Cabo Verde ainda não tem regulamentação para o mercado de suplementos alimentares

O consumo de suplementos como Whey Protein e Creatina tem crescido entre os praticantes de exercício físico, impulsionado pelos seus benefícios na recuperação muscular e no desempenho desportivo. Apesar da crescente procura, até mesmo entre os não praticantes de exercícios, a importação e comercialização destes produtos ainda carecem de uma regulamentação para garantir a segurança, qualidade e eficácia dos suplementos alimentares disponíveis no mercado, visando proteger a saúde pública.

Ana Paiva, praticante assídua de exercício físico, iniciou o seu percurso no ginásio em Janeiro de 2022, com o acompanhamento de um personal trainer, até considerar que estava apta para treinar sozinha.

Desde então, conta ao Expresso das Ilhas que experimentou diferentes suplementos, incluindo Mass Gainer, creatina, whey protein e magnésio.

“No início, a personal recomendou a proteína porque eu era muito magra e precisava de ganhar peso. Esses dois suplementos ajudam no ganho de massa”, explica.

Mais tarde, por iniciativa própria, Ana decidiu introduzir a creatina na sua rotina, baseada nas pesquisas que realizou na Internet.

“Quanto ao Mass Gainer, não usei por mais de três meses porque é muito doce e não gosto muito de doces. Também não via grande progresso, mas talvez fosse porque, na altura, não tinha tanta disciplina”, acrescenta.

Um dos desafios que encontrou no consumo de suplementos foi a sua intolerância à lactose.

“Deixei de consumir alguns suplementos porque a maioria dos que usava continha lactose e eu sou intolerante. Ultimamente, tenho pesquisado para saber se há outras opções sem lactose que não sejam veganas e descobri que, afinal, existem, mas ainda não experimentei. Por enquanto, tenho usado proteínas veganas”, explica.

Apesar das várias experiências, há um suplemento do qual não abdica: a creatina. “De resto, posso substituir pela alimentação, comer bem e descansar. Mas não abro mão da creatina porque sei que é benéfica até para quem não treina, já que ajuda na memória”, afirma.

A questão financeira também pesa na escolha dos suplementos. “Os meus companheiros de treino normalmente usam creatina e whey. Eu, devido às minhas condições financeiras, consumo o básico que funciona: comer bem, treinar bem e descansar”, admite.

A perspectiva dos vendedores

O aumento da procura por suplementos também é sentido pelos comerciantes do sector.

Na cidade da Praia, numa das lojas que oferecem este tipo de produtos, podemos constactar uma grande diversidade de suplementos, como creatina, whey protein, massa muscular, vitamina C, D, D3 e K2, magnésio, ómega, tríbulos, arginina, entre outros.

Segundo o vendedor Gilson Alves, os suplementos mais procurados são a creatina e o whey protein.

“Há muita procura. A maioria dos clientes são pessoas que frequentam o ginásio, mas há aquelas que não frequentam e que compram”, relata.

Conforme explica, há clientes que procuram os suplementos por indicação médica. “Não chegam com receitas, mas trazem sempre um papel com o nome do suplemento indicado pelo médico, até porque não são produtos com comparticipação do INPS. Aqui, damos a indicação de como a pessoa pode consumir esses produtos”, complementa.

Ao ser contratado, Gilson Alves diz que recebeu uma formação sobre os suplementos, as suas finalidades e os seus modos de consumo, precisamente para instruir os clientes.

“Também faço as minhas pesquisas e estudo os produtos para saber como devem ser consumidos antes de os indicar aos clientes. Mensalmente, vendemos muitos produtos. É um negócio rentável”, afirma.

Já há menos preconceito em relação aos suplementos

Segundo o personal trainer e atleta de Mister Man Physique, Keven Gomes, os suplementos não apresentam riscos para a saúde, desde que sejam consumidos correctamente.

“Se não forem ingeridos da forma correcta, não trazem benefícios. São suplementos alimentares, produtos desenvolvidos com muito estudo e controlo. Não apresentam nenhum risco para a saúde, apenas benefícios. Muitas pessoas têm uma percepção errada desses produtos, achando que são remédios”, esclarece.

Nesse sentido, exemplifica que pesquisas recentes demonstram os benefícios da creatina para idosos. “Foi publicado um estudo que mostra que idosos que consomem creatina têm maior imunidade e resistência em comparação com aqueles que não consomem”, menciona.

Por essa razão, o personal trainer recomenda o uso desses suplementos aos seus alunos e também os importa para vender.

“Tenho pessoas fora do país que compram, mandam e eu vendo. Dou indicações dos suplementos que quero e mandam. Antes, havia muito preconceito, mas hoje as pessoas já têm a mente mais aberta e encaram o assunto de forma diferente. Antes, achavam que todos os suplementos eram anabolizantes”, relata.

Sobre esses dois produtos, Keven clarifica que os suplementos sozinhos não fazem milagres; servem apenas para reforçar a alimentação diária.

Já os anabolizantes e hormonas, segundo diz, são substâncias utilizadas apenas por atletas profissionais que buscam competir em alto nível.

“Os atletas afirmam que, para competições como o Mister Olympia, o uso de anabolizantes pode ser necessário. Mas não é aconselhável para quem não é atleta, devido aos riscos que apresenta”, alerta.

O profissional adverte ainda que o uso excessivo de hormonas pode impactar a fertilidade masculina.

“No caso das hormonas, há a tendência de reduzir a produção de esperma, podendo até levar à infertilidade. O mesmo acontece com o uso exagerado de anabolizantes”, diz.

Sobre a comercialização dessas substâncias em Cabo Verde, Keven afirma não ter conhecimento concreto, mas já ouviu relatos de pessoas dispostas a consumir, mesmo cientes dos riscos.

“Eu sempre aconselho um treino limpo. Algumas pessoas, quando vão ao Brasil, trazem esses produtos, mas não sei se circulam por aqui”, finaliza.

Especialista alerta para o risco de suplementos ilegais e falsificados

Outro desafio no mercado dos suplementos alimentares em Cabo Verde é a presença de produtos ilegais ou de origem duvidosa, que podem representar riscos significativos para a saúde dos consumidores.

De acordo com a farmacêutica e especialista em regulação de produtos de saúde, Mariana Tavares, a falta de regulamentação específica facilita a entrada de suplementos sem certificação adequada.

“Muitos suplementos comercializados no país chegam sem qualquer controlo de qualidade. Alguns podem conter substâncias proibidas, doses inadequadas de nutrientes ou até ingredientes não declarados no rótulo, o que coloca a saúde do consumidor em risco”, alerta.

A especialista explica que há relatos de suplementos vendidos como naturais, mas que contêm substâncias químicas não permitidas, como estimulantes e anabolizantes disfarçados.

“Existem marcas sem credibilidade que não seguem padrões internacionais de segurança e, infelizmente, acabam por ser vendidas livremente no mercado cabo-verdiano”, acrescenta.

Como identificar suplementos seguros

Para evitar a compra de produtos falsificados ou sem certificação, Mariana Tavares recomenda que os consumidores estejam atentos a alguns critérios antes de adquirir suplementos alimentares:

Verificar se o produto tem um rótulo claro e detalhado, contendo a lista completa de ingredientes, informações nutricionais e o nome do fabricante.

Desconfiar de promessas milagrosas, como ganhos musculares rápidos ou emagrecimento instantâneo.

Dar preferência a produtos vendidos em farmácias ou lojas especializadas, evitando compras informais ou em plataformas online sem credibilidade.

Consultar sempre um profissional de saúde antes de iniciar o consumo de qualquer suplemento.

Impacto da regulamentação na fiscalização e segurança

Com a futura implementação do diploma proposto pela ERIS, espera-se que haja um maior controlo sobre a comercialização dos suplementos alimentares no país.

“A regulamentação trará um impacto positivo na fiscalização e segurança dos produtos, impedindo que suplementos de qualidade duvidosa sejam vendidos no mercado cabo-verdiano”, afirma Patrícia Alfama.

Além disso, a nova legislação permitirá que os consumidores tenham acesso a produtos certificados e que atendam às normas internacionais de qualidade.

“Nosso objectivo é garantir que o consumidor tenha confiança naquilo que está a comprar e a consumir, minimizando os riscos para a saúde”, conclui.

Enquanto a regulamentação não é oficialmente aprovada, os especialistas recomendam que os consumidores adoptem uma abordagem criteriosa na escolha dos suplementos, priorizando a segurança e a orientação profissional. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1213 de 26 de Fevereiro de 2025.

Crédito: Link de origem

- Advertisement -

Deixe uma resposta

Seu endereço de email não será publicado.