“Temos medo das grandes empresas em Portugal”. Presidente do CES defende que as empresas precisam tornar-se maiores – Atualidade

Em entrevista à Lusa, a primeira que dá desde que substituiu Francisco Assis à frente do CES, Luís Pais Antunes aplaudiu o pacote de 60 medidas para dinamizar a economia que o Governo apresentou em 04 de julho.

“Tem um conjunto de medidas bastante interessantes e que podem contribuir, de facto, para um novo dinamismo da economia, em particular no que se refere à escala e à dimensão das empresas. Esse [a pequena dimensão das empresas] é um dos motivos que também têm contribuído para um crescimento económico mais anémico” do país, explica o líder do CES.

“Nós vivemos ainda muito na lógica do ‘small is beautiful’ [‘o que é pequeno é bonito’], temos medo das grandes empresas, temos medo que as empresas tenham uma maior escala”, considera Luís Pais Antunes.

O antigo secretário de Estado do Trabalho afirma que o país precisa de empresas mais fortes, maiores, que tenham mais escala, que invistam mais e que paguem melhores salários.

“Não quero dizer com isto, não me interpretem mal, que não é bom ter pequenas empresas. Ter pequenas empresas é bom, mas é bom que elas, a certa altura, passem a médias. Ter médias empresas é bom, mas a certa altura é bom que elas passem a grandes. E as grandes passar a muito grandes”, sublinha.

“Se há matéria sobre a qual há um consenso bastante grande na sociedade portuguesa é que nós temos um sistema fiscal e um nível de tributação que são excessivamente elevados”

Ainda sobre o pacote de 60 medidas apresentado pelo ministro da Economia Pedro Reis, o líder do CES elogia a promessa de baixa do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC).

“Se há matéria sobre a qual há um consenso bastante grande na sociedade portuguesa é que nós temos um sistema fiscal e um nível de tributação que são excessivamente elevados. Por alguma razão, nos ‘rankings’ da competitividade fiscal, estamos sempre nos piores lugares”, sublinha.

Nesta entrevista, o responsável repete o que já tinha dito aos deputados numa audição na Assembleia da República, que em Portugal o salário mínimo nacional (SMN) está muito próximo do salário médio.

A forma de alargar este diferencial é, na opinião de Pais Antunes, “criando riqueza e assegurando crescimento económico, não há outro caminho. […] Não há forma de conseguir esticar os níveis salariais sem que sejamos mais produtivos, mais competitivos, e esse é o grande desafio em que nós, ao longo deste século, temos estado claramente aquém”.

Confrontado com a promessa do Governo de aumentar o salário mínimo nacional para os 1.000 euros no final da legislatura, o presidente do CES concorda que é um valor “perfeitamente razoável”.

“Isso é uma competência e uma responsabilidade do Governo. Essa opção, eu diria, é relativamente consensual, não há uma grande divergência de opinião. Não há quem diga que deve ser o dobro, ou quem diga que deve ser metade. Parece-me um objetivo razoável, desejável e de alcançar”, reforça.

Pais Antunes reconhece ainda que os salários em Portugal estão abaixo da média da União Europeia e isso deve-se ao facto de o país ter “um problema de qualificações, um problema de organização e, muitas vezes, também um problema de gestão”.

“Temos problemas de burocracia em excesso, temos problemas de corrupção. As causas do nosso atraso estão, eu diria, bastante discutidas”, conclui.

Imigrantes e movimentos inorgânicos devem estar representados no CES, defende

Luís Pais Antunes defende também que é “fundamental” ter uma maior representação da sociedade do que aquela que existe atualmente no plenário do CES, devendo este organismo procurar ser “sempre uma fotografia” da sociedade, “tão nítida quanto possível”.

“Apesar de terem sido dados alguns passos importantes na aproximação do CES à sociedade civil, acho que o Conselho ainda está muito afastado da sociedade”, explicou Pais Antunes.

Questionado sobre que setores têm pouca ou nenhuma representação neste Conselho, o presidente deu o exemplo dos imigrantes que atualmente representam uma fatia importante da força de trabalho em Portugal.

“Seria fundamental ter uma maior representação do que aquela que existe atualmente, que é a área de imigração”, refere o líder do CES que admite que é um processo que terá de ser desencadeado já pelo novo plenário.

O plenário do CES é um órgão que alberga 78 conselheiros que representam várias entidades e setores da sociedade, desde o Governo, passando pelas organizações sindicais e patronais, até entidades do setor cooperativo, autarquias, profissões liberais, universidades, etc.

Trazer para dentro do CES os imigrantes não é a única ambição de Pais Antunes que também quer atrair para a organização a que preside alguns movimentos inorgânicos que, nalguns casos, “são muito visíveis e têm um grande impacto, mas têm zero representação”.

“Acho que nós temos que encontrar uma forma de integrar alguma dessa inorganicidade também no universo de uma organização como o CES”, explicou o novo presidente que tomou posse no início deste mês, sucedendo neste cargo a Francisco Assis.

Pais Antunes reconhece que “hoje em dia, existe um nível muito significativo de inorganicidade na sociedade” e que existem “movimentos muito fortes que não estão agrupados nas gavetas tradicionais”. Movimentos que quer trazer para o CES.

Estes movimentos inorgânicos, na opinião do presidente, podem vir a integrar o CES através de sindicatos, de associações ou de outro tipo de organizações.

Apesar desta abertura para integrar representantes de imigrantes e de movimentos inorgânicos no organismo a que preside, o antigo secretário de Estado do Trabalho refere que não se pode cair no erro de aumentar muito o número de conselheiros que integram o plenário.

“Não podemos cair no erro que, a certa altura, em França se caiu, em que já havia centenas de membros no Conselho Económico e Social. Depois afeta a própria eficiência da organização”, alerta.

“Admito que, da mesma forma que há setores que estão sub-representados, haverá setores que estão sobrerrepresentados, em que se justifica uma representação quantitativa menor”, conclui.

Legislação laboral, agenda do trabalho digno e acordo de rendimentos

A legislação laboral é um tema sobre o qual o presidente do CES considera que faz sentido ter na agenda.

Luís Pais Antunes considera que “tem existido um excesso de instabilidade na legislação laboral e, sobretudo, uma linha pouco consistente”, o que leva a que haja “muitas matérias em que se deu um passo em frente, dois passos atrás” e noutras em que se deram passos para o lado.

Acentuando que não tem um discurso crítico da mudança, porque esta é necessária, considera, contudo, que esta deve ser gerida com cuidado, sendo esta leitura válida para a legislação laboral, a legislação fiscal, ambiental ou energética.

“Não acho mal, em si, que haja revisões” e que se tente “encontrar as melhores soluções para os problemas conhecidos. O que acho pouco desejável – e isto vale para a legislação laboral, como vale para a legislação ambiental ou energética – é fazer alterações em harmónio”, disse, notando que esta instabilidade é má para o funcionamento da economia, porque diminui o grau de previsibilidade dos agentes económicos.

Questionado sobre se a intenção de revisitar a Agenda do Trabalho Digno – já manifestada pelo Governo – não vai potenciar esta instabilidade, Luís Pais Antunes remete essa leitura para o Conselho Permanente de Concertação Social (onde têm assento o Governo, as confederações patronais e as centrais sindicais), dizendo apenas que o ritmo das mudanças na legislação deve acompanhar o ritmo das mudanças na sociedade, sendo “normal que haja a tentativa de procurar sempre encontrar as melhores respostas para os problemas”.

Sobre o facto de os tribunais estarem a decidir de forma diferente relativamente à presunção de laboralidade dos trabalhadores das plataformas digitais – uma das matérias legisladas na Agenda do Trabalho Digno – o novo presidente do Conselho Económico e Social (CES) refere que esta divergência das decisões dos tribunais sobre um mesmo tema não é nova e que pode ser ainda prematuro tirar conclusões sobre a clareza da norma.

“Acho normal, em qualquer área, não é um problema da área laboral, é um problema da aplicação do direito em qualquer domínio, em que há decisões contraditórias”, disse, salientando que esta situação provavelmente levará a que mais tarde ou mais cedo haja uma uniformização de jurisprudência pelo supremo tribunal.

Sobre a intenção, também já manifestada no seio da Concertação Social, de revisitar o acordo de rendimentos (assinado em outubro de 2022 e reforçado um ano depois) e o acordo de formação profissional, Luís Pais Antunes remete, também aqui, a questão para os parceiros sociais, notando apenas que tem visto que há um entendimento bastante grande sobre a necessidade de revisitar esses acordos, até porque “há muitos pontos dos acordos que não foram sequer iniciados”.

Sublinhando que revisitar é um termo que tem alguma neutralidade, assinala que revisitar significa “isso mesmo: voltar ao acordo, ver aquilo que já foi feito e o que é que está bem e que deve ser intensificado, o que é que afinal não está a produzir resultados e deve ser reavaliado”.

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