China ganha espaço no Peru com infraestruturas críticas

A crescente influência da China sobre a infraestrutura crítica do Peru e sua posição estratégica levanta preocupações sobre as implicações de longo prazo para o desenvolvimento econômico, político e social do país andino. A China, alertam os especialistas, já controla setores-chave, como o fornecimento de energia, a mineração e o porto de Chancay.

“Os investimentos e projetos chineses no exterior, como no Peru, são usados como uma alavanca e ferramenta de controle na política externa da China, para fortalecer sua posição global e garantir recursos essenciais para seu desenvolvimento”, disse à Diálogo, em 10 de março, Euclides Tapia, professor de Relações Internacionais da Universidade do Panamá.

Um relatório do jornal The Financial Times destaca a falta de foco do governo peruano para avaliar os benefícios e riscos de uma maior dependência da China em setores-chave para o desenvolvimento nacional. Essa falta de análise poderia deixar o Peru exposto a vulnerabilidades geopolíticas e econômicas de longo prazo.

A confirmação da visita do presidente chinês Xi Jinping a Lima, para a inauguração do Terminal Portuário Multipropósito de Chancay, durante a Cúpula do Fórum de Cooperação Econômica Ásia-Pacífico, em novembro de 2024, destaca o interesse de Pequim nos recursos estratégicos do Peru, informou o jornal El Peruano.

Futuro do porto

O futuro porto de Chancay, localizado perto de uma das maiores reservas de lítio do Peru, ilustra a aliança entre a China e o Peru, destacou El Peruano. Com um investimento de mais de US$ 3,5 bilhões, o porto de águas profundas é financiado pela China, informa Diálogo Chino, uma plataforma de jornalismo investigativo.

Em 2019, a estatal chinesa COSCO Shipping adquiriu 60 por cento do projeto de Chancay. Em 2021, assinou acordos com China Harbour Engineering Company e China Communications Construction Company, para sua construção, detalha. Essa iniciativa faz parte do Cinturão e Rota promovido pela China.

No entanto, o projeto enfrenta uma série de obstáculos e fortes críticas, devido, entre outras coisas, ao colapso parcial de terra em umas das obras dos túneis, que provocou o desabamento de várias casas na comunidade próxima. Além disso, foram identificadas 50 omissões e inconsistências no documento do Estudo de Impacto Ambiental, com acusações de manipulação de informações, de acordo com a plataforma argentina Infobae.

O porto de Chancay não apenas amplia a influência de COSCO no setor portuário – COSCO tem investimentos em mais de 100 portos em todo o mundo –, mas também poderia servir como uma instalação de uso duplo em águas peruanas para a Marinha chinesa, informou a revista Newsweek. Os especialistas apontam Sri Lanka, que, incapaz de pagar sua dívida, deu à China um participação de controle e um arrendamento de 99 anos do porto de Hambantota, como um exemplo da armadilha da dívida e do risco de erosão da soberania.

“Cada infraestrutura construída pelo regime chinês no exterior tem um propósito duplo, conforme estabelecido em seu mandato constitucional”, disse Tapia. “De acordo com sua Constituição, cada porto chinês construído fora de suas fronteiras deve ser destinado ao uso pela Marinha da China.”

Essa política implica que essas instalações podem ser adaptadas para “fins militares”, o que representa um nível de “alto risco” para a região. “A dualidade de propósito dessas construções aumenta a preocupação sobre a estabilidade e a segurança na área, criando um cenário altamente perigoso”, acrescentou Tapia.

Mercado de eletricidade

O crescente controle da China sobre o setor elétrico do Peru também gera preocupações.

Em 2020, China Three Gorges Corporation adquiriu Luz del Sur, que fornece energia à metade de Lima. No início de fevereiro de 2024, China Southern Power Grid International recebeu sinal verde para comprar Enel, a principal empresa de geração de energia elétrica do Peru, o que, segundo a Sociedade Nacional de Indústrias (SNI), daria 100 por cento do mercado de distribuição de energia da capital à China, informou o jornal peruano Gestión.

Por outro lado, Pequim está tentando adquirir fornecedores locais para controlar a cadeia de valor da energia solar na América Latina, o que levanta significativas preocupações, como no caso peruano. Se a China capturar toda a cadeia de valor da energia solar, a região poderia perder os benefícios de uma transição para uma economia mais verde, adverte o think tank Atlantic Council.

Além disso, há preocupações de que a China use seu domínio nos mercados de eletricidade, para obter concessões geopolíticas no Peru e na região, afirma Atlantic Council. “Lima não considerou o impacto de longo prazo que esse domínio terá, nem refletiu sobre como isso compromete a soberania do país”, disse Tapia.

Metais industriais e tecnológicos

A China priorizou sua segurança na cadeia de suprimentos de metais industriais e tecnológicos, como parte de sua estratégia econômica. Minerais essenciais, como o cobre e o lítio, desempenham um papel fundamental em tecnologias de energia, como veículos elétricos e painéis solares. O Peru tem vastas reservas de cobre essenciais para essas tecnologias, indica Atlantic Council.

Das 47 iniciativas de mineração, sete estão sob o controle de empresas chinesas, representando quase 20 por cento do investimento projetado. Destaca-se a expansão, programada para ser concluída em 2024, da Unidade de Mineração Toromocho, uma das principais reservas de cobre do Peru e do mundo, destaca a revista peruana de hidrocarbonetos El Gas.

A República Popular da China é conhecida por sua capacidade de burlar as restrições que afetam muitos investidores ocidentais, como preocupações ambientais e trabalhistas, informa Infobae.

Cerca de 35 por cento dos projetos chineses em todo o mundo enfrentam problemas ambientais, trabalhistas e de corrupção. “As corporações chinesas na América Latina estão envolvidas em casos de suborno, beneficiando autoridades locais, em troca de contratos e acessos”, ressalta Infobae.

Repercussões

Além disso, as empresas chinesas destacaram redes móveis 5G e estações de vigilância espacial em território latino-americano. “A China busca exercer controle sobre os países da região, por meio de laços econômicos estreitos, para influenciar a política externa dos países e depois subjugá-los”, declarou Tapia.

“Se o Peru está sendo influenciado dessa forma, é provável que isso se reflita em suas ações em nível internacional. Se não forem tomadas medidas preventivas, a América Latina poderá seguir o caminho da África, enfrentando as repercussões negativas da crescente influência chinesa”, concluiu Tapia.

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