Ex-prisioneiros denunciam tortura em prisão da Venezuela – 19/03/2025 – Mundo

Os guardas usavam crachás com os nomes Hitler e Demônio, e cobriam seus rostos com máscaras de esqui. Os americanos em uma prisão da Venezuela foram confinados em celas de cimento, espancados, atacados com spray de pimenta e submetidos ao que um prisioneiro chamou de “tortura psicológica”.

Três meses após sua captura, os americanos estavam tão indignados que se rebelaram. Eles batiam nas paredes das celas e chutavam as portas, disseram, enquanto outros prisioneiros se juntavam, centenas deles gritando por liberdade até que o concreto começasse a rachar.

“Estão comigo, meus venezuelanos?” gritou um dos prisioneiros, Gregory David Werber, lembrou um colega de cela.

“Estamos com você, gringo!” eles gritaram de volta.

Seis prisioneiros americanos voltaram da Venezuela no fim de janeiro. Sua liberdade foi garantida após visita incomum e pública de um representante do governo americano a Caracas.

Críticos disseram que o encontro entre Richard Grenell, enviado especial dos EUA, e Nicolás Maduro, ditador da Venezuela, deu legitimidade a um líder acusado de abusos generalizados dos direitos humanos e de roubar uma eleição recente.

Outros apontaram que a visita trouxe os americanos de volta para casa.

Agora livres e se ajustando às suas novas vidas, três dos ex-prisioneiros falaram longamente com o New York Times sobre sua detenção, fornecendo a visão mais detalhada até agora de suas experiências.

Alguns descreveram ter sido encapuzados, algemados e sequestrados em postos legais de fronteira ao tentar entrar como turistas. É um relato raro da estratégia de Maduro de pressionar líderes globais a fazer o que ele quer: detém dezenas de prisioneiros estrangeiros para usar como instrumento de pressão em negociações.

Outros nove cidadãos americanos ou residentes permanentes legais permanecem sob custódia venezuelana, de acordo com o Departamento de Estado. No total, há pelo menos 68 detentores de passaportes estrangeiros presos injustamente na Venezuela, de acordo com um grupo de monitoramento, o Foro Penal. Eles estão detidos ao lado de aproximadamente 900 prisioneiros políticos venezuelanos.

Os estrangeiros vêm da Espanha, Alemanha, Argentina, Colômbia, Uruguai e de outros lugares. Quase todos foram capturados no ano passado.

A expansão dessa estratégia ocorre à medida que Maduro perde apoio em casa e no exterior e busca maneiras de exercer influência. Seus objetivos incluem a suspensão das sanções dos EUA e o reconhecimento por parte de líderes como o presidente Trump.

As prisões de estrangeiros também ocorrem em meio a uma disputa dentro do governo Trump sobre como lidar com Maduro, de acordo com analistas. Conselheiros como Grenell mostraram disposição para se envolver em acordos rápidos —uma visita pública pela liberdade de prisioneiros.

Outros, como o secretário de Estado, Marco Rubio, defendem uma abordagem mais isolacionista, dirigida para pressionar Maduro a sair do poder, ao mesmo tempo que apoiam a libertação dos detidos.

Um porta-voz do Departamento de Estado disse que o governo dos EUA estava trabalhando para garantir a libertação de todos os americanos detidos injustamente na Venezuela.

Grenell não respondeu à reportagem, nem o ministro das comunicações da Venezuela, Freddy Ñáñez. O regime venezuelano acusou alguns dos americanos detidos de terrorismo e de planejar matar Maduro.

Captura

A Venezuela —suas montanhas, suas praias, seu povo— chamou a atenção deles. Era setembro do ano passado. Werber, 62, um desenvolvedor de software, estava em viagem que fazia parte de sua lista de desejos pela América Latina. David Guillaume, 30, era um enfermeiro da Flórida a turismo e com tempo livre. “Tenho três semanas”, pensou. “Só quero fazer algo diferente.” David Estrella, 64, era pai de cinco filhos de Nova Jersey vivendo parcialmente no Equador. Ele só queria ver amigos.

Todos viajavam sem saber que estavam se lançando em uma armadilha política.

Werber adquiriu um visto e viajou pelo país —dirigindo ao longo da costa da Venezuela, fazendo trilhas no monte Roraima— antes que autoridades em um aeroporto o prendessem em 19 de setembro, o trancassem em uma base militar, o levassem para Caracas e o deixassem em uma prisão de alta segurança chamada Rodeo Um. Detido ao lado dele estava sua namorada, uma cidadã venezuelana.

Guillaume, que foi preso no mesmo dia, e Estrella, detido em 9 de setembro, nem sequer conseguiram entrar no país antes de serem capturados. Ambos chegaram a Cúcuta, cidade colombiana na fronteira com a Venezuela, buscando permissão para entrar como turistas.

Depois de apresentar seu passaporte às autoridades venezuelanas, Estrella foi levado a um veículo, ele disse, algemado, encapuzado e colocado em um avião para Caracas.

Guillaume e sua noiva, Jaralmy Barradas, uma cidadã venezuelana, foram enviados para a capital de carro. “Eu fiz coisas que são inaceitáveis”, disse. “Mas isso não é quem eu sou agora.”

Em Rodeo Um, ele se tornou uma espécie de líder, chamado de “capitão” e “Furious G” pelos outros. E em uma manhã, ele explodiu.

“Todos somos inocentes!” ele gritou, batendo na porta de sua cela, lembrou. “Deixem-nos ir!” Outros se juntaram, disseram os homens. A fúria se espalhou. As soldas de metal começaram a estourar. Blocos de concreto se soltaram.

Dois detentos usaram os blocos soltos como ferramenta, disse Werber, e as portas de suas celas se abriram.

Mas a sensação de vitória não durou muito. Os guardas pegaram equipamentos antidistúrbios, borrifaram spray de pimenta nos prisioneiros, jogaram sacos sobre suas cabeças e começaram a agredi-los, disse Guillaume.

“Um dos líderes do regimento passou por mim, colocou o pé na minha cabeça”, continuou Guillaume. “Ele disse, ‘Bem-vindo à Venezuela. Bem-vindo ao inferno.’”

Libertação

Em Washington, Trump havia acabado de se tornar presidente, e em Caracas, Maduro estava pedindo por um novo começo nas relações bilaterais. Então, Trump enviou Grenell à Venezuela.

A reunião foi uma grande vitória para o líder venezuelano, que não recebia a visita pública de um oficial dos EUA havia anos.

O ditador, sorrindo para os fotógrafos, concordou não apenas em libertar prisioneiros americanos, mas também em aceitar venezuelanos deportados dos Estados Unidos. Isso era fundamental para as ambições de Trump de deportar milhões de imigrantes.

Os guardas levaram Werber, Guillaume, Estrella e outros três para um carro. Guillaume podia ver a costa do Caribe enquanto desciam para o aeroporto.

Mas só quando entrou no avião ele acreditou que estivesse voltando para casa. Já no voo, os americanos receberam uma ligação de Trump.

Depois, Estrella chamou o presidente de incrível e disse que estava grato. No entanto, se disse perplexo com a assistência limitada que recebeu ao chegar aos EUA — ele perdeu 18 quilos durante a detenção, disse, e voltou para casa com sérios problemas de nervos e nas costas.

Na noite de sua libertação, os homens foram deixados em um hotel “e pronto”, disse. Nenhum exame médico além de uma verificação de sinais vitais. Nenhuma visita de um psicólogo. Nenhum convite para um programa de reabilitação do governo —algo normalmente oferecido a prisioneiros que retornam.

Foi apenas em março que os homens começaram a receber ligações do Departamento de Estado, disseram eles, informando que Rubio os havia declarado como “detidos injustamente”, uma designação que garante anos de acesso a ajuda.

O porta-voz do Departamento de Estado disse que o governo estava em contato com os retornados e buscando fornecer a eles apoio adicional.

De todos os detidos americanos, Werber talvez fosse o mais experiente nessa situação. Ele havia saído da prisão nos EUA dois anos antes, depois de ser condenado por lavagem de dinheiro para um cartel de drogas.

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