Estratégia maior de Maduro semeia desordem na oposição – novamente

CARACAS – Em menos de 45 dias, a Venezuela passará por um novo teste político: as controvertidas eleições regionais e legislativas, que poderão consolidar ainda mais o regime de Nicolás Maduro. Nas ruas, porém, não há cartazes nem comícios de campanha; o Conselho Nacional Eleitoral ainda não seguiu os procedimentos legais anteriores a uma eleição, e seu site está fora do ar desde julho do ano passado, o que evidencia a opacidade e a desordem em torno do processo. A única agitação decorre das intermináveis discussões dentro de uma oposição fragmentada, incapaz de apresentar um caminho claro a seguir.

A sensação de paralisia tornou-se ainda mais evidente no início de março, quando Omar Barboza deixou o cargo de secretário-executivo da opositora Plataforma Democrática Unitária (PUD). Seu mandato de quase quatro anos incluiu a coordenação das primárias da oposição em 2023 e as campanhas das disputadas eleições de 28 de julho, quando Edmundo González Urrutia derrotou Maduro, que fraudou os resultados para permanecer no poder. No entanto, não foi a repressão governamental que ocasionou a saída de Barboza. Em sua carta de renúncia, ele citou uma falta de “unidade” da coalizão e “vazamentos” que minam qualquer discussão honesta como os fatores determinantes.

Apesar de manter uma unidade notável durante a campanha presidencial do ano passado, a diversificada e multipartidária oposição venezuelana mergulhou recentemente em uma guerra interna total após María Corina Machado, a líder política mais proeminente enfrentando o regime de Maduro, e González descartaram participar das eleições organizadas pelo governo este ano em razão de falta de garantias políticas e eleitorais. “Fazer eleições repetidamente sem respeitar os resultados não é defender o voto, é distorcer o voto popular”, disse Machado em janeiro.

A PUD seguiu o exemplo. Como pré-requisitos para participar das eleições, a coalizão exigiu novas autoridades eleitorais, garantias políticas e eleitorais, retorno de exilados e a libertação dos presos políticos. A maioria dos principais líderes da oposição — assim como centenas de ativistas — foi presa, forçada a partir para o exílio ou entrou na clandestinidade nos meses recentes, incluindo Machado, que está escondida em Caracas, e González, que vive exilado na Espanha.

“O país não quer votar e expôs claramente suas razões”, disse à AQ a cientista política Paola de Alemán, uma das vice-presidentes do Primeiro Justiça, o principal partido da oposição. As razões são bastante claras: a eleição presidencial de 28 de julho comprovou a capacidade do governo de fraudar resultados, os partidos de oposição continuam proibidos e muitas testemunhas nas seções eleitorais — responsáveis por coletar atas eleitorais capazes de expor fraudes eleitorais — foram presas ou intimidadas posteriormente.

As eleições de 25 de maio terão 285 cargos legislativos em disputa, incluindo assentos para a região de Esequibo, cuja soberania a Venezuela reivindica em detrimento da Guiana. Atualmente, quase 70% da Assembleia Nacional venezuelana é controlada pelo partido que ocupa o poder, com as cadeiras restantes sob controle de partidos que se autodenominam opositores, mas que raramente discordam do governo — transformando o Parlamento em um instrumento de ratificação para Maduro. A oposição tradicional boicotou as eleições parlamentares mais recentes, em 2020, depois que o Judiciário, de maioria chavista, retirou os poderes da Assembleia após a vitória esmagadora da oposição em 2015. Os eleitores também escolherão, supostamente, 24 governadores. Quatro Estados são governados por figuras nominalmente da oposição, três deles estavam – até recentemente – alinhados com a Plataforma Unitária.

Ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, fala com apoiadores em Caracas. Estratégia do chavismo fragmentou a oposição antes das eleições legislativas. Foto: Cristian Hernandez/Associated Press

Oposição fragmentada

A decisão de Maduro de antecipar as eleições, que geralmente são realizadas no fim do ano, parece ser uma jogada calculada com o objetivo de reorganizar o cenário político antes que a pressão aumente ainda mais, tanto internamente quanto internacionalmente. Com os Estados Unidos revogando as licenças de exploração de petróleo de empresas como a Chevron, ameaçando impor tarifas a outros compradores de petróleo venezuelano e uma oposição fragmentada ainda se recuperando da repressão e do exílio, o regime está apressando o cronograma para desorientar adversários e recompensar colaboradores. Ao dar celeridade à votação, Maduro está encurralando críticos como a Plataforma Democrática Unitária ao mesmo tempo que oferece uma tábua de salvação a figuras nominalmente oposicionistas dispostas a operar segundo suas regras, o que aprofunda as divisões em uma coalizão já frágil.

Embora o partido de Machado e a maioria dos integrantes da PUD — dez partidos, incluindo os quatro maiores grupos não chavistas do país — tenham apoiado a posição de Machado e González, outros criticaram abertamente a decisão e anunciaram sua intenção de participar do processo eleitoral. Entre eles estão o partido Um Novo Tempo (UNT), liderado por Manuel Rosales, governador do populoso Estado de Zulia, e o partido minoritário de esquerda Movimento pela Venezuela (MPV). A Plataforma Unitária não descarta a expulsão de ambos os partidos dissidentes.

Um partido sob pressão

O caso do ex-candidato à presidência Henrique Capriles reflete dificuldades internas e conflitos nas fileiras da oposição. Na segunda-feira, seu partido, o Primeiro Justiça (PJ), expulsou o político e outros cinco membros por “trair” a decisão unitária antichavista de não participar das eleições regionais. No início deste mês, Capriles e Henri Falcón, outro ex-candidato à presidência na disputa de 2018, lançaram uma plataforma política chamada Rede Cidadã em Defesa da Democracia (DECIDE), incentivando seus seguidores a participarem da eleição de 25 de maio. “Democratas não têm outra opção melhor a não ser usar seu voto”, disse Capriles em 7 de abril.

Em meio às disputas internas do Primeiro Justiça, uma enxurrada de declarações à imprensa e contracomunicados: alguns atacando a legitimidade da presidente do partido, María Beatriz Martínez, outros acusando os caprilistas de “normalizar” a situação ou sabotar os processos internos do partido.

“Tenho sérias dúvidas sobre a política de abstenção poder ser útil neste momento, porque isso é exatamente o que Maduro quer: que não votemos, porque então ele imporá, sem nenhum custo, uma Assembleia Nacional e governadores sob medida para atender às suas necessidades”, disse à AQ o economista José Guerra, que é próximo a Capriles e foi parlamentar pelo Primeiro Justiça.

Petróleo e política

A economia fadada à recessão complica o cenário político. A revogação da licença da Chevron, que processava aproximadamente 230 mil barris de petróleo por dia, surtirá um impacto macroeconômico de curto prazo severo, de acordo com a consultoria Ecoanalítica. Rescisões de licenças de outras empresas também deverão afetar uma produção adicional de 70 mil barris por dia.

A produção de petróleo sob essas licenças representa “30% da produção total e 40% do fluxo de divisas recebido pelo Estado venezuelano”, segundo o diretor da Ecoanalítica, Asdrúbal Oliveros. Ele observou que isso provavelmente ocasionará desvalorização e o ressurgimento da inflação de três dígitos, projetada em 130% e 150% este ano. A consultoria também estima uma contração econômica de 2% a 3% em 2025, em comparação com uma previsão de crescimento de 3% no início do ano. “Também estamos observando uma deterioração das condições econômicas internas, o que pode exacerbar tensões sociais”, disse Oliveros à AQ.

Mas ainda que a profunda crise na Venezuela seja anterior às sanções dos EUA e a economia venezuelana tenha mostrado sinais de piora desde as eleições de julho, muitos especialistas temem que o retorno da estratégia de “pressão máxima” também afete os venezuelanos comuns sem que haja uma mudança de regime. A eficácia das sanções “vem diminuindo drasticamente nas últimas duas décadas, especialmente se o objetivo declarado explicitamente pelos Estados que as emitem for tentar estimular a democratização”, disse à AQ o cientista político venezuelano John Magdaleno. “Não há dúvida de que o regime enfrenta atualmente uma dificuldade sistêmica que nunca existiu antes. Discordo veementemente daqueles que apontam que participar da eleição foi inútil e, portanto, será inútil daqui adiante.”

Na heterogênea oposição venezuelana, contudo, as opiniões divergem. “Já participamos de eleições com poucas condições antes, mas desta vez praticamente não há condições”, disse à AQ o novo secretário-executivo da Plataforma Unitária, Roberto Enríquez, líder do COPEI, um pequeno partido de oposição. “A maioria dos nossos candidatos está presa, exilada, sob asilo político ou escondida. O governo nos negou a chapa da Unidade (na cédula). O árbitro é o mesmo de 28 de julho”, acrescentou ele. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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