João Vieira de Almeida: “É incrível a falta de advogados na área do ambiente. Se tirasse o curso agora, exploraria este caminho”
“O ESG não é a galinha dos ovos de ouro para as sociedades de advogados, mas vai crescer muito”. Quem o diz é um dos homens mais poderosos de Portugal. Chama-se João Vieira de Almeida e é Sénior Partner da VdA, sociedade de advogados. Já travou muitas batalhas pelos seus clientes, mas a maior talvez tenha sido travada consigo próprio. Recorda-se de ir para casa completamente desesperado e, no dia seguinte, ter de aparecer no escritório com boa cara, demonstrando total confiança no futuro. Relembra que um líder é como outra pessoa qualquer, tem estados de alma, altos e baixos, e passa por depressões. “Foi o meu caso. Não é fácil, mas é com esse espírito de serviço e sentido de responsabilidade que é preciso desempenhar as funções da melhor maneira possível, liderando pelo exemplo e encarando o exercício de poder com humildade”.
A firma a que preside, a Vieira de Almeida, teve origem no escritório do pai, Vasco Vieira de Almeida, em 1976. Hoje emprega mais de 500 pessoas (63,2% são mulheres e 36,8% homens), das quais 330 são advogados e está presente em sete jurisdições. Além de Portugal, trabalha em rede com Angola, Cabo Verde, Guiné Equatorial, Moçambique, Timor-Leste e São Tomé e Príncipe. O ADN mantém-se intacto com os valores humanos do seu fundador. “O S de social é a força motriz do nosso negócio. Temos uma posição na comunidade. Temos de contribuir para a cidadania”. Por isso, João Vieira de Almeida orgulha-se de fazerem 10 mil horas probono, por ano, na VdA. “É um investimento significativo”.
A pressão mental nos advogados
O facto de os advogados trabalharem numa base horária pode ser a origem de muitos dos problemas desta classe profissional: “Temos esta questão de fundo que não vejo solução no curto prazo. A hora é a medida de serviço que prestamos. A meu ver não faz sentido. As horas não valem todas o mesmo”. Vieira de Almeida lamenta que este seja o modelo implementado há já muitos anos e diz que os próprios clientes resistem a mudá-lo, uma ‘ditadura’ que se traduz numa pressão muito grande, levando ao tapete muitos advogados.
O CEO é o limite
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Na VdA o tema da saúde mental é levado muito a sério. O escritório tem vários programas de bem-estar e, num ano, foram efetuadas 1500 massagens na “chair massage”; mais de 450 aulas de fitness e ioga; dez pessoas usufruíram de um programa para deixar de fumar e cada colaborador teve, em média, 17 horas de formação.
João Vieira de Almeida assume ter a mesma visão de Rousseau, filósofo suíço do século XVIII, que defendia que o ser humano é naturalmente bom: “sou da equipa do bom selvagem”. E exalta o papel da natureza no seu equilíbrio pessoal: é a montanha que o faz sentir mais forte do que imaginava e muito mais pequeno e insignificante do que pensava.
Outro aspecto que realça é o fato de na montanha se estar em total sintonia com a natureza e esta ser um equilibrador. “Quando se sobe em grupo, a montanha coloca-nos a todos ao mesmo nível. Pobres, ricos, gordos, magros, altos, baixos, homens, mulheres. Estamos todos com uma mochila às costas e uma tenda para dormir. É incrível a interajuda. A montanha tira o melhor das pessoas”. Isto emociona-o. “Continua a comover-me e faz-me sentir muito realizado”. Chegar ao topo, contudo, não é o fim do caminho, é só metade: “a maior lição que a montanha nos dá é que é preciso subir, mas é fundamental descer. A montanha só se conquista cá em baixo. Não é lá em cima. A vida é assim. Feita de altos e baixos”.
ESG
E é no topo que está a chave para abrir a porta da sustentabilidade. Os temas do ESG (sigla inglesa para práticas ambientais, sociais e de governança) já estão, na sua opinião, a ser incorporados nas empresas nacionais. A ritmos diferentes, mas é fundamental passar a mensagem às organizações de que as regras e as metas ESG estão no coração da atividade das empresas e isso só se consegue numa base de cima para baixo.
Quanto às PME, sendo 99% do tecido empresarial português, já estão a ser apanhadas nas cadeias de valor. João Vieira de Almeida destaca dois caminhos que podem funcionar. O primeiro é as PME trabalharem em rede através, por exemplo, de associações empresariais e sectoriais. O segundo prende-se com o papel que as grandes empresas podem desempenhar ajudando e orientando as mais pequenas, designadamente no campo da informação. Além disso, “as empresas de consultoria nesta área crescem como cogumelos e ainda bem”.
Vieira de Almeida garante que não há nenhuma galinha dos ovos de ouro no ESG para as sociedades de advogados, apesar de admitir que esta será uma área que crescerá imenso e em que todos os escritórios estão a investir, mas não é nada fácil porque faltam especialistas em ambiente. “É incrível a escassez de advogados nesta área. Se fosse miúdo a tirar o curso agora, decerto exploraria este caminho. Vai crescer muito”.
Em relação ao greenwashing, admite que alguns estudos da União Europeia identificam um número bastante elevado de empresas apanhadas nessa situação, ou seja, de passar para o mercado mensagens falsas acerca das suas políticas de sustentabilidade. “Não sei se foi o número de empresas que cresceu, ou se foi a monitorização que detetou melhor esses casos, mas é um fenómeno que vai diminuir com a pressão da regulação”. Além disso, a pressão interna por parte dos colaboradores será também uma forma de mitigar o tema: “Atualmente o talento que se contrata tem uma posição ativa, honesta e transparente nestas matérias”. Por outro lado, há ainda a pressão dos consumidores cada vez mais exigentes nos serviços e produtos que adquirem. Estamos, portanto, no bom caminho e, apesar do movimento anti ESG vindo dos EUA, João Vieira de Almeida acredita que a Europa continuará o seu caminho de liderança e que já não terá retrocesso.
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‘Ser ou não ser’ é um podcast semanal sobre o mundo da sustentabilidade, da ecologia e da responsabilidade. A cada episódio, mergulhamos em tópicos relevantes, desde práticas individuais até iniciativas globais, com convidados apaixonados por este tema. Damos voz a líderes de empresas, ativistas, empreendedores e especialistas, para partilharem experiências e soluções inovadoras para um futuro mais sustentável. ‘Ser ou Não Ser’ é um podcast do Expresso SER, com moderação da jornalista Teresa Cotrim e o convidado residente Frederico Fezas Vital, professor e consultor na área da inovação social, impacto e empreendedorismo. A coordenação está a cargo de Pedro Sousa Carvalho.
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