexo daquilo que somos capazes de imaginar, estruturar e dirigir. Quando usada com consciência e intenção, ela se torna uma extensão do nosso raciocínio, não uma substituição.

O risco não está na ferramenta, mas no abandono do papel criador que nos torna únicos. A questão central não é “se” vamos usar IA, mas “como” escolhemos utilizá-la. Usar a tecnologia com responsabilidade, intencionalidade e clareza sobre os limites entre apoio e autoria é o que permite que grandes ideias ganhem forma com autenticidade.

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