Um dos atletas mais lentos de sempre dos Jogos Olímpicos é um “herói internacional”

Uma história hilariante, mas também inspiradora, que marca o outro lado da maior competição desportiva do mundo

Um minuto, 52 segundos e 72 milésimos de segundo. Este foi o pior tempo já registado na modalidade de 100 metros livres, nos Jogos Olímpicos de Sydney em 2000.

Depois de ter sido alcançado, esta quarta feira, o recorde mundial nos 100 metros livres pelo nadador chinês Pan Zhanlem com o tempo de 46,40 segundos, recordamos o tempo mais lento da história na modalidade, o de Eric Moussambani.

Não era nadador, nem tão pouco alguma vez tinha nadado numa piscina olímpica com 50 metros de comprimento. Mas Eric Moussambani, da Guiné Equatorial, decidiu arriscar. Afinal de contas, sabia nadar e tinha praticado num rio local.

“Ouvi no rádio que eles (o Comité Olímpico Nacional da Guiné Equatorial) precisavam de nadadores, então fui e coloquei o meu nome”, relembrou em entrevista à CNN Sports em 2012.

Assim que chegou ao hotel de Malabo, “o único hotel que tinha piscina, uma piscina de 12 metros”, percebeu que era a única pessoa que estava lá e, depois de esperar duas horas, mais ninguém apareceu.

“Eles disseram-me para entrar e perguntaram se eu sabia nadar”. E assim foi, entrou e provou que conseguia nadar, o que foi suficiente para garantir a presença nos Jogos Olímpicos de Sydney em 2000, o primeiro país que o jovem visitou.

Treinei no rio e na praia, onde um pescador me ensinou a mexer as pernas. Não era natação profissional, era só para não me afundar”, contou.

Sem treinador e com apenas nove meses para treinar, o jovem pôs mãos à obra e, visto que não existia nenhuma piscina olímpica para treinar, acabou por fazer os treinos no hotel das cinco da manhã às seis. “Fora isso também treinei no rio e na praia, onde um pescador me ensinou a mexer as pernas. Não era natação profissional, era só para não me afundar”, disse em entrevista oficial no youtube das Olimpíadas.

“Fiquei assustado”, foi assim que descreveu na mesma entrevista o momento em que viu pela primeira vez a piscina onde ia competir. Aliás, só quando chegou a Sydney é que percebeu que ia nadar 100 metros e não 50, para o qual estava preparado, o que o preocupou. “Eu disse ao meu pessoal que ia ser muito difícil porque a piscina era demasiado grande para mim e não tinha energia para competir lá”.

O jovem, na época, de 22 anos, completou a prova em 1 minuto e 52 segundos (Getty)

Depois disso, começou a treinar com os norte-americanos e o que fazia durante esse período era olhar para eles e perceber como nadavam e como era a sua técnica. Até que começou a pedir ajuda a algumas pessoas, “uns ignoraram-me outros ajudaram-me”, disse, mas foi o treinador sul-africano que lhe ensinou como mexer os braços e pernas.

Estava na altura de competir nas qualificações e Eric estava acompanhado por Karim Bare, do Níger, e Farkhod Oripov, do Tajiquistão, quando os dois adversários decidiram precipitar-se e saltaram para a piscina olímpica antes do tempo. Eric Moussambani ficou parado no bloco de partida e não saltou, já os outros jovens foram imediatamente desqualificados.

“O juíz disse-me que eu era o único, que tinha de nadar, e isso deixou-me mais nervoso porque sabia que todos me estavam a observar”, relembrou em 2014 ao Comité Olímpico. A competir contra o relógio, o jovem tinha de conseguir completar o percurso em menos de 1 minuto e 10 segundos para ser apurado para a próxima fase. Na época o recorde mundial era 48,18 segundos.

No ponto de partida número cinco com um fato de banho azul com riscas brancas, o jovem de 22 anos ouviu o disparo inicial e mergulhou. “Fiz o primeiro mergulho na água, fiz os meus primeiros 50 metros muito bem, usei toda a minha energia para nadar os primeiros metros”.

“A minha única preocupação era completar os 100 metros”, mas a meio do percurso confessa que parecia que não estava a sair do mesmo lugar.

Adrian Moorhouse, medalhista de ouro nos 100 metros livres nas Olimpíadas de Seul em 1988, comentava a prestação de Eric em televisão britânica: “Estou convencido de que ele vai ter de se segurar à corda a qualquer momento.”

Mas a verdade é que “a multidão estava a cantar, ‘Go go go go!’ Então eu fiz o meu melhor para completar o percurso”, admitiu o jovem da Guiné Equatorial. E completou, consagrando-se, assim, como o primeiro nadador da Guiné Equatorial a completar a prova e também o mais lento de sempre na história das olimpíadas.

Mesmo assim, demonstrou uma “determinação inspiradora”, pode ler-se no título do vídeo, ao conseguir completar a prova. Por isso, começou a ser reconhecido como um “herói internacional”.

Em 2012 contou em entrevista à CNN que já fazia o tempo de 55 segundos na prova de 100 metros livres

“Enquanto algumas pessoas faziam piadas sobre mim, outras diziam que eu era um bom exemplo do espírito dos Jogos Olímpicos”, recordou à CNN, sublinhando que, na época nem falava inglês e tinha a comunicação social a querer entrevistá-lo. Por isso, os oficiais olímpicos foram forçados a fornecer-lhe um tradutor e assistente pessoal para ajudar a lidar com mais de 100 solicitações de entrevistas.

Em 2000 dizia: “Gostaria que alguém me patrocinasse e pagasse um treinador. É muito bom fazer estas entrevistas e ter toda esta publicidade, mas não valerá nada se ninguém estiver disposto a ajudar-me.”

Tal como Moorhouse disse numa entrevista posterior, este momento foi decisivo para perceber se “esse nível de desempenho deveria estar presente na competição olímpica”.

A resposta do Comité Olímpico foi negativa, visto que, a partir do caso inédito de Eric, foram reforçadas as regras para as inscrições dos países de modo a evitar que outros atletas semelhantes aparecessem.

A sua última competição foi no Campeonato Mundial no Japão em 2002. À CNN Sports, em 2012, contava que o seu último tempo tinha sido de 55 segundos. Moussambani prometeu ainda que iria promover a modalidade no seu país.

“Eu ainda tenho um sonho. Quero mostrar às pessoas que os meus tempos melhoraram, que agora temos piscinas no meu país e que agora posso nadar cem metros”, terminava assim a entrevista à CNN há 12 anos atrás.  

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