Estilo de vida – Tribuna do Norte

Cláudio Emerenciano
Professor da UFRN

O crescimento do espírito dignifica as relações humanas. Eleva-as às dimensões civilizadas, onde predominam paz, harmonia e solidariedade. Os conflitos sociais expressam eloquentemente ruptura entre os ideais e a realidade, os sonhos e as contradições da vida. O homem jamais pode sepultar seus mais puros anseios. Nenhuma nação sobrevive sem preservar sua cultura, seus valores e sua identidade. Não se pode destruir o legado de gerações passadas, sua maneira de ser, querer, agir e pensar coexistentes na alma e nos sentimentos dos que a fazem no presente. Nesse sentido, o tempo não se demarca nem se individualiza. A nação é o que é, o que foi e assim será. É uma entidade, um ser intemporal que se aperfeiçoa, evolui, sem deformar sua própria gênese. A nação está viva em cada membro da sociedade

Inexplicavelmente essa questão, sujeita às perplexidades e antagonismos do momento no Brasil e no mundo, suscita o que Stefan Zweig chamou de “momentos supremos da condição humana”. Lembro-me de alguns episódios, singulares e pessoais, que ressaltam o peso, a força, o vigor e o papel de intelectuais no aprimoramento espiritual, moral, ético e cultural da humanidade. Alcançaram dimensão universal. Consagraram a identidade nacional dos seus personagens. Enriqueceram a individualidade de suas nações. Foi o caso de Camões, sobrevivendo a um naufrágio no litoral do norte da África. Cego de um olho, nadou com um só braço, pois no outro segurava os originais de “Os Luzíadas”. Obra-prima que delineou o ser da nação portuguesa, do mesmo modo que a “A Divina Comédia”, de Dante Alighieri, conferiu personalidade mítica e mística até hoje à Itália. No pós-guerra, em 1945, a obra-prima de Hermann Broch (austríaco) “A morte de Virgílio” desmascarou a tentativa infame de Stálin de ignorar e eliminar o espírito nacional austríaco. Hermann Broch foi opositor do nazismo desde 1934. Fugiu de um cárcere da Gestapo para os Estados Unidos, em 1938, com a roupa do corpo e os originais do seu livro, que se tornou um dos cânones da cultura universal. Atualmente se tenta minimizar esse espírito nacional, no curso das distorções geradas pela globalização e pela desumanidade das guerras, da violência desenfreada e do terrorismo. Não se pode esquecer a lição de Erasmo de Roterdam. No “Elogio da Loucura” pressagiava que a humanidade teria de harmonizar, um dia, a nação e a universalização. Premonição dos nossos dias e formulação do humanismo cristão. Legados vivos e vigorosos. Patrimônio de pensamento e vida das nações.

São Paulo disse que o Espírito Santo paira sobre a Terra Humana. Consola-a e a Inspira. A verdade sempre triunfa. Sem ódio e sem medo. É questão de tempo. Mas a indignação é manifestação legítima e irrenunciável. Os políticos e as instituições estão em descrédito. Há uma crise de confiança. A nação é o estilo de vida que violentam. Até quando?

Ao longo de cinco séculos, desde sua descoberta, com incríveis e aberrantes contradições, tomou corpo no Brasil uma forma de viver. Para muitos realidade. Para outros aspiração. Para outros tantos exclusão. Raymundo Faoro em “Os donos do Poder”, Gilberto Freyre em “Casa grande e Senzala” e “Sobrados e Mocambos”, Sérgio Buarque de Holanda em “Raízes do Brasil”, entre outras notáveis obras, dissecaram essa questão. Existe no seio do nosso povo, predominantemente, um modo de convivência social, de laços humanos e cristãos. Esse estilo de vida está em processo de erosão. De um lado, a ineficácia governamental para conter e erradicar a crescente onda de violência. Do outro, a influência ostensiva da internet e da televisão em cerca de 70% (setenta por cento) da população, que habitualmente não leem. Sua “opinião” é formada pela “mídia eletrônica” sem compromissos éticos e morais. O atual desmoronamento moral e espiritual do Brasil é um fenômeno susceptível de afetar o futuro das novas gerações. É estarrecedora a insensibilidade de dirigentes ao desmonte cultural do país. Sucede numa espécie de convulsão incontrolável. E a arte de viver dos brasileiros? Como fica?

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