Texto: Felipe Floresti e Carlos Fioravanti/Revista Pesquisa Fapesp
A engenheira química Luciana Zortea, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), conhecia há anos a possibilidade de produzir nanofibras de celulose a partir do bagaço da cana-de-açúcar. Com diâmetro entre 39 nanômetros (nm) e 48 nm, o material forma uma película esbranquiçada e porosa, que permite a passagem do ar, mas filtra partículas sólidas.
O início da pandemia de coronavírus, em 2020, motivou a discussão sobre a eficácia das máscaras de proteção. O vírus Sars-CoV-2 possui um diâmetro de 50 a 200 nm e talvez fosse grande demais para ultrapassar uma barreira composta de nanofibras de celulose. “Na época, as pessoas usavam muitas máscaras que, além de desconfortáveis, não eram eficazes contra o vírus”, diz ela. O consumo de máscaras descartáveis aumentou rapidamente como forma de proteção contra o agente causador da Covid-19.
Ainda em 2020, a startup de nanotecnologia Nanox, de São Carlos (SP), e a fabricante paulistana de brinquedos Elka desenvolveram uma máscara respiratória reutilizável com um filtro descartável PFF2 – sigla de peça facial filtrante, também conhecida como N95 – capaz de reter poeira, aerossóis e agentes biológicos, e um composto antimicrobiano à base de prata criado pela Nanox com apoio do programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe), da FAPESP.
Em paralelo, Zortea e seus colegas da Ufes Jordão Moulin, Michel Picanço e Iara Rebouças criaram protótipos de máscaras faciais com nanofibras de celulose produzidas a partir do processamento mecânico de resíduos de bagaço de cana-de-açúcar. O primeiro passo do processo de desenvolvimento foi submeter o material a um pré-tratamento com hidróxido de sódio (NaOH) para remover compostos indesejados como a lignina, que forma a estrutura das plantas. Em seguida, o bagaço foi colocado em contato com a enzima celulase, que quebra a celulose em fibras menores. Como resultado, as nanofibras se separaram. Por fim, a nanofibra foi aplicada com spray sobre a máscara de tecido, como detalhado em um artigo publicado em março na Journal of Material Research and Technology.
Em testes de laboratório, a eficiência de filtração antimicrobiana das máscaras produzidas por esse método foi de 99,80%, enquanto a das máscaras do mesmo material sem o revestimento foi inferior a 95%, o mínimo exigido. “Não imaginava que os resultados seriam tão bons”, diz Zortea.
Segundo ela, a proteção foi equivalente à das máscaras mais eficazes, como as PFF2 e PFF3. Os testes de respirabilidade mostraram muita variação e serão refeitos. O grupo da Ufes está em busca de novas fontes de financiamento para dar sequência às pesquisas com a finalidade de concluir o desenvolvimento, depositar patentes e examinar as possibilidades de licenciamento.
Nanofibras de celulose já são produzidas em escala comercial ou piloto nos Estados Unidos, Canadá, Brasil, Japão, Suécia, Noruega, China e Israel.
N95, a máscara mais bem avaliada
Ao reduzir a carga viral em 98%, a bico de pato N95 mostrou os melhores resultados em um teste comparativo do desempenho de quatro tipos de máscaras de tecido e cirúrgicas.
Uma equipe de pesquisadores da Universidade de Maryland, nos Estados Unidos, chegou a esse resultado em um teste com 44 voluntários com Covid-19, que, durante meia hora, respiraram com e sem máscara em um aparelho que mede o número de partículas de vírus no ar exalado.
Como noticiado em 21 de junho no site ScienceAlert e detalhado em um artigo também de junho na eBioMedicine, a máscara de tecido bloqueou 87% da carga viral, uma máscara cirúrgica 74% e uma KN95 71%.
Artigos científicos
LAI, J. et al. Relative efficacy of masks and respirators as source control for viral aerosol shedding from people infected with Sars-CoV-2: A controlled human exhaled breath aerosol experimental study. eBioMedicine. v. 104, 105157. jun. 2024.
ZORTEA, L. et al. Improved non-woven surgical masks with nanostructured cellulosic reinforcement from sugarcane bagasse waste. Journal of Materials Research and Technology. 11 mar. 2024.
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