Autorizações de trabalho a estrangeiros no Brasil têm maior alta em quase uma década | Economia

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Muito se tem falado do fluxo crescente de brasileiros para países como Portugal e Estados Unidos em busca de novas oportunidades de vida. Mas o Brasil também tem atraído um grupo cada vez maior de estrangeiros, em especial, para o mercado de trabalho. Dados da Coordenação Geral de Imigração Laboral, ligada à Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça, indicam que, em 2024, houve o maior crescimento no total de autorizações de trabalho em quase uma década: 30% ante 2023 e 23% em relação a 2019, último ano antes das restrições impostas pela pandemia.

No total, 37,3 mil trabalhadores estrangeiros foram habilitados para atuar no Brasil, sendo mais de 40% deles contratados pelos setores de óleo, gás e energia, sobretudo, as renováveis. A maioria dos profissionais vem da China (7,82 mil), de Filipinas (3,26 mil), dos Estados Unidos (2,46 mil), do Reino Unido (1,92 mil) e da Índia (1,85 mil). As informações, consolidadas pela Fragomen do Brasil, empresa especializada em imigração, apontam que 84% dos vistos de trabalho se concentraram no Rio de Janeiro e em São Paulo.

“Mais da metade dos vistos de trabalho foi expedida para profissionais técnicos e para atuação como marítimo a bordo de embarcação ou plataforma de bandeira estrangeira na indústria de óleo, gás e energia”, diz Diana Quintas, sócia da Fragomen no Brasil. “Além dos novos postos de trabalho gerados pela expansão de refinarias e plataformas na Bacia de Santos, em São Paulo, e de Campos, no Rio de Janeiro, essa indústria possui alto grau de complexidade técnica e tem na transferência de tecnologia e conhecimento entre empresas a solução para suprir lacunas específicas de expertise técnica local”, acrescenta.

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Na avaliação de Diana, o intercâmbio intelectual e tecnológico tem papel essencial para o desenvolvimento da indústria petrolífera no Brasil. “Esse quadro, porém, não é exclusivo do país, uma vez que o setor movimenta a migração laboral no mundo todo, inclusive, com um alto volume de brasileiros especializados na área de energia que vão trabalhar no exterior”, assinala. Ela destaca, ainda, que o pioneirismo do Brasil na geração de energia solar, que já é a terceira maior fonte energética no país, vem atraindo a atenção de todo o mundo e, nos últimos anos, tem formado profissionais altamente qualificados e competitivos.

“A vinda de profissionais estrangeiros para o Brasil tem sido essencial para a expansão e a modernização de refinarias, embarcações e plataformas de produção e para, desenvolvimento tecnológico, como na geração de energia offshore e outras fontes alternativas”, explica Diana. Para a consultora econômica Zeina Latif, o capital humano que o Brasil tem atraído agrega conhecimento e tem impacto importante na produtividade, na inovação e no crescimento econômico. Ela lembra que o país se ressente da falta de mão de obra especializada, que acaba sendo suprida por estrangeiros mais qualificados. “Há ganhos em várias frentes quando se agrega conhecimento”, afirma.

Conhecimento é diferencial

Das vinte empresas do Brasil que mais solicitaram vistos de trabalho para estrangeiros ao Conselho Nacional de Imigração, 13 são de óleo, gás e energia; duas de corte de carne halal (para o mercado árabe); uma automobilística; uma de papel e celulose; uma de defesa e segurança; e uma de cruzeiros. “O que vemos, nessas contratações, são poucos setores econômicos recorrendo a trabalhadores estrangeiros. Essa concentração poderia ser evitada se houvesse uma política pública no Brasil mais voltada para o trabalho, não para o emprego. É muito importante que o país atraia trabalhadores estrangeiros qualificados, mas também prepare pessoas para atuar no exterior, buscando conhecimento neste mundo de inovações constantes”, diz o economista José Roberto Afonso, do Fórum de Integração Brasil Europa (FIBE) e da Escola IDP.

Para Diana Quintas, com o crescente investimento em energias renováveis, o Brasil vem se destacando na atração de trabalhadores estrangeiros. “O país busca liderar a transição energética no mundo, e isso inclui se posicionar como polo de talentos internacionais. A presença de estrangeiros qualificados, além de permitir a modernização e o desenvolvimento dessa indústria de alto grau de tecnologia, possibilita também a troca de conhecimentos e treinamento da mão de obra nacional”, frisa. José Roberto Afonso complementa: “A troca de experiências e de cultura tende a enriquecer o trabalhador brasileiro que atua ao lado de um estrangeiro e vice-versa”.

Zeina Latif chama a atenção para a grande competição no mundo por capital humano qualificado. E esse movimento tem se acentuado devido ao envelhecimento da população e do crescimento da economia digital. “O Brasil precisa capacitar melhor os trabalhadores e criar condições para retê-los no país. Isso passa, inclusive, pelo controle da violência urbana, que é um dos fatores que mais têm levado pessoas capacitadas a emigrarem. Cada vez mais se quer qualidade de vida”, ressalta ela. Ou seja, conter a fuga de cérebros vai muito além de bons salários.



Setor de energia solar tem empregado trabalhadores estrangeiros no Brasil
Rui Gaudêncio

Segundo a sócia da Fragomen, tradicionalmente, as expatriações no mundo corporativo são concebidas como oportunidades temporárias, em que os profissionais transferem conhecimentos ou capacitam a força de trabalho local. “Os vistos de trabalho, por sua vez, costumam ter prazos que variam de acordo com cada situação. Assim, a imigração laboral é, geralmente, considerada temporária, podendo durar alguns meses, como no caso de trabalhadores em plataformas de petróleo e tripulantes de cruzeiros, ou alguns anos, como é comum entre executivos”, detalha.

Para a contratação de profissionais do exterior, a empresa no Brasil precisa estar de acordo com a legislação nacional, que exige um número mínimo de brasileiros para cada estrangeiro, tornando necessário os investimentos na mão de obra local. Quando um profissional estrangeiro decide se estabelecer permanentemente no Brasil, ele precisa requisitar um visto de longa duração, que, geralmente, não se enquadra nas categorias de imigração laboral.

“O aumento no volume de autorizações de trabalho para estrangeiros no Brasil evidencia um movimento consolidado e promissor de internacionalização do mercado, posicionando o país como um importante polo de oportunidades para profissionais qualificados e investidores globais”, assinala Diana.

Peso da imigração

Os especialistas lembram que, durante o século 20, a imigração foi um importante vetor econômico para o Brasil e tem sido fundamental nos dias de hoje para o avanço de Portugal. “Quando pensamos na história brasileira do século 20, observamos as grandes imigrações impulsionando a economia local, principalmente, no campo, com a chegada de italianos e japoneses, por exemplo”, lembra a sócia da Fragomen.

No entender dela, atualmente, a busca por mão de obra continua, mas de uma forma diferente da imigração em massa. “Os processos são individuais e mais descentralizados, temos gente do mundo todo vindo para o Brasil preencher postos de trabalho e temos ainda mais brasileiros em muitos países do mundo”, afirma.

Zeina Latif destaca que, na maior parte das vezes, trabalhadores qualificados migram para outros países por vontade própria, atrás de oportunidades profissionais melhores. “Não estão fugindo da guerra ou da forme, estamos falando de movimentos voluntários. Por isso, é importante oferecer boas condições para atrair talentos”, frisa. Na opinião de José Roberto Afonso, os imigrantes, em qualquer país que estejam, são forças importantes de trabalho e peças vitais para as economias, ao contrário do que diz o discurso da extrema-direita, que tenta colar nos trabalhadores estrangeiros a pecha de intrusos.

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