Pesquisa aponta leve recuperação, mas Venezuela ainda sofre com lacunas sociais – Mundo – CartaCapital
A principal Pesquisa de Condições de Vida da Venezuela, a Encovi 2023, foi divulgada nesta quarta-feira (13). Devido à falta de dados oficiais, esta radiografia social é desenvolvida pelo Instituto de Pesquisas Econômicas e Sociais da conceituada Universidade Católica Andrés Bello (UCAB). A análise avaliou critérios básicos da sociedade e evidenciou que “a pobreza multidimensional subiu para 51,9%” no ano passado na Venezuela.
Para retratar a situação foram analisados parâmetros de serviços de saúde, alimentação, renda, educação, moradia, proteção social e emprego com 12.683 famílias em todo o território venezuelano em 2023.
De acordo com os responsáveis pela Encovi, os professores Anitza Freitez e Luis Pedro España, a situação de vulnerabilidade social se estabilizou em 2023. Dados indicam sinais de redução a partir de 2022, quando a pobreza passou de 65,2% para 50,5%. Entre os anos de 2014 e 2021 o empobrecimento da Venezuela foi mais marcante que nos anos posteriores.
A análise aponta que apenas 4,7 de cada 10 pessoas em situação de pobreza extrema trabalha. Em contrapartida, quase sete de cada dez pessoas do grupo mais rico fazem parte do mercado de trabalho.
Os dados multidimensionais da pobreza, de 51,9%, estavam relacionados a condições de moradia, serviços públicos, proteção social, trabalho e educação.
A desigualdade se acentua de acordo com as regiões da Venezuela. Cerca de 19,5% dos moradores da região metropolitana de Caracas afirmam que não podem comer mesmo que tenham fome. Mas esse percentual sobe para 65,9% em Maracaibo, no oeste do país.
A força de trabalho no setor público passou de 35,8% em 2014 para 20% em 2023. Na Venezuela o Estado ainda é o maior empregador do país. No entanto, o número de autônomos chegou a 48,3% à medida que a mão-de-obra dos setores público e privado encolheu motivada pelos baixos salários.
Outro fator que pende na balança social é a disparidade de gênero. A atividade econômica da população masculina chega a 62,7%. No entanto, a taxa feminina é de apenas 37,3%.
Deslocamento externo e interno
Luis Pedro España explicou que a vulnerabilidade social é maior onde os serviços básicos (água, eletricidade, saneamento, saúde e alimentação) são pouco acessíveis.
Por isso, de acordo com o analista, “cerca de 2,1 milhões de pessoas se deslocaram internamente entre 2018 e 2023”. Para 2% a mudança foi motivada pela oferta de serviços públicos. Já 80%, por motivos familiares. Entre as cidades favoritas para a mudança interna estão Caracas, Miranda e Carabobo.
Caracas e San Cristóbal (no estado Táchira, na fronteira com a Colômbia) “são as cidades com menor vulnerabilidade social, enquanto Maracaibo (região oeste) e Maturín (região leste) são as que têm situações mais vulneráveis”.
Tanto Maracaibo como Maturín são estados dependentes da sucateada indústria petroleira do país e tiveram o orçamento público reduzido drasticamente nos últimos anos. Com o agravamento da precariedade na infraestrutura no interior do país, Caracas passou a ser considerada um oásis – onde há maior oferta de combustível, eletricidade e fornecimento de água encanada.
Quanto à emigração, a pesquisa aponta que fatores como a xenofobia e as crises econômicas e políticas afetaram o destino daqueles que buscam melhores condições de vida. Por anos o Peru foi um dos principais destinos. Em 2023 o fluxo foi reorientado aos Estados Unidos e também para o Brasil.
O perfil do emigrante também mudou. O grupo integrado por pessoas entre 30 e 49 anos ultrapassa o de idades entre 15 e 24 – grupo predominante até 2021. Agora há mais emigrantes com ensino médio (29% para 55% nos homens); e menos com ensino universitário desde 2017 (que passou de 46% para 23% em homens).
Em relação à taxa de fecundidade, continua em alta o número de gestantes entre 15 e 25 anos: 45%. Segundo a pesquisa, o segmento mais rico da população tem cerca de 0,9 filho; já o mais pobre tem 3,0 filhos em média.
Evasão escolar
A situação escolar dos venezuelanos teve uma leve recuperação para níveis pré-pandemia, porém a taxa de crescimento estudantil foi baixa até 2023. Cerca de 60% dos alunos frequentam as aulas com regularidade. Já 40% têm frequência irregular por variados motivos, entre eles a falta de alimentação (10%) e greves de professores (30%).
Cerca de 62% dos alunos afirmam ser beneficiários do Programa de Alimentação Escolar (PAE). No entanto, apenas 27% afirmam que estudam todos os dias (contra 44% em 2022).
Cada vez é mais restrito o acesso às escolas privadas. Em 2015, cerca de 34% podiam pagar para estudar. Mas em 2023 esse número caiu para apenas 12%.
Além disso, há um atraso no nível escolar. “Dentro da população escolarizada há um maior atraso que significa que essa população dentro de sua trajetória estudantil foi acidentada. Eles continuam no sistema educacional. É possível que depois da pandemia voltaram ao sistema educativo, mas tiveram uma trajetória acidentada que significa que eles não estão cursando o grau ou ano que lhes corresponde de acordo com a idade. Eles podem ter 14 anos e estão cursando o grau que deveriam cursar aos 12 anos. Eles têm dois anos de atraso”, explica Anitza Freitez, uma das responsáveis pela Encovi.
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