Encontro em São Vicente e Granadinas será realizado após venezuelanos decidirem em referendo pela anexação de 74% do território guianês
Os presidentes da Venezuela, Nicolás Maduro, e da Guiana, Irfaan Ali, se reúnem nesta 5ª feira (14.dez.2023), em São Vicente e Granadinas, no Caribe, para discutir a tensão que envolve a região de Essequibo. O Brasil enviou o assessor da Presidência para Assuntos Internacionais, Celso Amorim, para atuar como um dos mediadores da conversa.
O encontro será realizado depois que os venezuelanos decidiram em referendo, realizado em 3 de dezembro, pela anexação de 74% do território guianês. Segundo o governo de Maduro, mais de 95% votaram pela criação do Estado de Essequibo.
O governo da Guiana classificou a medida como “provocativa, ilegal, nula e sem efeito jurídico internacional”. Também acusou o líder venezuelano de crime internacional ao tentar enfraquecer a integridade territorial do Estado soberano da Guiana. Eis a íntegra do comunicado (PDF – 19 kB).
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ENTENDA
A disputa entre os países, que dura mais de 1 século, está relacionada à região de Essequibo (ou Guiana Essequiba), que tem 160 mil km² e é administrada pela Guiana. A área representa 74% do território do país vizinho, é rica em petróleo e minerais, e tem saída para o Oceano Atlântico.
O referendo apresentou 5 perguntas, nas quais os venezuelanos escolheram entre as respostas “sim” e “não”. Trata-se de questionamentos sobre o Laudo de Paris de 1899 –medida resultante de um tratado assinado em Washington em 1897, que determinou a área como pertencente à Guiana, que era uma colônia britânica na época, e delimitou uma linha divisória do território.
As perguntas também abordam o Acordo de Genebra de 1966 –no qual o Reino Unido reconheceu a reivindicação venezuelana de Essequibo e classificou a situação como negociável.
Uma delas questiona ainda a competência da Corte Internacional de Justiça para julgar o caso. O órgão judiciário da ONU (Organização das Nações Unidas) em Haia, na Holanda, decidiu em 1º de dezembro que a Venezuela não pode tomar medidas para anexar o território. Eis a íntegra da sentença (PDF – 227 kB).
Leia as perguntas do referendo:
- “Você concorda em rejeitar, por todos os meios, conforme a lei, a linha imposta de forma fraudulenta pela sentença arbitral de Paris de 1899, que visa nos privar de nossa Guiana Essequiba?”
- “Você apoia o Acordo de Genebra de 1966 como o único instrumento jurídico válido para alcançar uma solução prática e satisfatória para a Venezuela e a Guiana em relação à controvérsia sobre o território da Guiana Essequiba?
- “Você concorda com a posição histórica da Venezuela de não reconhecer a jurisdição da Corte Internacional de Justiça para resolver a controvérsia territorial sobre a Guiana Essequiba?
- “Você concorda em se opor, por todos os meios, conforme a lei, à reivindicação da Guiana de dispor unilateralmente de um mar pendente de delimitação, ilegal e em violação do direito internacional?
- “Você concorda com a criação do Estado Guiana Essequiba e com o desenvolvimento de um plano acelerado de atenção integral à população atual e futura desse território, que inclua, entre outros, a concessão de cidadania e carteira de identidade venezuelana, conforme o Acordo de Genebra e o Direito Internacional, incorporando consequentemente esse Estado no mapa do território venezuelano?”
Conforme o Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela, pouco mais da metade dos eleitores aptos a votar compareceram às urnas.
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BRASIL
Em 30 de novembro, o Ministério da Defesa do Brasil informou que aumentou a presença militar na região de fronteira no norte do país, próximo a Venezuela e Guiana. O reforço atendeu um pedido do senador Hiran Gonçalves (PP-RR), que solicitou mais tropas em Pacaraima (RR), cidade na fronteira com Essequibo.
Além disso, a secretária de América Latina e Caribe do Itamaraty, Gisela Maria Figueiredo Padovan, disse que o Brasil acompanha a questão com “atenção” e mantém conversas de alto nível com ambos os países em “busca de uma solução negociada”. Afirmou que o governo brasileiro considera o referendo como um “assunto interno” da Venezuela.
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ECONOMIA DA GUIANA
A Guiana tem 214.969 km² e 800 mil habitantes. As línguas oficiais são inglês e idiomas regionais. A moeda é o dólar guianês.
A riqueza do país tem crescido por causa do petróleo na Margem Equatorial. Espera-se que se torne uma nova potência petrolífera na região. A estimativa é que o total de óleo no local seja de 14,8 bilhões de barris. Esse volume corresponde a 75% da reserva total de petróleo do Brasil.
O PIB (Produto Interno Bruto) da Guiana deverá crescer 29% em 2023, segundo projeções do Banco Mundial divulgadas em outubro deste ano. Será o maior desempenho entre os países da América Latina e Caribe. Dados da entidade mostram que o país sul-americano cresceu 43,5% em 2020, 20,1% em 2021 e 63,4% em 2022. Leia a íntegra do relatório (PDF – 6 MB).
O FMI (Fundo Monetário Internacional) estima crescimento de 38,4% no PIB da Guiana em 2023.
HISTÓRIA
Os primeiros colonizadores da região foram os espanhóis, que chegaram em 1499 à região. No século 16, a Guiana passou a ser controlada pelos holandeses. Segundo o Portal Contemporâneo da América Latina e Caribe da USP (Universidade de São Paulo), os holandeses acreditavam que na região poderia estar El Dorado –lenda que dizia existir uma cidade em que havia ouro em abundância.
Em 1616, foi construído o 1º forte holandês em Essequibo. O lugar também serviria como entreposto comercial, administrado pela Companhia Holandesa das Índias Ocidentais. A então colônia holandesa passou a ter como base econômica a exportação de açúcar e tabaco.
Com a implementação de um amplo sistema de irrigação no século 18, a Guiana expandiu o número de terrenos agrícolas, o que atraiu colonos ingleses de ilhas caribenhas.
A população de origem britânica superou em tamanho a holandesa na região no final do século 18. Com a Revolução Francesa e a expansão da França na Europa, os holandeses decidiram passar parte de suas colônias para a administração inglesa para se proteger de uma possível intervenção francesa.
Em 1814, as colônias Essequiba, Demerara e Berbice foram transferidas de forma oficial para a Inglaterra por meio do tratado Anglo-Holandês. O território passou a se chamar Guiana Inglesa em 1931. O país declarou sua independência em 1966, mas continuou integrando a Comunidade Britânica –grupo de ex-colônias britânicas.
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MADURO
O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, 60 anos, comanda um regime autocrático e sem garantias de liberdades fundamentais. Mantém, por exemplo, pessoas presas pelo que considera “crimes políticos”.
Há também restrições descritas em relatórios da OEA (Organização dos Estados Americanos) sobre a “nomeação ilegítima” do Conselho Nacional Eleitoral por uma Assembleia Nacional ilegítima, e da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (de outubro de 2022, de novembro de 2022 e de março de 2023).
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