Caso Luighi expõe desafios culturais para punir o racismo – 07/03/2025 – Esporte

A declaração emocionada do jogador do Palmeiras Luighi após sofrer com um caso de racismo no Paraguai em jogo pela Libertadores sub-20 na noite de quinta-feira (6) provocou forte comoção no meio.

Clubes e atletas publicaram mensagens em apoio ao atleta de 18 anos, que demonstrou maturidade ao questionar o jornalista que o entrevistava após a partida se ele iria ignorar o gesto de macaco de um torcedor.

“É sério isso? Vocês não vão me perguntar sobre o ato de racismo que ocorreu hoje comigo? É sério? Até quando vamos passar por isso? Me fala, até quando? O que fizeram comigo é crime, não vai perguntar sobre isso?”, afirmou com lágrimas nos olhos.

A Conmebol (Confederação Sul-Americana de Futebol) disse condenar os ataques e que “medidas disciplinares apropriadas serão implementadas, e outras ações estão sendo avaliadas em consulta com especialistas da área”. Não detalhou o que pretende fazer e, procurada pela reportagem, não quis se manifestar.

O presidente Lula também usou as redes sociais para condenar os atos racistas. “O futebol significa trabalho coletivo, superação e respeito. Racismo significa o fracasso da humanidade. Basta de ódio disfarçado de rivalidade”, escreveu.

A Conmebol diz no estatuto que seu objetivo é “promover o futebol na América do Sul respeitando os direitos humanos, num espírito de paz, compreensão e jogo limpo, garantindo que não haja discriminação no campo do futebol de um indivíduo ou grupo de pessoas por razões políticas, de gênero, religião, raça, origem étnica, nacionalidade ou qualquer outro motivo”.

O código disciplinar da entidade estabelece que o clube cujo torcedor for pego cometendo atos discriminatórios será multado em US$ 100 mil (R$ 576,8 mil). Em caso de reincidência, o valor sobe para US$ 400 mil (R$ 2,3 milhões).

As punições, assinalam os especialistas, embora necessárias, estão longe de serem o suficiente para acabar com as manifestações, que passam também pela própria interpretação de cada país a respeito.

“O racismo tem várias formas de manifestação. As leis paraguaias em relação ao racismo não são as mesmas que no Brasil. A discussão de racismo no Paraguai avança mais em relação aos povos indígenas”, diz Leda Maria da Costa, pesquisadora do Observatório Social do Futebol, da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro).

Ela chama atenção para a naturalidade do Cerro Porteño, do árbitro e dos policias em relação ao caso, sem que nenhuma ação concreta fosse tomada.

“A gente começou a reivindicar também com a própria polícia e com o terceiro árbitro, mas o próprio banco do Cerro estava indo contra, querendo que mirasse para o jogo e tentando entender que aquilo era normal. E que é normal no país, eles acham que é uma provocação”, disse João Paulo Sampaio, coordenador da base do Palmeiras.

Presidente do clube, Leila Pereira criticou o árbitro da partida por não ter paralisado o jogo e afirmou que irá trabalhar pela exclusão do Cerro Porteño da competição.

“Não é a primeira vez que esse clube ataca nossos atletas, nossos torcedores”, disse a mandatária, acrescentando que não conseguiu contato com dirigentes da Conmebol. “Eu tentei falar com o presidente da Conmebol e não consegui”, afirmou, em referência ao paraguaio Alejandro Domínguez, que comanda desde 2016 a confederação, cuja sede fica em Assunção.

Eventual punição ao clube paraguaio deverá ser decidida nos próximos dias pela comissão disciplinar da Conmebol, com base na súmula do árbitro e do delegado da partida.

“É preciso que haja a punição, mas também um processo de educação no sentido mais amplo possível de formação de torcedores. Aquela criança [nos ombros do homem que fez os gestos racistas] está sofrendo um aprendizado de como ser racista”, afirma a pesquisadora.

Professor do curso de pós-graduação História Sociocultural do Futebol, no departamento de história da USP (Universidade de São Paulo), Flávio de Campos nota que, diante de um ambiente permissivo, as manifestações de cunho racial extrapolaram as partidas das equipes principais, chegando às categorias de base e ao futebol feminino.

“Estamos em um mundo violento e agressivo, e o futebol não está fora disso. É um equívoco ver episódios de violência no futebol deslocados dessa violência que a sociedade contemporânea está produzindo”, diz ele.

Álvaro Martin Ferreiro, mestre em Direito Internacional do Esporte, avalia que a Uefa (União das Associações Europeias de Futebol) tem até mais meios para tentar coibir atos racistas em comparação com a Conmebol.

Ele aponta que, além de multas mais altas, a confederação europeia prevê portões fechados e banimento de torcedores como punição para manifestações racistas.

Medidas mais drásticas, contudo, como a perda de pontuação em competições, ainda não foram adiante. “Há medidas a tomar, mas elas não são executadas.”

Vinicius Junior, um dos jogadores que mais tem sofrido com o racismo nos últimos anos, publicou uma mensagem em apoio ao jogador do Palmeiras.

“Parabéns pelo posicionamento, mano. É triste, mas fique forte. Vamos juntos nessa luta. Até quando, Conmebol? Vocês nunca fazem nada. NUNCA!!!!”, escreveu.

Nesta quinta, a La Liga, entidade que organiza o Campeonato Espanhol, apresentou uma queixa sobre racismo junto à polícia do País Basco. No dia 26 de fevereiro, um torcedor do Real Sociedad insultou Vinicius Junior, também com gestos imitando um macaco.

O incidente se deu em jogo da Copa do Rei, torneio análogo à Copa do Brasil e que não é organizado por La Liga. Mesmo assim os integrantes da entidade resolveram arcar com o processo, como parte de seu programa de combate aos insultos e violência nos estádios.

São 48 processos ao todo, a imensa maioria por ofensas racistas, dos quais quase metade –23– envolvem Vinicius Junior.

Em junho de 2024, a Justiça da Espanha condenou pela primeira vez a oito meses de prisão três torcedores do Valência acusados de proferirem insultos racistas contra o brasileiro.

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