- Acordo fechado: Itaipu se compromete a comprar 3 mil hectares de terras para indígenas por R$ 240 milhões
- Energia perdida: desmatamento tira R$ 1 bilhão por ano em geração energética de Itaipu e Belo Monte
Analistas destacam que as declarações ocorrem num momento sensível, em que Brasil e Paraguai estão negociando os termos do acordo de Itaipu. Eles lembram ainda que a energia da hidrelétrica é cara e que alimentar data centers demandaria a construção de linhas de transmissão no país vizinho.
— Se alguém for esperto, vai até o Paraguai e instala uma fábrica de IA lá — afirmou Rubio em audiência da Comissão de Relações Exteriores no Senado dos EUA na terça-feira.
- Veja como vai funcionar: Governo prepara 1º leilão de baterias de energia
Brasil e Paraguai tinham um acordo para que a energia excedente de Itaipu correspondente à parcela paraguaia fosse vendida ao mercado brasileiro. Esse acordo vigorou por 50 anos, mas expirou em 2023, e os dois países negociam o que fazer com esse excedente.
De um lado, disse Rubio, há nações que podem “entregar energia de forma eficiente e em volume suficiente”. Para esses países, o secretário de Estado considera que há uma grande oportunidade para “serem líderes no campo da IA.” Isso, porém, vai pressionar aqueles que precisam de recursos energéticos, afirmou.
— Então temos que ter conversas não apenas sobre qual é o nosso papel (dos EUA) nessa questão, como também como investir e fazer parcerias com países que têm suprimento de energia — acrescentou Rubio.
- Energia: Bônus de Itaipu é suficiente para cobrir déficit de US$ 121 milhões e reduzir conta de luz, diz Aneel
Em seguida, ele cita o caso paraguaio como exemplo:
— O Paraguai tem um acordo de longo prazo com o Brasil pelo qual ele vende 50% da energia produzida. Esse contrato expirou e estão tentando ver o que fazem com esses 50% que não vão mais para o Brasil. Você não consegue colocar essa energia em tanques e enviar para outros países — disse Rubio.
A geração de energia da usina de Itaipu, que fica na fronteira entre Brasil e Paraguai, é dividida: 50% para cada país. Historicamente, porém, o Paraguai usa menos que esse percentual e vende a sobra para o Brasil. Dos 50% do Paraguai, o Brasil compra 35%.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2025/x/m/Av12FBTvaTPdtppVhKwA/111131268-foz-do-iguacu-pr-02-01-2025-vista-das-comportas-da-hidreletrica-de-itaipu-binacional-a-h.jpg)
Integrantes do governo brasileiro ressaltam que o eventual fim da venda do excedente de energia do Paraguai para o Brasil só preocupa se for feito de forma repentina, mas dizem que o Brasil tem energia e projetos suficientes para suprir a demanda.
Em termos de preço, técnicos do setor afirmam que o custo de Itaipu hoje chega a estar um pouco acima do mercado livre (no qual há concorrência de preços), de maneira que não faria uma diferença grande nas tarifas brasileiras.
- Margem Equatorial: Petrobras prevê chegada de sonda à Foz do Amazonas até o fim de junho
Para especialistas ouvidos pelo GLOBO, a sugestão de Rubio é interessante, mas há desafios. Segundo Edvaldo Santana, ex-diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o excedente de energia que cabe ao Paraguai pode ser usado para abastecer data centers que venham a ser instalados no país vizinho, mas, ainda assim, seria necessário firmar um novo acordo com o Brasil.
— Nem Brasil nem Paraguai podem usar a energia do jeito que quiserem. A usina é e continua sendo binacional. Por isso, é preciso firmar um novo acordo. Trata-se de refazer o tratado, o que pode prever novas utilizações para toda a energia do Paraguai — afirmou Santana.
Ele ressalta ainda que, do ponto de vista comercial, a energia de Itaipu não é barata. Mesmo excluindo os impostos cobrados pelo governo, Itaipu custa mais de R$ 180 o megawatt-hora (MWh), calcula. Para Santana, já é uma das mais caras entre as hidrelétricas. Segundo fontes, alguns projetos de data center em andamento estão negociando a compra da energia por menos de R$ 100/MWh.
- Jony Ive: OpenAI se une a ex-designer da Apple em acordo de US$ 6,5 bi para criar dispositivos de IA
— Vários data centers que já vieram e estão vindo para o Brasil compram energia de fontes renováveis, com preços em dólar bem menores que o de Itaipu.
Jerson Kelman, ex-diretor-geral da Aneel, observa que o custo da energia de Itaipu poderia ser um dos mais baratos do mundo, mas não é, pois o Brasil arca com ações socioambientais dos dois lados da fronteira, da ordem de US$ 1,5 bilhão por ano.
Santana levanta outro ponto: se o investimento em infraestrutura valerá a pena.
— Outro ponto é que o Paraguai vai precisar construir linhas de transmissão e oferecer subsídios, assim como faz o Brasil. Mas a questão é: será que vale a pena investir e construir linhas do lado paraguaio para uma energia que não é barata? Se o Paraguai quiser concorrer, precisa se tornar mais atrativo. A ideia de Rubio é boa e vai fazer o Brasil se movimentar — afirmou o ex-diretor da Aneel.
Clarice Ferraz, pesquisadora associada do Grupo de Economia da Energia do Instituto de Economia da UFRJ, diz que o debate vai além do preço da geração de energia. Segundo ela, o ponto central é que o mundo todo quer ter acesso a fontes com energia em quantidade e fornecimento garantido:
— Essa é a questão, independentemente do preço. E, nesse caso, a diplomacia do Brasil pode estar perdendo uma oportunidade de garantir a soberania energética do Mercosul.
Clarice observa que o custo da geração de Itaipu é elevado porque há um modelo de gestão complexo, com estrutura inchada, muitos benefícios e encargos.
Até 2023, o Paraguai só podia vender a energia para o mercado regulado, ou seja, para as distribuidoras.
No ano passado, Brasília e Assunção assinaram um pré-acordo que autorizava o Paraguai a vender essa energia diretamente para indústrias brasileiras a partir de 2027, por meio do mercado livre, o que em tese diminui os custos do sistema.
O acordo também previa negociações sobre o chamado Anexo C, que rege as bases financeiras da usina.
As negociações, no entanto, foram suspensas após suspeitas de que o Brasil havia iniciado uma ação de espionagem contra autoridades paraguaias que lidavam com as negociações.
*Com agências internacionais
Crédito: Link de origem