Eventos na ONU reforçam urgência na proteção de indígenas em toda a América do Sul

Ao menos dois eventos paralelos voltam suas atenções aos direitos e proteção aos povos em isolamento voluntário da Amazônia e no Gran Chaco, na sede da ONU, em Nova York, durante a 24ª Sessão do Fórum Permanente das Nações Unidas sobre Questões Indígenas (UNPFII).

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O primeiro deles, realizado nesta quarta-feira, promovido pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e pela Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM), abordaou a vulnerabilidade extrema desses que são considerados os grupos humanos mais ameaçados do planeta (“Povos Indígenas em Isolamento Voluntário: a Necessidade Urgente de Medidas de Proteção em Meio às Ameaças de Extermínio em Curso na Amazônia”).

O segundo, nesta sexta-feira, capitaneado pelo Grupo de Trabalho Internacional para a Proteção dos Povos Indígenas em Isoalmento e de Recente Contato (GTI PIACI, na sigla em espanhol), vai apresentar o Relatório Regional de Metodologias com objetivo de criar um espaço de diálogo entre representantes indígenas, organismos internacionais, Estados e sociedade civil para discutir estratégias de implementação das recomendações do relatório e assim fortalecer os compromissos com o reconhecimento da existência desses grupos na América do Sul.

Levantamento obtido pelo GLOBO junto ao GTI PIACI aponta para a existência, em toda a América do Sul, de 188 registros de povos isolados, dos quais apenas 60 foram oficialmente reconhecidos pelos Estados, restando pelo menos 128 registros sem reconhecimento. Essa situação implica que uma parte majoritária (cerca de 70%) dos povos em isolamento no continente tenha sua existência legal negada — e, portanto, também seus direitos.

Consultor Regional do GTI PIACI, o indigenista Antenor Vaz fará na ONU a apresentação do relatório que cobra e sugere, entre outras medidas, o fortalecimento dos padrões internacionais e a consolidação dos protocolos e práticas metodológicas na região para a localização e confirmação desses grupos.

— O Informe Regional de Metodologia (IRM) resgata dos Estados, das organizações e povos indígenas e da sociedade civil de sete países da América do Sul, as experiências de promoção, proteção, “convivência” e reconhecimento da existência dos Povos Indígena em isolamento. São experiências milenares, amalgamadas com os diversos ramos da ciência ocidental para apresentar princípios e diretrizes que contribuam para a formulação de metodologias de reconhecimento da existência de um determinado povo indígena em isolamento, num determinado território e contexto — afirma Vaz.

Na América do Sul, os marcos normativos para a proteção desses povos variam significativamente de um país para outro, mas compartilham uma constante: o reconhecimento limitado e a ausência de procedimentos e implementação de iniciativas claras de promoção e proteção de direitos para os povos isolados.

O relatório conta com a participação de 47 especialistas, 16 organizações indígenas e aliadas de sete países sul-americanos (Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Paraguai, Peru e Venezuela) e mais de 80 entrevistas. Nele, são reunidas e analisadas as normativas vigentes na região, oferecendo ferramentas metodológicas, princípios e diretrizes que podem ser adotadas pelos Estados e pelas organizações da sociedade civil, com o objetivo de fortalecer os mecanismos de identificação dos povos isolados e de seus territórios.

De acordo com Vaz, o reconhecimento da existência de um povo indígena em isolamento é o primeiro passo para se garantir e salvaguardar os demais direitos, bem como dar visibilidade à situação de extrema vulnerabilidade a que esses povos estão submetidos.

— O direito de existir é um direito fundamental. Cabe aos Estados promover esses povos à condição de sujeitos de direitos, implementando politicas especiais de proteção que reconheça seu direito à autodeterminação, expressa na condição de isolamento — completa.

Desta terça-feira até o 02 de maio, a ONU seguirá com o fórum cujo tema central é a “Implementação da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas nos Estados-Membros das Nações Unidas e no sistema das Nações Unidas, incluindo a identificação de boas práticas e o enfrentamento dos desafios”.

Além disso, povos indígenas, organizações indigenistas e Estados-Membros debaterão as seis áreas obrigatórias do Fórum, com referência tanto à Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas (UNDRIP) quanto à Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.

Os Povos Indígenas em Isolamento e Contato Inicial (PIA) são povos ou segmentos de povos indígenas que não mantêm contatos regulares com a população majoritária e que, além disso, costumam evitar qualquer tipo de contato com pessoas alheias ao seu grupo. Enfrentam ameaças constantes à sua vida e território devido a atividades extrativistas, desmatamento e à falta de reconhecimento legal adequado.

O GTI PIACI pretende com o documento posicionar os princípios e diretrizes metodológicas de reconhecimento dos povos isolados como referência para os governos da região e para todos que atuam na proteção e defesa dos Povos Indígenas em Isolamento, destacando a importância do seu reconhecimento oficial por meio de mecanismos claros e que respeitem sua autodeterminação e o direito de permanecerem em isolamento.

O direito dos povos indígenas à autodeterminação, garantido no artigo 14 da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, também implica o respeito e a garantia da decisão dos Povos em Isolamento de permanecerem isolados.

Apesar da existência de normativas internacionais – como as Diretrizes do ACNUDH/ONU (2012) e o Relatório da CIDH/OEA (2013) – que orientam a proteção desses povos, ainda há lacunas significativas quanto à metodologia de reconhecimento da existência dos povos isolados.

Dados do Relatório Regional de Metodologia

O objetivo do Relatório Regional Metodológico (IRM) é oferecer princípios e diretrizes para a formulação de metodologias específicas para o reconhecimento dos povos isolados. O IRM propõe que o reconhecimento seja feito com base em evidências da presença dos povos na floresta, e não no contato direto com os indivíduos — respeitando assim o princípio do “não contato” e o direito à autodeterminação desses povos.

Diretrizes para Proteção dos Povos Isolados e de Recente Contato

Para proteger efetivamente os povos isolados, é essencial que os Estados criem estruturas institucionais específicas com recursos adequados e atuação coordenada entre:

  • Assessoria Jurídica – com advogados especializados em Povos Indígenas, PIACI e meio ambiente.
  • Assistência Social – com antropólogos, assistentes sociais, sociólogos e profissionais com experiência em PIACI.
  • Assessoria em Saúde – com médicos, enfermeiros e especialistas em saúde intercultural e saúde pública voltada aos PIACI.
  • Assistência Técnica de Campo – com especialistas em reconhecimento de PIACI, georreferenciamento, condução na selva e manejo de mapas.
  • Assistência Etnocultural – com especialistas indígenas e xamãs para uma compreensão cultural das evidências.

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