À saída do Pavilhão de Portugal na COP28, que decorre no Dubai, o Azul conversou com a secretária de Estado da Energia e Clima, Ana Fontoura Gouveia, que vai liderar a delegação portuguesa nos dias de negociações mais técnicas, antes da chegada do ministro do Ambiente e da Acção Climática, Duarte Cordeiro.
Quais são as prioridades de Portugal para as negociações nesta COP28?
Portugal quer assegurar maior ambição por parte de todos os países. Temos feito isso no nosso país. Temos assumido compromissos cada vez mais exigentes, queremos andar cada vez mais depressa. Mas para que consigamos vencer a crise climática tem que ser um esforço conjunto, incluindo das maiores economias. Esperamos que esta COP possa ser um momento para de facto conseguirmos acção. É esse o mote desta COP, e é isso que vimos aqui buscar: acção, compromisso por parte de todos os países, incluindo das maiores economias.
As propostas políticas de Portugal estão coordenadas com a União Europeia, que definiu a sua posição há mais de um mês. Neste contexto, o que é que Portugal pode acrescentar às negociações?
Portugal certamente acrescenta a estas discussões e negociações. Destacaria duas áreas principais. A primeira é que temos demonstrado no nosso país que a transição climática pode ser uma oportunidade de descarbonizar, pode ser uma forma de assegurar emprego, investimento. Isso é algo muito relevante, na medida em que temos outros países que têm que assegurar passos mais ousados, maior ambição, e muitas vezes têm receio que isso comprometa o seu crescimento económico. Portugal tem demonstrado que as duas coisas são perfeitamente compatíveis e, no nosso caso, a transição energética e climática tem sido geradora de oportunidades.
O segundo factor onde Portugal é diferenciador é na nossa relação com África. A iniciativa que acabámos de anunciar de conversão de dívida de Cabo Verde e de São Tomé [e Príncipe] em projectos de investimento climático demonstra que é possível sermos mais inovadores na forma como apoiamos os países em desenvolvimento na sua transição climática. Sobretudo, devemos ter uma abordagem que garanta que estes países têm os meios de que necessitam para eles próprios fazerem o seu caminho de transição com as suas escolhas, criando cadeias de valor nos seus países, assegurando que detêm competências nos seus países para fazerem os seus caminhos.
E os acordos que não fazem parte da declaração final, como o do metano? Poderemos entrar nesses acordos?
O que procuramos fazer nesta fase de Governo de gestão é assegurar que os compromissos que assumimos para o nosso país são compromissos consensuais naquilo que são as políticas públicas em Portugal e, portanto, que não causarão desconforto a qualquer novo Governo. As matérias de transição climática são matérias bastante consensuais no nosso país. Isso é também uma grande vantagem que temos no contexto internacional, porque podemos apresentar-nos como um país de estabilidade, de políticas públicas, designadamente nas políticas de transição climática.
A proposta do Governo sobre o IUC para carros antigos era a proposta mais visível relacionada com a descarbonização e não foi consensual, teve que ser retirada do Orçamento do Estado para 2024. Como vai ser quando começarmos a chegar a mais questões como esta? Conseguimos garantir aos cidadãos que há justiça nesta transição?
A justiça climática é um elemento essencial de qualquer processo de transição. Em Portugal temos tido particular cuidado em assegurar o envolvimento dos cidadãos, em assegurar compensações às comunidades sempre que elas são afectadas por projectos de renováveis, por exploração dos recursos geológicos de que o país dispõe. Essas compensações são muito relevantes para que as populações locais também tenham benefícios directos com a transição energética e climática que está a decorrer.
Mas o factor essencial neste caminho de transição justa é precisamente assegurar uma transição climática que cria empregos. No fundo, essa é a base do bem-estar, do tecido social do nosso país. Temos colocado sempre no centro das políticas de transição climática a geração de emprego, a criação de valor no nosso país, e esse é um elemento que devemos prosseguir.
Naturalmente que podemos fazer mais. Podemos continuar a envolver os cidadãos, mas sobretudo partindo daquilo que é a base territorial, envolver os municípios, as regiões, para que possam escolher os seus caminhos e definir aquilo que são as políticas climáticas que pretendem seguir. É um dos objectivos que temos na Lei de Bases do Clima e será uma área prioritária, certamente, nos próximos meses, nos próximos anos, em Portugal e no mundo, porque esta dimensão local é cada vez mais relevante.
Paira agora em Portugal uma certa desconfiança sobre os processos de transição energética, em particular na sequência do caso que motivou a queda do Governo. Isto é também uma preocupação que se vê aqui na COP, de como as empresas influenciam os processos. Como é que conseguimos não cair nesta ratoeira?
É importante recordar que Portugal tem um quadro legal, tem um quadro normativo, e tem uma administração pública robusta. Depois existem os decisores políticos que têm a obrigação – o dever – de assegurar um equilíbrio de interesses, de objectivos, dentro daquilo que são os objectivos nacionais. As interacções com as empresas são muito relevantes para o trabalho que estamos a desenvolver, porque não teremos transição climática se essa transição não for geradora de valor, de emprego.
O que fazemos é trabalhar de forma próxima com quem quer investir e criar emprego no nosso país, mas também com os municípios, com as comunidades locais, com as associações ambientalistas. No fundo, o que procuramos fazer sempre é manter um diálogo muito próximo, com todos os actores e tomar decisões. Optar pelas políticas públicas que são mais condizentes com aquilo que é o interesse nacional.
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