“Direito a governar” em Angola “perdeu a validade” – DW – 06/05/2025

A Associação CEDESA defende que Angola atravessa uma “transformação significativa” na sua legitimidade política, deixando para trás o “direito a governar” historicamente associado ao Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA).

De acordo com o Centro de Estudos para o Desenvolvimento Económico e Social de África, esta mudança é impulsionada pelo crescente número de cidadãos que pagam impostos e que exigem maior representatividade e responsabilidade dos governantes, numa altura em que o Estado depende cada vez mais das receitas fiscais não petrolíferas.

Em entrevista à DW, Rui Verde, jurista e vice-presidente CEDESA, explica que a retirada progressiva dos subsídios aos combustíveis e a necessidade de diversificação económica intensificam esta nova dinâmica, aproximando o poder político da sociedade civil.

Além disso, com uma população maioritariamente jovem e sem ligação emocional à guerra civil, os fundamentos históricos do poder perdem força, abrindo caminho para uma nova legitimidade baseada na participação económica e cívica dos angolanos.

Rui Verde, jurista e vice-presidente CEDESA
Rui Verde: “Uma boa parte do dinheiro do petróleo foi esbanjado”Foto: João Carlos/DW

DW África: Como é que a CEDESA avalia a atual legitimidade política do MPLA em Angola?

Rui Verde (RV): A legitimidade política do MPLA em Angola tem duas fases. Uma primeira fase que resultou da vitória na guerra civil em 2002 e do bom petróleo, portanto, é uma legitimidade que deriva dessa vitória e do facto de ter dinheiro para o mundo do petróleo, em que não precisava propriamente do apoio da população, uma vez que era uma legitimidade que tinha outras raízes.

A questão é que a guerra já acabou há mais de 20 anos e a maior parte dos angolanos, cerca de 65% dos angolanos têm menos de 25 anos, portanto, a guerra já não tem aquele peso que teve no passado e a vitória da guerra ainda menos.

E um segundo aspeto é que uma boa parte do dinheiro do petróleo foi esbanjado, sobretudo entre os anos 2002 a 2014 e não serviu propriamente para o desenvolvimento económico e social do povo angolano, pelo que agora precisa-se daquela velha história que serviu para construir as várias democracias por todo o mundo. Precisa-se que a população pague impostos e a partir do momento em que se vai pedir à população para pagar impostos, a legitimidade já não assenta no poder da vitória da guerra, mas inverte-se. É a população que paga impostos que passa a ter legitimidade para decidir quem está no poder.

É por isso que as eleições em 2027 vão ter que corresponder já à vontade do povo diretamente sem a intermediação do fantasma da guerra ou da utilização do petróleo.

Refinaria de petróleo no Soyo, Angola
Subsídios aos combustíveis, que representam um custo elevado para o Orçamento Geral do Estado, chegaram a 9,1 biliões de kwanzas (8,6 mil milhões de euros) entre 2021 e 2024Foto: Borralho Ndomba/DW

DW África: O pagamento de impostos vai influenciar a relação entre o Estado e a população?

RV: É esse precisamente o ponto. Há uma inversão. A população deixa de estar dependente do Estado, como se vê, por exemplo, na retirada parcial do subsídio de combustíveis que está a acontecer, e é o Estado que passa a estar dependente da população. Porque é a população que começa a financiar o Estado e isso parece que é um detalhe, mas acaba por ser muito importante, porque quando a pessoa sente no seu bolso é que começa a tomar posições mais drásticas.

DW África: Que consequências podemos antecipar?

RV: As pessoas vão ser muito mais exigentes na observação de todo o processo eleitoral de 2027. Vai ser certamente muito mais democrático e transparente, porque haverá essa exigência por todo o lado.

DW África: Qual a perspetiva quanto ao futuro da governação em Angola considerando o contributo económico crescente dos cidadãos?

RV: O futuro é que a governação vai ter que definitivamente se virar mais para o povo e mais para agradar à população, porque antigamente o Governo tinha o petróleo e não tinha que ligar muito ao povo. Agora já não tem o petróleo a desempenhar esse papel, tem que ouvir o povo e essa é a grande mudança. Qualquer que seja o futuro Governo, seja do MPLA, seja da UNITA, seja de outras forças que apareçam tem que ser sempre um Governo que ouve o povo e essa é a grande mudança estrutural. Já não é possível haver um divórcio entre Governo e povo.

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