Investimento Estrangeiro Ignora Estabilidade Política em Portugal

Iniciou funções como managing partner da Morais Leitão em junho do ano passo. Como têm sido estes meses?

Correu muito bem. Temos uma tradição de muita tranquilidade na gestão da casa. Fizemos uma tradição muito pacífica. A Assembleia Geral votou por unanimidade a nova lista ao Conselho de Administração e tive grande apoio do atual chairman, o Dr. Nuno Galvão Teles.

É uma liderança de evolução na continuidade?

Sim, de evolução e inovação.

E quais são os objetivos?

Os objetivos são em parte continuidade e em parte de inovação. Estamos a pensar centrar-nos em algumas coisas óbvias, mas que às vezes não são assim tão óbvias, centrar-me nas pessoas, essencialmente. A minha primeira grande preocupação foi assegurar talento e assegurar que temos as melhores pessoas.

Fala-se muito na Inteligência Artificial, mas esta só faz sentido se houver talento.

Exatamente.

É aquela história de que quem nos vai roubar o emprego não é um robô, mas sim a pessoa que sabe usar o robô.

Exatamente! Portanto, precisamos de continuar a ser os melhores advogados e os mais talentosos.

E quando falamos em Inteligência Artificial no Direito, estamos a falar de tarefas burocráticas, ou também de coisas como a antecipação de resultados judiciais.

Acho que vai ter um alcance avassalador. No início, seguramente, a tendência é para substituir tarefas mais burocráticas.

Refere-se, por exemplo, à verificação de documentos. Muitas dessas tarefas são feitas por estagiários. Isto levanta desafios a nível também de formação dos jovens advogados?

Perdem-se umas coisas, mas ganham-se outras. Fiz o meu estágio em 1996, e de facto passávamos muito tempo com tarefas desse género. Algumas tinham algum valor acrescentado, outras não tinham valor acrescentado nenhum. Portanto, o facto de libertar mais tempo de tarefas puramente práticas, para que possam usar esse tempo para tarefas mais criativas, é positivo. Não tenho uma visão necessariamente muito pessimista sobre isso. Quando comecei a trabalhar havia um computador para quatro pessoas!

A essência do que é ser advogado continua a ser a mesma?

Sim, porque as máquinas, por mais tecnologia que tenham, precisam de ser alimentadas por conhecimento humano, mesmo as de inteligência artificial e, por outro lado, essas tarefas muito burocráticas e muito consumidoras de tempo, fazem com que a pessoa não se possa fixar em aprender outras coisas e evoluir.

O foco do talento humano em tarefas de valor acrescentado, mais criativas, implica uma reconversão das competências dos advogados…

O advogado, hoje em dia, tem que perceber de literacia digital, tem que perceber de legal project management, de gestão de projetos.

Por exemplo soluções de Inteligência Artificial que permitem, por exemplo, fazer uma análise preditiva em relação ao resultado de um processo. O futuro passa por ai? E por o advogado ter um papel mais preventivo, ajudando a evitar problemas?

Como sabe, uma das áreas que a inteligência artificial, e não só, a tecnologia em geral, tem feito subir significativamente no Direito, é exatamente na área da advocacia preventiva, no compliance, e isso é uma virtude.

Voltando ao vosso escritório, isto implica, quando diz que as pessoas são uma prioridade, imagino que fala a nível de valorização das pessoas e de dar-lhes conhecimentos na área digital e também de recrutar pessoas com essas características. Mas a aposta na tecnologia poderá também levar a uma redução do número de advogados na vossa firma a prazo? Ou é possível pôr as pessoas a fazer outras coisas?

Há aí duas coisas muito diferentes nessa pergunta. Por um lado, a captação de talento é para nós uma pedra de toque na forma como nós exercemos a advocacia. A Morais Leitão sempre foi uma casa de grandes advogados e, portanto, nós queremos ter os melhores advogados a trabalhar connosco. Melhores advogados no sentido tradicional. E eles têm que se adaptar à forma como a advocacia é feita hoje em dia. Diria que temos dois planos, um a médio prazo e um mais a longo prazo. A médio prazo penso que não, penso que vai reconverter o que os advogados estão a fazer nas sociedades de advogados. Ou seja, como lhe digo, vão estar mais preocupados em ajudar a montar ferramentas e a dar os inputs para as ferramentas, sem as quais as ferramentas não conseguem, por mais inteligentes que sejam, não conseguem dar respostas. Nós temos, por exemplo, uma parceria com uma sociedade tecnológica em que temos 50% dos direitos de propriedade intelectual de uma ferramenta, exatamente porque eles perceberam que, é uma ferramenta de discovery, eles perceberam que sem o input dos advogados não era possível, por mais que a programação fosse perfeita, chegar aos resultados que eles queriam. E, portanto, nesse aspecto, o talento humano é justamente fundamental.

E a intuição? Tem lugar nesse racional?

Tem, totalmente.

Imaginemos uma situação em que a máquina diz, o caminho mais adequado é este, mas, no entanto, o advogado tem muita experiência e diz, não, isto é o mais correto… Vê isso acontecer?

A intuição, obviamente, acumulada de anos e anos de experiência, tem um valor incalculável.

E acha que os clientes valorizam isso ou valorizam mais o aspecto tecnológico?

Acho que valorizam uma combinação dos dois. E como lhe dizia, a longo prazo, acho que é preciso ver, de facto, cinco anos, se calhar, mas não sei, porque estas coisas evoluem muito rápido. Temos de mudar um pouco a maneira como os advogados trabalham e oferecer serviços muito mais completos aos clientes. Nós fomos a primeira sociedade, como julgo que sabe, a integrar um diretor de inovação e tecnologia como sócio da Morais Leitão, porque acreditamos mesmo que Nunca perdendo de vista que nós somos uma sociedade de advogados, acrescentar uma camada a essa prestação.

É um sócio que não é advogado, ao abrigo da nova lei que permite a multidisciplinaridade.

Exatamente. Acreditamos muito que podemos beneficiar com isso. Num longo prazo, que como digo pode não ser assim tão longo, acho que temos de fazer uma reflexão estratégica muito grande sobre as consequências mais profundas que a introdução da inteligência artificial e da tecnologia podem ter no direito. Todos estamos agora preocupados com, essencialmente, com a concorrência, quem é que está a comprar o software mais não sei o quê, quem é que está mais adiantado a fazer, a desenvolver o produto e tal. Mas há uma dimensão depois diferente, uma dimensão um bocado, digamos, a dimensão Google, que é um underdog poder aparecer e disromper completamente a forma como a advocacia é exercida.

Quando me fala em underdog, refere-se, por exemplo, quer a sociedades mais pequenas, quer a outros players que conseguem dar esse salto mais depressa? E as consultoras, podem fazer esse papel?

Claro que as consultoras, sendo de base internacional, têm músculo financeiro para investir. Foi uma coisa que eu me fui apercebendo à medida que me fui envolvendo nas questões do desenvolvimento digital, tecnológico. Para já, nada se faz sem um contributo humano de grande competência técnica por trás. E, portanto, nós podemos todos ter a mesma ferramenta, é fácil comprar a mesma ferramenta no mercado, mas não consegue depois ensiná-la convenientemente.

E quando falamos de melhores advogados, falamos também de advogados que têm relações de confiança muito antigas com os clientes…

 Apesar de tudo, as Big Four, pelas quais eu tenho enorme respeito e são concorrentes e são clientes também, ao mesmo tempo, têm um histórico, um ADN de prestar determinado tipo de serviços. E nós temos um histórico de prestar determinado tipo de serviços, de advocacia pura e dura. A inovação não se faz só na tecnologia. Nós fizemos inovação quando o Project Finance chegou a Portugal. Ou seja, o gap que há entre o desenvolvimento por um lado, nas sociedades de advogados, de questões de consultoria ou de estratégia, etc, e nas consultoras, quanto à capacidade técnica da advocacia, é bastante grande. A minha, se eu tivesse que apostar, a minha aposta é que isto vai ficar um bocadinho como ficou em Espanha.

E os clientes, numa grande operação, preferem ter um escritório de advogados e uma consultora, em separado?

Acho que sim, porque quem quer ser especialista em tudo não é especialista em nada.

Agora, olhando para a nossa economia, é preciso mencionar que esta entrevista está a ser gravada na terça-feira, dia 11, duas horas antes da votação da moção de confiança no Parlamento, portanto, no momento em que for para o ar, já estará desatualizada. Mas creio que não estaremos longe da verdade se dissermos que estamos numa situação de grande incerteza a nível político e acho que isso pode ter implicações também no crescimento da economia este ano.

Sim, um pouco. Enfim, eu acho que os grandes efeitos são os efeitos internacionais. Isto não quer dizer, de facto, que uma economia como a nossa, que é muito dependente do Estado, não pare um bocadinho cada vez que existem processos eleitorais. Tendemos a depender demasiado do Estado para tudo.

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