A crise complica cenário do Brasil

Para o Brasil, a crise atual das tarifas complica bastante a situação econômica. No melhor cenário, haveria queda do ritmo de crescimento, porém com desinflação, o que permitiria parar de subir os juros mais rapidamente. Em outro cenário, a desaceleração do PIB ou até recessão, viria com aversão a risco, desvalorizando o real diante de outras moedas. E, mesmo com a queda dos preços das commodities, a inflação permaneceria alta, não dando espaço para reduzir taxa de juros. Na política econômica, a guerra de Donald Trump inaugura um ciclo de maior perigo.

Uma coisa é absolutamente certa: haverá uma desaceleração na economia americana, que afetará outras economias. Um economista do governo com quem conversei descreveu assim: “Mesmo que o presidente Donald Trump revogue hoje as tarifas, a incerteza é muito eficiente em gerar uma desaceleração, porque todo mundo posterga investimentos. O tamanho da incerteza que ele colocou na economia é muito grande e já está produzindo impacto. Nos últimos dias, cresceu a possibilidade de não ser apenas uma desaceleração, e sim uma recessão”.

Quando a economia americana começa a parar, o mundo também vai parando, ainda mais um país emergente como o Brasil. Mas existem cenários em que as variáveis ficam mais complicadas. Neste momento, o valor das commodities está caindo e o real tem se valorizado. Como o Brasil é visto como dependente de commodities, o país pode ser atingido pelo clima de aversão ao risco e ter alta da moeda norte-americana, o que alimentaria a inflação. A economia brasileira já está desacelerando porque os juros subiram aqui para combater a inflação. Seria muito ruim enfrentar pressões inflacionárias que venham do cenário internacional, porque os juros teriam que continuam subindo, ou demorariam mais a descer.

Nos últimos dias, economistas de dentro e fora do governo passaram a temer um problema maior na economia mundial, que seria uma crise de confiança sem porto seguro, ou, como eles dizem, sem safe haven. Esse paraíso de segurança sempre foi o dólar e os títulos do Tesouro americano, os Treasury Bonds. Mas a volatilidade desses títulos atualmente tem se elevado e o mundo não tem muita alternativa, nem na China, nem na Europa.

Um evento que pode afetar a estabilidade financeira global se dá na seguinte situação: com o fracasso do plano de Trump, a economia entra em recessão e os Estados Unidos precisam gastar mais do ponto de vista fiscal. Já está difícil rolar a dívida, porque o estoque é maior agora. A dívida cresceu na pandemia e os juros estão mais altos. Se os títulos americanos se desvalorizarem, fundos, bancos e países terão que vender parte dos papéis para reduzir a exposição, o que derruba ainda mais o preço dos ativos, criando uma espiral negativa. O mesmo pode acontecer com ações, se os detentores avaliarem que estão muito valorizadas.

Trump contratou uma desarticulação das cadeias produtivas, o terceiro choque de oferta em poucos anos. Houve a Covid, a invasão da Ucrânia e agora a guerra tarifária. Isso nos leva a um mundo que é contraintuitivo para os economistas, em que a atividade cai e a inflação sobe, porque custa mais caro produzir o mesmo que se produzia antes.

Para se ter uma ideia do estrago, basta pensar no presidente do Fed, Jerome Powell. Ele trabalhou nos últimos anos para entregar um pouso suave. “Seria um soft landing de livro-texto, em que a inflação converge para a meta sem gerar grande desemprego. O Trump conseguiu destruir esse trabalho em poucas semanas”, comenta um economista do governo.

Não é trivial o que está acontecendo. A revista The Economist escreveu, no fim de semana, que só o fato de estarem discutindo sobre a solidez dos T-Bonds já mostra o poder de destruição de Trump. As análises que apontam a possibilidade de ser bom para o Brasil, porque poderá vender mais sapatos para o mercado americano, e ainda mais soja ou carne para o mercado chinês, não levam em conta o grau de risco da economia internacional pela ação cotidiana do presidente dos Estados Unidos de produzir incerteza econômica. O pior cenário para o Brasil é a economia desacelerar como resposta à forte alta dos juros que ocorreu, mas pressões inflacionárias externas impedirem a queda da inflação. Seria difícil fazer política monetária contracíclica. Já temos problemas aqui, se a maré de fora for inflacionária, tudo fica mais complicado.

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