Os Estados Unidos estão avaliando o possível envio de tropas latino-americanas de manutenção da paz ao Haiti, onde uma força internacional liderada pelo Quênia não conseguiu conter a tomada de áreas-chave do país por gangues criminosas, segundo três pessoas com conhecimento do assunto.
Washington sugeriu que essa força atuaria sob a liderança da Organização dos Estados Americanos (OEA), como forma de contornar os vetos históricos da Rússia e da China ao envio das forças de paz da ONU, conhecidos como Capacetes Azuis, o que representaria uma mudança significativa na missão central da OEA.
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Uma força da OEA seria a mais recente tentativa de combater as gangues que controlam a maior parte da capital haitiana, Porto Príncipe, e ameaçam tomar os últimos bairros que ainda estão sob controle do governo.
Uma força internacional financiada pelos EUA e liderada por policiais quenianos – a Missão Multinacional de Apoio à Segurança (MSS, na sigla em inglês) – chegou ao Haiti em junho do ano passado, mas tem se mostrado insuficiente diante das gangues fortemente armadas e bem organizadas que assolam a nação mais pobre das Américas.
Se Rússia e China vetarem novamente uma missão da ONU, o governo Trump tentará utilizar a OEA, um fórum de cooperação política e promoção da democracia e dos direitos humanos, para organizar uma missão de paz.
“O governo Trump é cético quanto ao valor da OEA, por isso está pressionando a organização a montar uma missão de paz para o Haiti que possa substituir a MSS”, disse um assessor latino-americano em Washington.
“O plano é que os membros da OEA na América Latina e no Caribe forneçam os soldados, enquanto os EUA ficariam responsáveis pelo financiamento. Isso é visto como uma forma de a OEA provar seu valor.”
No entanto, um diplomata latino-americano em Washington observou que a organização não tem mandato nem orçamento para conduzir operações de manutenção da paz.
“A OEA precisa ser parte da solução no Haiti, não parte do problema”, disse ele. “E os EUA precisam assumir o custo político de resolver a situação haitiana, assim como fizeram ao enviar uma missão de paz em 2004.”
Durante o governo Biden, Washington buscou apoio de parceiros regionais para liderar a MSS, mas nenhum país se ofereceu.
Em vez disso, o Quênia aceitou liderar a operação em troca de generosos pagamentos dos EUA, eventualmente enviando 797 policiais, enquanto El Salvador, Guatemala, Jamaica e Belize contribuíram com equipes civis.
Um diplomata ocidental afirmou que Washington pode buscar parceiros com capacidade militar e experiência para integrar qualquer nova missão. Isso pode incluir o Brasil, que liderou uma missão de paz da ONU no país entre 2004 e 2017, e a Colômbia, cujas forças armadas têm décadas de experiência no combate a guerrilhas.
O almirante Alvin Holsey, chefe do Comando Sul dos EUA, responsável pelas operações militares americanas na América Central, América do Sul e Caribe, se reuniu com o ministro da Defesa da Colômbia, Pedro Sánchez, neste mês. O ministério da Defesa colombiano disse que os EUA “manifestaram interesse em avançar com a Colômbia em uma estratégia multinacional de apoio ao Haiti”.
Um funcionário do governo da Argentina, aliado próximo do governo Trump, afirmou que as discussões são “completamente informais e teóricas”, mas que o país estaria disposto a enviar tropas para uma eventual força liderada pela OEA, caso esta fosse “bem preparada e sofisticada”. Ele acrescentou que também estão em andamento discussões sobre uma missão liderada pela ONU.
Questionado sobre uma missão da OEA, um porta-voz do Departamento de Estado dos EUA afirmou: “Os EUA não estão discutindo o envio de tropas americanas ao Haiti. Continuamos a apoiar a MSS liderada pelo Quênia.”
Um funcionário do governo Trump disse: “Os Estados Unidos estão preocupados com a situação no Haiti e continuarão explorando múltiplas opções com parceiros para tirar o país do caos.”
O Pentágono não respondeu imediatamente a um pedido de entrevista.
Enquanto isso, um funcionário haitiano questionou se os EUA teriam autoridade suficiente para mobilizar outros países, considerando as tensões entre o governo Trump e o restante do mundo.
“Não está claro para mim que os EUA possam simplesmente pegar o telefone, ligar para os países e dizer: ‘Olha, preciso que vocês façam um favor no Haiti’, e que os países atenderiam ao pedido”, disse ele.
A crise de segurança no Haiti se agravou após o assassinato do presidente Jovenel Moïse em 2021.
Com o fim dos mandatos dos políticos eleitos, as gangues ocuparam o vácuo de poder. Atualmente, controlam mais de 85% de Porto Príncipe, segundo a ONU, e mais de 1 milhão de pessoas estão deslocadas em todo o país.
No dia 2 de maio, os EUA designaram a Viv Ansanm — maior coalizão de gangues da capital — e a Gran Grif — maior gangue da região agrícola do Haiti — como “organizações terroristas estrangeiras”.
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