ENVIADA ESPECIAL A SUNNYVALE – Alexandre Hadade foi “mordido” pelo Vale do Silício há mais de 15 anos. Com sócios, ele criou no Brasil a Arizona, empresa que automatiza campanhas digitais para grandes empresas, está presente em 25 países e fatura R$ 150 milhões ao ano. “Mas eu estava cansado de disputar o Brasileirão e a Libertadores”, diz Hadade. “Eu queria mesmo é jogar na Champions League.” Em outras palavras, ele queria viver a experiência única de criar uma empresa global, a partir do ecossistema de inovação mais avançado do mundo, no Vale do Silício.
Como outros empreendedores brasileiros de tecnologia, Hadade faz parte de um movimento batizado de “Brazil Tech Diaspora”, retratado numa pesquisa feita pela fundação de estímulo ao empreendedorismo Endeavor. Após mapear quase 400 fundadores, investidores e executivos de tecnologia que fazem parte dessa diáspora e entrevistar quase 60 deles, o levantamento identificou brasileiros que vivem em 138 cidades, em 31 países dos cinco continentes. A pesquisa está sendo apresentada no Brazil at Silicon Valley (BSV), evento patrocinado pelo Estadão, nesta quarta-feira, 23.
O principal hub que concentra esses empreendedores é a Califórnia (onde estão 12% dos brasileiros que fazem parte da diáspora), sobretudo no Vale do Silício e em Los Angeles. Outros destinos importantes são a Flórida (com 10% do total), seguido de Nova York (6%), Geórgia e Massachusetts (2% cada). A Europa abriga 30% da diáspora brasileira (sobretudo em Portugal e no Reino Unido). Mas o movimento também acontece em Singapura, Oceania e Oriente Médio.
Patrícia e Hadade, da Birdie: investimento em IA antes de virar febre, aprender a pensar grande e viver em ambiente de abundância estão entre aprendizados da diáspora Foto: Pedro Kirilos/Estadão
Hadade e sua sócia Patricia Osorio optaram exatamente para os destinos preferidos pelos empreendedores da diáspora. Em 2018, mudaram-se para os EUA. Hadade foi para o Vale do Silício, e Patrícia, para Fort Lauderdale, na Flórida. O objetivo era ter bases diferentes para poder desenvolver essa empresa global. Apostaram em inteligência artificial (IA) muito antes que o tema se tornasse uma febre. “Isso só foi possível porque vivemos a tecnologia na fronteira da inovação e percebemos muito antes que a IA iria mudar tudo”, diz ele.
Criaram então a Birdie, que usa bases de dados fragmentadas das empresas para resolver problemas com os clientes. São informações que vão das mais básicas às comportamentais e criam possibilidade para tomadas de decisão, que permitem entender se conflitos e insatisfações foram resolvidos.
“A gente não se conformava porque as empresas gastam milhões com pesquisas e desenvolvimento de sistemas de atendimento para entender os clientes e não olham as próprias bases de dados”, diz Patrícia. “Elas não sabem nem como começar a olhar e tratá-los.”
No processo de construir uma empresa global do zero nos EUA, resolveram passar por todo o processo de captação de recursos. Em 2019, conseguiram um investimento pré-seed (que busca desenvolver um produto mínimo viável) de US$ 1,9 milhão. Conseguiram conquistar clientes como Microsoft, HP, Samsung e Midea e partiram para uma rodada de captação seed, de US$ 7 milhões, que contou com recursos do Softbank e dois fundos de Palo Alto.
Porém, no fim de 2022, os empreendedores resolveram mudar o negócio. Isso porque a Birdie era contratada como consultoria e eles queriam um negócio que tivesse escala. Resolveram levar a proposta a fintechs brasileiras. Conquistaram Neon, Stone, XP, BV, Mercado Bitcoin. Montaram um produto que consideram ter esse potencial de escalar globalmente e começam agora a avançar em clientes nos EUA.
“Estar aqui nos permitiu subir a régua e criar algo que atendesse a uma necessidade global”, diz Patrícia. “A partir daqui, não vou me limitar a algo que conheça só do Brasil.”

Tesla Cybertruck disputa as ruas de Sunnyvale com carros sem motorista: empreendedores são expostos a inovações todo o tempo Foto: Pedro Kirilos/Estadão
Para Hadade, outra vantagem de estar conectado a um hub de inovação é não ter vergonha de ser ambicioso. “Os discursos para captação de fundos de meninos de 20 anos de idade aqui são todos no sentido de querer mudar o mundo”, diz ele. “Para os brasileiros, é ensinado que somos inferiores. É uma mudança de mentalidade que precisa ser exercitada todos os dias.”
Além de deixar de pensar pequeno, outra diferença é viver em um ambiente de abundância de recursos que motiva o compartilhamento de experiências. “As coisas funcionam de uma forma muito mais fluída do que num ambiente de escassez”, diz ele.
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