A combinação de novos valores, evidências científicas e produtos alternativos parece estar reescrevendo a relação dos jovens com o álcool
Nas últimas décadas o álcool ocupou um espaço central na vida dos adultos, principalmente dos mais jovens. Festas, baladas e celebrações giravam inevitavelmente em torno do copo cheio. Mas tendências recentes têm apontado uma queda consistente no consumo de bebidas alcoólicas, especialmente entre os integrantes da Geração Z (nascidos entre 1997 e 2012) O que pode estar por trás dessa transformação?
O álcool é o novo cigarro?
Uma matéria recente do jornal Financial Times, publicada no Brasil pela Folha de S. Paulo, sugere que a bebida alcoólica está ocupando um lugar similar ao que o cigarro ocupava algumas décadas atrás: um símbolo de prazer que começa a ser reavaliado à luz de novos conhecimentos sobre seus riscos. E mais um detalhe: o álcool está perdendo o apelo entre os mais jovens.
Novos hábitos, novas prioridades
A Geração Z tem mostrado padrões de comportamento peculiares. Pesquisas indicam que eles estão bebendo menos, fazendo menos sexo e socializando de forma diferente das gerações anteriores. A vida digital – redes sociais, jogos, conteúdos sob demanda – disputa atenção diretamente com o mundo das festas e bares. Além disso, essa geração parece mais preocupada com saúde mental, bem-estar e equilíbrio do que com beber.
O foco no corpo
Há uma valorização crescente de um estilo de vida saudável: exercícios, alimentação balanceada, sono de qualidade. Nesse contexto, o álcool – que é calórico, interfere no sono e impacta o metabolismo – começa a destoar. A febre das “canetinhas para emagrecer”, como o Ozempic e similares, também entra nesse cenário. Novos estudos sugerem que esses medicamentos podem reduzir o desejo não só por comida, mas também por álcool, ainda que os efeitos a longo prazo no comportamento de consumo não estejam claros.
Novas alternativas
Outro indicador dessa mudança é o aumento na oferta (e demanda) por bebidas com baixo teor alcoólico ou totalmente sem álcool. Produtos como vinhos, cervejas e destilados “zero álcool” deixaram de ser nicho e agora ocupam espaços cada vez maiores nas prateleiras de supermercados e nos cardápios de restaurantes e bares.
Sem dose segura
A ciência também tem seu papel nessa mudança. Pesquisas recentes têm questionado o antigo discurso de que pequenas doses de álcool poderiam ter efeitos benéficos para a saúde. A mensagem que ganha força agora é mais direta: não há uma dose segura. Mesmo o consumo leve pode aumentar o risco de certos tipos de câncer e de outras doenças crônicas.
Moderação como regra
A combinação de novos valores, evidências científicas e produtos alternativos parece estar reescrevendo a relação dos jovens com o álcool. Moderação, que antes podia ser vista pelo grupo como sinal de fraqueza ou “caretice”, agora parece ser a “bola da vez”, sinônimo de autocuidado e maior consciência.
É pouco provável que a era do álcool chegue ao seu fim, mas boa parte dos “porres” podem estar com os dias contados, e os copos parecem, sim, em média, cada vez mais vazios. Já parou para pensar como anda o seu consumo de álcool?
Jairo Bouer é médico psiquiatra e escreve semanalmente no Terra.
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