Jovem ganha tornozelo novo em transplante inédito no Brasil: “Meu renascimento”
A história de um transplante inédito no Brasil: apaixonado por futsal, o mineiro Victor Miguel Pereira Valentim, de 17 anos, perdeu os movimentos do tornozelo depois de um tratamento contra o câncer. Ortopedistas estudaram o caso dele e, pela primeira vez, fizeram a cirurgia que pode levar o adolescente de volta às quadras.
Repórter: Quando você tirar esse curativo aí e colocar o pé no chão, Victor?
“Vai ser uma sensação de dever cumprido, né? Vai ser uma alegria imensa, creio que para mim e para a minha família, porque representa o meu renascimento”, afirma.
A vida até aqui tem sido de duras disputas para o menino, que sempre foi apaixonado por bola. Aos 7 anos de idade, Victor perdeu a mãe, vítima de um aneurisma. Aos 10 anos, veio o diagnóstico de leucemia.
“65% das suas células estavam tomadas. Imediatamente, nós começamos o tratamento e, em fevereiro de 2018, ele entrou em remissão. Mas continuou seu processo de tratamento, bem invasivo, através das quimioterapias e corticoides”, conta trabalhador florestal Adriano Valentim, pai de Victor.
Victor mora com o pai, a mãe de coração e o irmão Heitor, em Santa Bárbara, na região central de Minas Gerais.
“Ele queria melhorar. Ele quis, ele teve essa força de vontade, sabe? Isso me ensinou muito. Eu aprendi muito com ele”, conta a dona de casa Alexsandra Maria Duarte Valentim.
O futsal sempre fez parte da rotina do garoto, que jogava na linha. Desde pequeno, ele frequentava as quadras da cidade. Mas, por causa da leucemia, teve que abandonar o esporte por um tempo.
“Futebol é minha vida. Sem ele, eu acho que eu não seria o Victor de hoje”, diz.
Só que o tratamento contra o câncer trouxe efeitos colaterais para o corpo do Victor.
“Devido aos corticoides, que são os remédios, e à quimioterapia. É remédio forte, né? Eu fiz uma primeira cirurgia e pus uma prótese de cimento, mas essa prótese tinha um prazo, um prazo de validade, vamos dizer assim”, conta.
A prótese de cimento ósseo permitiu que o Victor voltasse às quadras como goleiro. Em 2023, ele até disputou um campeonato na cidade com o time da escola e foi importante em momentos decisivos. Fez defesas e até gols, conquistou o título e o coração da torcida. Mas as dores pioraram.
A perda óssea que o Victor sofreu foi exatamente no tornozelo – uma articulação entre o pé e a perna que garante mobilidade. A prótese temporária ficou instalada por quase quatro anos, até que o menino completasse a fase de desenvolvimento e estivesse pronto para uma solução definitiva: um transplante com um novo tornozelo que viria de um doador.
O cirurgião responsável pelo procedimento explica que a técnica já foi usada em outros países e é aplicada dependendo do caso.
“Nós buscamos na literatura saber se havia algum caso e não encontramos nenhum relato de caso desse tipo de transplante realizado no Brasil e também junto aos bancos de osso e tecido. Diante disso, essa cirurgia seria a primeira cirurgia de transplante de tornozelo realizada no Brasil. A vantagem desse transplante é a gente preservar o movimento do tornozelo, sem gerar todo aquele desgaste e permitir que ele faça atividade de impacto”, explica o médico ortopedista Rodrigo Simões Castilho, especialista em cirurgia do pé e tornozelo na Rede MaterDei BH.
Em dezembro de 2023, o Victor foi cadastrado no INTO, Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia, no Rio. O banco de tecidos faz a captação e distribuição de ossos, tendões, cartilagens e meniscos para transplantes. A notícia da compatibilidade veio em maio de 2024.
“É feito, na verdade, toda uma série de medições para fazer os cortes para a utilização da parte da cartilagem com um pouco de tecido ósseo. Me dá muita felicidade quando a gente, inclusive, trocou os exames de imagem com a equipe de Belo Horizonte, nós vimos que realmente tinha o tamanho que fechava perfeitamente. A gente vai trazer qualidade de vida para ele”, conta Rafael Prinz, chefe do Banco de Multitecidos do INTO.
A cirurgia de transplante do Victor foi considerada um sucesso pela equipe médica. Desde então, ele vai todos os dias a um hospital particular em Belo Horizonte para seguir o tratamento na câmara hiperbárica – é uma espécie de cápsula onde ele fica por cerca de uma hora e meia recebendo 100% de oxigênio sob pressão.
“A gente melhora a circulação nos tecidos, a gente tem um controle do inchaço, do edema. Eu vou ter um estímulo na formação de novos vasos que vão auxiliar na cicatrização e também na integração do transplante que foi feito nele”, explica o ortopedista Philipe Maia.
“A expectativa é de que em até seis meses ele já consiga estar andando, e esse transplante sendo incorporado, ele tenha uma vida normal, possa fazer tudo aquilo que ele quer fazer”, afirma o médico ortopedista Rodrigo Simões Castilho.
A família do Victor não sabe quem foi o doador.
“Não vai existir palavras que vão definir essa ação, porque a única coisa que eu posso falar é para que todos nós sejamos doadores, porque vamos estar salvando vidas, vamos estar melhorando a qualidade de vida das pessoas, gente”, Adriano Valentim, pai do Victor.
Victor agora tem mais um sonho: quer ser médico oncologista.
“Eu tenho certeza que conseguirei ajudar crianças que passam e passaram pelo que eu mesmo passei”, afirma Victor.
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