O governo brasileiro não teve qualquer envolvimento na saída dos quatro asilados venezuelanos que estavam na Embaixada argentina em Caracas (a quinta asilada escapou em agosto do ano passado, pulando um muro) na última terça-feira. Apesar de ter assumido a custódia dos interesses da Argentina de Javier Milei após a ruptura de relações entre a Casa Rosada e o Palácio Miraflores, depois da escandalosa eleição presidencial venezuelana de 28 de julho de 2024, o Brasil não foi informado de nada do que estava acontecendo. As mais altas autoridades do governo Lula, incluído o presidente, ficaram sabendo da saída dos asilados, que eram uma enorme dor de cabeça para o Brasil, quando a notícia começou a circular. A reação imediata foi de enorme alívio. E continua sendo.
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Pesou mais o alívio do que a revolta de ter sido ignorado depois de ter assumido uma responsabilidade que nenhum outro país quis assumir. Mesmo depois de a ditadura venezuelana ter retirado a custódia brasileira unilateralmente, no ano passado. Naquele momento, setores do governo brasileiro, talvez com certa ingenuidade, decidiram manter o apoio aos argentinos e seus protegidos. Eram levados medicamentos, alimentos, foi conseguido um gerador elétrico e pedida, com insistência, a concessão de um salvo-conduto para que pudessem sair do país.
Mas o Brasil não tem mais a influência que já teve em Caracas, e a resposta foi sempre negativa. Para alguns, foi um erro da nossa diplomacia. Para outros, um exemplo de diplomacia profissional. Estou entre os que pensam que o Brasil fez o correto, e pagou os custos por isso.
Existem duas hipóteses fortes sobre o que permitiu a saída dos asilados. A versão de uma fuga cinematográfica, defendida pela oposição, não convence Brasília. Uma fonte oficial me explicou os motivos pelos quais essa versão é pouco verossímil. Primeiro, a residência argentina, vizinha da russa, esteva fortemente cercada nos últimos meses. Policiais dentro e fora da casa. Era praticamente impossível tirar quatro pessoas de lá sem que a ditadura de Maduro percebesse.
A oposição argumenta que houve cumplicidade de pessoas de dentro do regime e que foi realizada “uma operação impecável da CIA (agência secreta americana)”. Se isso for verdade, a ditadura perdeu o controle do país. O próximo passo poderia ser a queda de Maduro. O tempo dirá se essa versão faz sentido ou não.
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Na Venezuela, a guerra de narrativas é uma constante na dinâmica política nacional. Cubro o país há 25 anos e posso dizer com algum conhecimento que é preciso duvidar do que dizem os dois lados, sempre. Neste caso, o chavismo está em silêncio, quase absoluto. Mas uma militante chavista próxima de Diosdado Cabello, número 2 da ditadura, disse em suas redes sociais que houve uma negociação.
Essa é a segunda hipótese: um acordo que envolveria a ditadura de Maduro, a oposição e o governo de Donald Trump. Teria sido negociado? Ninguém sabe. Neste caso, os asilados teriam saído do país com um salvo-conduto. No entanto, se houve negociação, a oposição jamais admitirá isso, por óbvias razões: uma das bandeiras de sua líder, María Corina Machado, é jamais negociar com Maduro. Quem negocia com Maduro, para a oposição mais forte hoje no país, é tratado como traidor.
Seja como for, o Brasil se livrou de um baita abacaxi venezuelano, que significava, em palavras de uma fonte do governo brasileiro, “um barril de pólvora”.
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