Brasileira conta como é subir um vulcão ativo no Caribe

Na Martinica, o brasileiro nem precisa se esforçar para se sentir em casa, em pleno Caribe.

Entre Santa Lúcia e Dominica, a ilha tem praias de areias finas, mar de águas com alta visibilidade e trilhas em florestas densas. Sem falar no arroz com feijão, no pé de moleque (´nougat pays´, em francês), na capoeira local (‘danmyé’ ou ‘ladja’) e nos sotaques trazidos da África.

Esse destino ultramarino francês fica logo ali (inclusive com voos saindo do Brasil), mas vai ser diferente de tudo que você já ouviu falar sobre terras caribenhas. Afinal de contas, não é em qualquer ilha da região que dá para subir até a caldeira de um vulcão ativo.


Monte Pelée

Foto: Comité Martiniquais du Tourisme / Viagem em Pauta

A brasileira Luísa Zanini Vargas, gaúcha de Pelotas que mora na Martinica há pouco mais de quatro anos, é uma das que já encarou o desafio. Uma, não. Três vezes.

“É buscar uma energia e uma paisagem diferentes que a gente não está acostumado porque não tem [vulcão] no Brasil. Eu gosto muito de descobrir novos caminhos para me impregnar daquele lugar”, descreve Luísa, em depoimento para o Viagem em Pauta.

A Trilha

A 1.397 metros sobre o nível do mar, no ponto mais alto da Martinica e um dos mais elevados do Caribe, o Monte Pelée é um vulcão ativo no Parc Naturel Régional de la Martinique que, desde o ano passado, é Patrimônio Mundial da UNESCO.

De onde você estiver, essa montanha no norte da ilha sempre vai dar um jeito de mostrar sua imponência, ainda que seu pico esteja (quase sempre) nublado.

Mas para ver de perto a caldeira desse vulcão, você vai ter que suar.

“É e não é [uma trilha] para qualquer pessoa. A primeira vez, fui sem preparo nenhum para uma caminhada dessa proporção e fiquei vários dias com dor no corpo. Mas a impossibilidade é sempre na cabeça”, avisa Luísa, que já tem no currículo aventureiro mais de 35 trilhas diferentes na ilha.

Luísa na subida do Monte Pelée

Foto: Arquivo Pessoal / Viagem em Pauta

Como não poderia ser diferente, em terras selvagens do norte da Martinica, o caminho, embora demarcado, é cheio de desníveis e tem terreno escorregadio de rochas que precisam ser, literalmente, escaladas (mas fica tranquilo que não é preciso ser nenhum profissional, muito menos usar equipamento especial).

E, a cada etapa vencida daquele sobe e desce exigente, um novo mundo se abre sob os pés, numa sequência de microclimas que se desenvolvem naquele terreno de cinzas endurecidas.

Todos os caminhos levam ao vulcão

Atualmente, existem três trilhas oficiais que levam até a caldeira do Monte Pelée e, apesar do acompanhamento de guia não ser obrigatório, a contratação desse tipo de serviço é altamente recomendado.

A mais popular delas é Aileron, uma caminhada de 7,5 quilômetros de extensão que costuma ser feita em cerca de 5h30 (ida e volta) até a borda da caldeira. De dificuldade menor, a trilha começa com uma subida íngreme, a partir do estacionamento, e passa por dois refúgios e pelo pico Le Chinois.

Já a Grande Savane começa em Le Prêcheur, no lado caribenho da ilha, e leva cerca de 4h, sem contar a extensão até a caldeira (1h mais de pernada).

Monte Pelée

Foto: Arquivo Pessoal / Viagem em Pauta

“Essa é a mais fácil porque a gente já começa a trilha bem do alto e não cansa nesse primeira etapa [da subida]”, avalia Luísa que, em uma das três vezes que esteve no vulcão, foi para ver o nascer do sol, uma experiência que exige começar a caminhar às três da manhã.

“Lá é bem isolado e o céu é a coisa mais linda de ver”, garante Luísa, para quem o destaque é a experiência de ver “uma erupção solar no horizonte, acima das nuvens”.

Os mais aventureiros contam com uma terceira via, cujo início é na comuna Grand’Rivière. O destino final é o mesmo, com a diferença que por ali são 17 quilômetros de caminhada até o segundo refúgio, uma trilha exigente que costuma durar cerca de 8h, entre ida e volta.

É tanta disposição para caminhar na Martinica que, anualmente, entre junho e julho, a ilha abriga o Festival International de Randonnée, um programa de trilhas guiadas com dificuldade entre fácil e moderada, em roteiros costeiros ou por dentro de florestas.

Trilha no Monte Pelée

Foto: Arquivo Pessoal / Viagem em Pauta

Quando ir

A trilha íngreme passa por precipícios (“qualquer passo em falso pode ser perigoso”), tem cruzamento de pequenas escadas de madeira e não deve ser feita em qualquer época do ano.

Para evitar as temporadas de chuvas, de novembro ao início de fevereiro, e de ciclones, entre junho e novembro, o mais recomendado é ir na estação seca, que costuma ser entre a metade de fevereiro e o início de junho.

É sol e chuva, calor e frio, céu claro ou nublado. Tudo isso numa mesma trilha. Mas, depois de cruzar aquelas densas florestas interiores, sua ideia sobre vulcões nunca mais vai ser a mesma.

Luísa no Monte Pelée

Foto: Arquivo Pessoal / Viagem em Pauta

Só não esquece de ir bem preparado, com tênis antiderrapante, proteção para a cabeça, como chapéu ou boné, bastão de trilha e roupa impermeável e em camadas que possam ser retiradas conforme as mudanças de temperatura.

Luísa recomenda também, pelo menos, dois litros de água por pessoa e lanche de trilha, como frutas secas, barra de cereal, sanduíche e frutas.

De resto, pode deixar que o Monte Pelée providencia.


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Vulcão mortal

A Martinica é um dos picos de uma extensa área com 18 vulcões, nas Pequenas Antilhas, no Caribe. A ilha é linda, mas quase não sobrou ninguém para contar a história.

Em uma manhã de 1902, o vulcão ativo Monte Pelée entrou em erupção e, em questões de minutos, matou cerca de 30 mil pessoas na comuna de Saint-Pierre, petrificando tudo o que ficou sob as camadas de cinza.

Segundo relatos, as nuvens provenientes das erupção se moveram a uma velocidade de quase 700 km/h e a temperatura interna era de mais de 1.000 °C.

No entanto, semanas antes, o vulcão já dava sinais do que veria pela frente.

Domínio Público

Foto: Viagem em Pauta

No final de abril, colunas escuras de vapor começaram a se formar, seguidas de chuvas de cinzas, em Prêcheur, e leves terremotos. Os dias seguintes foram marcados também por maremoto, subida das águas dos rios Pères e Roxelane, e chuvas torrenciais.

Na época, Saint-Pierre era não só a capital da Martinica, mas também o principal destino comercial e cultural da ilha, uma espécie de “Paris caribenha”. Desde a erupção mortal do dia 8 de maio de 1902, Fort-de-France se tornaria a capital do destino.

“A partir desse dia, Saint-Pierre desapareceu com essa erupção do tipo peleana”, descreve Jacqueline Marie-Rose, do Martinique Tourism Authority, órgão responsável pela promoção turística da Martinica.

Essa erupção, cujo nome é inspirado no Monte Pelée, é conhecida pela grande quantidade de explosões de fragmentos, como rochas quentes, cinzas e poeiras, formando assim o que se conhece hoje como “nuvem ardente”.

“Isso nos permite compreender que não foi [uma erupção] de lavas, mas de gases”, completa Jacqueline.

VEJA VÍDEO

Um dos casos de sobrevivência mais famosos, na catástrofe de 1902, é o de Cyparis, provavelmente, um dos três únicos que conseguiram escapar com vida da fúria do vulcão.

O milagre teria acontecido porque esse prisioneiro foi encontrado vivo, três dias depois da erupção, protegido pelas grossas paredes de sua cela. Apesar das graves queimaduras, Cyparis chegaria a ser exibido no Barnum, o maior circo dos EUA, como “O homem que sobreviveu ao Juízo Final”.

Foto: Eduardo Vessoni / Viagem em Pauta

Para conhecer melhor essas histórias, a dica é o pequeno e cenográfico Mémorial de la Catastrophe de 1902, espaço criado pelo vulcanólogo estadunidense Frank A. Perret, em 1933, para relembrar um dos piores desastres vulcânicos do século passado.

As salas desse museu, em Saint-Pierre, expõem mais de 430 peças retiradas da catástrofe, como o impressionante sino de bronze, de 1865, deformado pelo calor da erupção, e o aglomerado de objetos como jarras e potes, em meio a lavas vulcânicas.

A propósito, pode ficar tranquilo, pois a última erupção do Pelée foi entre 1929 e 1932 e, atualmente, as atividades vulcânicas na montanha são monitoradas com frequência.

SAIBA MAIS

Mémorial de la Catastrophe de 1902

Diariamente, das 9h às 18h

Rue Victor-Hugo, 169 (Saint-Pierre, Martinica)

Ingressos: 8 € (adulto); 6 € (crianças de 7 a 17 anos); e grátis (abaixo de 7 anos)

Como chegar na Martinica

Desde maio do ano passado, a Air France opera a rota entre Belém, no Pará, e Caiena, capital da Guiana Francesa. Dali, a mesma aeronave segue para Fort-de-France, porta de entrada da Martinica, no Caribe francês.

O voo AF603 (1h25 de duração) parte de Belém, aos sábados, às 9:50, e chega em Caiena, na Guiana Francesa, às 11:45. Após o desembarque para trâmites de imigração na Guiana Francesa (ou na Martinica, no roteiro de volta ao Brasil), o passageiro segue às 12:35 para Fort-de-France, na Martinica, na mesma aeronave, no AF601, cuja viagem dura outras 2h10.

A320 da Air France

Foto: Divulgação / Viagem em Pauta

Na volta, o voo AF600 decola da capital martinicana, às sextas-feiras, às 12:35, e tem pouso na Guiana Francesa programado para às 15:45. A última perna da viagem é no AF602, no mesmo dia, às 17:15, e com pouso em Belém, às 18:50.

Ambos trechos são realizados com o Airbus A320, com 170 assentos e Wi-Fi a bordo.

 

* O jornalista Eduardo Vessoni viajou com o apoio do Comité Martiniquais du Tourism, Air France e Atout France


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