Praticamente todos os imigrantes portugueses no Luxemburgo já precisaram, a dada altura, de enviar caixas para Portugal. Ou de trazer mercadorias de lá para cá. Os “miminhos” de casa, como lhes chama Manu.
Manu para os amigos, é esta a alcunha de César Manuel Ferreira, 43 anos, sócio-gerente da empresa Transportes Carlos & César, sediada em Clervaux, no norte do país. Carlos é o nome do sócio e tio de Manu, que gere a filial em Mortágua, a base da empresa em Portugal. Desde 2015, realizam o transporte de todo o tipo de mercadorias, de lá para cá e de cá para lá, todas as semanas.
“Em janeiro de 2025, fazemos 10 anos”, regozija Manu. Na verdade, a empresa já tem quase 45 anos, porque na altura os dois sócios compraram a antiga Taxis Andrade, que já funcionava há 35. “O meu tio foi motorista da empresa durante 20 anos. Com a ajuda dele, foi fácil. Ficamos com a mesma carteira de clientes”, explica o empresário.
Manu Ferreira
Atualmente, a empresa conta com 6.200 clientes só no Luxemburgo e um número semelhante em Portugal. “Temos empregados lá e cá. Somos cinco ao todo, com uma frota de sete carrinhas, quatro aqui e três em Portugal. E dois camiões subalugados por semana, um para cima e outro para baixo, sempre à quarta-feira”.
O empresário reconhece que, como ele, existem várias outras empresas a fazer transportes do Luxemburgo para Portugal. “Mas não há muitos a fazer todas as semanas como nós”, atira. As carrinhas fazem as recolhas e entregas. No Luxemburgo, funciona por secções e é “preciso muita logística”. À segunda-feira, começam as recolhas no sul do país, enquanto outra carrinha percorre todo o norte ao final do dia.
Na terça-feira, fazem toda a região da Mosele, enquanto um dos funcionários recebe encomendas na capital, no armazém em Hollerich. À noite, carregam o camião, que sai na quarta-feira de madrugada para Portugal. “Chega na sexta-feira às nossas instalações em Mortágua. É tudo distribuído com duas ou três carrinhas, consoante a carga”.
Uma carrinha vai para Seia, na Serra da Estrela, outra para a zona de Coimbra, outra para a Guarda e, à segunda-feira, fica a zona do Porto, para entregas e recolhas. “Em Lisboa fazemos de 15 em 15 dias, às vezes com duas carrinhas, na sexta-feira. Fazemos tudo entre Lisboa e Porto. Temos datas fixas que podem ser consultadas no nosso site”, esclarece Manu.
Mais pessoas a regressar a Portugal
No sentido inverso, sai um camião de Portugal para o Grão-Ducado na quarta-feira à noite. Vêm sobretudo móveis, porque o “mobiliário é mais barato lá”, mas também os tais “miminhos” que os pais mandam para os filhos. “Temos um camião frigorífico uma vez por mês, para as pessoas mandarem tudo o cultivam, a nível de carnes, os frangos caseiros, a batata, muito azeite e vinho… É trazer as memórias de Portugal para o Luxemburgo”.
O transporte é cobrado tanto ao preço unitário, com um euro ao quilo, como ao volume, explica Manu. “Há coisas fora do formato, que são ao volume. As caixas de mudanças, de cerca de 80 litros, ficam à volta de 20 ou 25 euros. Depende para onde vai, se for para Lisboa é 5 euros mais caro, por exemplo”.
Manu Ferreira
O envio da mercadoria é “relativamente rápido”. Se uma pessoa fizer uma encomenda que possa ser entregue ou recolhida à terça-feira e se for para a zona de Coimbra, a mercadoria chega na sexta-feira. “Em três ou quatro dias têm a sua encomenda em Portugal”, garante o empresário.
Para Portugal, as pessoas mandam máquinas de lavar e móveis, por causa das mudanças. Manu acredita que há mais gente a regressar ao país do que a vir de lá para cá. “Atualmente temos muitas mudanças daqui para lá. O Luxemburgo está num ponto de viragem. As pessoas vêm de Portugal iludidas, porque isto já não é o paraíso. Já foi, mas agora não é. É complicado para muita gente. É impossível viver no Luxemburgo só com um salário”.
Os portugueses da capital. Rui Manuel, o patrão dos supermercados Primavera
Nos últimos 10 anos, o negócio manteve-se quase sempre estável, mas tem aumentado o número de clientes após a pandemia, que foi um período mais complicado devido ao encerramento das fronteiras. “Mas de resto, foi sempre a trabalhar. Há cada vez mais pessoas a procurar este tipo de serviço”, reconhece.
Só descansa ao domingo
A nível de grandes mercadorias, como veículos, a empresa só faz o transporte de motas, mas não de carros, que direcionam para outros serviços parceiros. Há muitos pedidos, razão pela qual Manu acredita que o português mudou um pouco de mentalidade nos últimos anos. “Hoje os preços dos alugueres de carros são exorbitantes. Compensa mais mandar um carro para estar em Portugal três ou quatro semanas, do que alugar um carro”.
Manu está sempre ocupado de segunda a sábado. Apesar de viver na Alemanha, passa todos os dias no Luxemburgo. Às segundas e terças, ocupa-se das recolhas e entregas, pois também é motorista e conduz uma das carrinhas. De quarta a sexta, está mais no escritório em Clervaux. A empresa tem um grande pavilhão em Villerupt, na fronteira francesa com Esch-sur-Alzette, e um armazém de apoio em Hollerich. “Aos sábados também fazemos distribuições o dia todo, só descansamos ao domingo”.
Manu Ferreira
É o empresário de 43 que faz toda a gestão do trabalho no Luxemburgo, desde os atendimentos às rotas dos motoristas. Houve uma altura em que Manu também conduzia as carrinhas com as mercadorias até Bordéus, onde trocava com o sócio que vinha de Portugal, mas era “muito cansativo”, recorda.
A parte que mais gosta no seu trabalho é o contacto com os clientes, porque “é muito bom conhecer e falar com pessoas de várias partes de Portugal”. Já a pior parte é o esforço físico, uma vez que algumas caixas são pesadas, com 50 ou 60 kg, que são “enormes para uma só pessoa pegar”. E o trânsito, claro, que é “muito complicado”, tanto no Luxemburgo como em Portugal.
De educador de infância a presidente de clube de futebol
César Manuel é natural de Mortágua e chegou ao Luxemburgo em 1989, com os pais, quando tinha apenas oito anos. Viveu na zona da Mosele, estudou na Bélgica para se formar como educador de infância e chegou a abrir uma creche em Diekirch. Mas não era essa a profissão que realmente o fazia feliz. Em janeiro de 2015, teve a oportunidade de comprar a empresa de transportes com o sócio Carlos.
Manu é casado com uma mulher húngara e tem dois filhos, uma menina de 11 anos e um bebé de 18 meses. Vivem em Arzfeld, na Alemanha. Sempre que pode, vai a Portugal, cerca de umas sete ou oito vezes por ano. Até organiza excursões com grupos de amigos de um clube de futebol alemão, do qual é presidente. “Em 2016 fomos visitar o Porto com 41 pessoas, em 2022 fomos a Lisboa com 56 pessoas e este ano vamos novamente a Lisboa. São todos apaixonados por Portugal e pela gastronomia”.
Os portugueses da capital. Rodrigo, o homem do futebol e da picanha num café de Hamm
O português ocupa o seu tempo livre com o futebol, os amigos e os filhos. Tem saudades do marisco e da “comidinha” portuguesa, mas não pensa em voltar de vez para o seu país. “Os meus filhos vão crescer e estudar aqui. Não há nada que me puxe para voltar para Portugal. Tenciono ficar por cá. O importante é ter saúde e continuar a ter os nossos clientes fiéis, que felizmente são muitos”, conclui.
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