Há precisamente 49 anos, Cabo Verde, um pequeno arquipélago da costa ocidental africana, proclamou-se como nação independente, depois de mais de 500 anos sob o jugo colonialista. Uma conquista fruto do movimento liderado por Amílcar Cabral e os seus seguidores que idealizavam um país livre, capaz de conduzir o próprio destino.
Hoje, Cabo Verde continua dependente de outros Estados e sem capacidade de se auto-sustentar. É a percepção de alguns cabo-verdianos, que consideram que o país ainda carece de investimentos em áreas cruciais para o desenvolvimento.
O coronel reformado Júlio Monteiro – que foi o escolhido para hastear a bandeira no dia 5 de julho de 1975, quando tinha 24 anos – disse em entrevista exclusiva à DW que tem a percepção que os ideais de Amílcar Cabral morreram com ele.
“Cabral dizia que independência não significa içar a bandeira. A independência é o bem estar do povo cabo-verdiano. Aí é que se faz a pergunta: como é que estamos neste momento?”, destaca.
“A avaliação começa na juventude que está a sair em massa para o estrangeiro a procura de viver melhor, a juventude está a sair de tal forma que as entidades não dão conta. Fala-se muito no turismo por exemplo, mas temos estado a criar políticas que beneficiam somente o turista e não o cabo-verdiano. Fala se tanto na mobilização da água para agricultura, mas não estamos a ver. Tudo que consumimos praticamente vem do estrangeiro”, critica Júlio Monteiro.
Vários desafios persistem
A população enfrenta secas severas, emigração forçada, insegurança alimentar, precariedade na ligação inter-ilhas, baixos níveis salariais. O que leva o jurista e porta-voz do Partido Africano Para Independência de Cabo Verde(PAICV), Paulo Varela, a questionar a qualidade da tão falada boa governança.
“O grande desafio é chegarmos à capacidade de produzir alimentos suficientes para alimentar a nossa população para não dependermos do exterior, porque neste momento entre 80 a 90% dos produtos consumidos são importados e precisamos assegurar essa autossuficiência”, argumenta.
“As duas fomes de 1920 e de 1947 foram na sequência das duas guerras mundiais, e se nesse momento houver uma terceira guerra mundial vamos ter uma terceira fome em Cabo Verde. Nós temos peixes, temos solos férteis, é preciso criarmos a nossa própria frota marítima, criar condições de produzir em massa, para se dar resposta a segunda fase da independência”, conclui Varela.
A saúde, educação, agricultura, infraestruração e emprego jovem são alguns dos setores que tem recebido pouca atenção dos sucessivos governos, relatam cidadaos como o professor e ativista ambiental Nelson Santos, que apesar de considerar que Cabo Verde de hoje é diferente de outrora, elenca vários desafios.
“Estes 49 anos de independência significam 49 anos de grandes conquistas a nível de desenvolvimento económico e social, mas acima de tudo é um momento de reflexão para enfrentarmos os desafios que ainda existem. Falo da tolerância democrática, transportes inter-ilhas, questões relacionadas à proteção do meio ambiente, justiça, segurança, assuntos relacionados com a agricultura mais sustentável”, exemplifica.
“A democracia não é só disputa”
Mediante os questionamentos da população, o Presidente José Maria Neves considera que Cabo Verde tem feito um bom percurso, mas desafia os principais atores políticos a um maior empenho na consolidação da democracia.
“Tenho discutido com os principais partidos políticos essa questão, eu acho que é o salto que precisamos dar para qualificarmos a democracia. A democracia não é só disputa, a democracia também é entendimento, é consenso, para podermos encontrar as melhores soluções para o país”, defende o chefe de Estado.
“Temos de elevar o nível do debate político com argumentos, discutindo as questões que dizem respeito às pessoas, temos a questão dos transportes, a questão da pobreza, a questão das desigualdades, a questão do desemprego, e precisamos discutir essas questões e encontrar os consensos e nos momentos decisivos também ter o entendimento e os acordos, para que todas as instituições funcionem de forma adequada”, conclui José Maria Neves.
Nos 49 anos da independência de Cabo Verde, a população desafia os dirigentes a pensarem mais no bem comum e num país de todos cabo-verdianos, como sonhou Amílcar Cabral.
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