Petrobras de volta à África? Continente tem geologia similar à Margem Equatorial e vive retomada de investimentos

RIO – Depois de encerrar, em 2020, uma presença de quatro décadas na África, a Petrobras mira uma volta às atividades de exploração e produção de óleo e gás no continente – cuja margem oeste possui uma evolução geológica similar à da Margem Equatorial brasileira, segundo estudos.

O diretor de Exploração e Produção da companhia, Joelson Mendes, afirmou, em entrevista recente ao Estadão, que o novo plano de negócios da Petrobras terá a marca da internacionalização presente.

E disse que o ritmo dessa aposta no exterior dependerá, claro, da evolução da licença do Ibama para explorar a Margem Equatorial no Brasil – a nova fronteira exploratória mais promissora do país, mas que enfrenta resistências no órgão ambiental.

“A gente vai colocar de uma forma macro [no planejamento estratégico] a internacionalização. Há descobertas no mundo importantes, como na Nigéria, Angola, Namíbia. A Petrobras saiu, mas pode voltar. Sim, a gente quer voltar”, afirmou Mendes.


O aceno da petroleira à África ocorre num momento em que o país, sob o governo Lula, tenta retomar o protagonismo na política externa e as relações comerciais com o continente.

Em agosto, está prevista a visita oficial do presidente brasileiro à África. Na pauta dessa agenda, o Brasil mira projetos de transição energética – tema que vem despertando interesse, inclusive, da Petrobras.

Mas o que a África tem a oferecer em óleo e gás?

Um relatório recente da Wood Mackenzie destaca que, com a segurança energética de volta ao topo da agenda da indústria petrolífera, as atividades de exploração e produção da África parecem desfrutar de um renascimento.

As grandes petroleiras globais veem o continente com “novos olhos”, sobretudo em oportunidades de projetos de óleo em águas profundas e de gás natural liquefeito (GNL).

“A necessidade [da Europa] de substituir os barris russos perdidos foi fundamental para esse ressurgimento, mas o impressionante sucesso exploratório e a melhoria das condições fiscais em alguns países também foram fatores importantes”, escreveram o diretor de Pesquisa em Exploração e Produção da Wood Mackenzie na África Subsaariana, Gail Anderson, e seu colega Martijn Murphy, analista principal de Upstream da consultoria para o Norte da África.

Há, contudo, uma mudança na rota dos investimentos em relação à presença histórica da Petrobras no continente – muito focada na Nigéria e Angola, por exemplo.

A consultoria destaca que investimentos desses dois países, bem como no Egito, Líbia e Argélia, diminuíram à medida que os campos se tornaram maduros e a relação risco-recompensa se tornou menos atraente. Nesses países, os custos unitários estão aumentando, assim como a intensidade das emissões.

As grandes multinacionais do setor vêm se desfazendo de seus ativos nesses países – comprados, geralmente, pelas estatais (NOCs), empresas locais e fundos de private equity.

No entanto, o investimento geral em exploração e produção na África se recuperou para os níveis pré-pandêmicos e deve permanecer estável.


Veja, a seguir, o gráfico da Wood Mackenzie sobre a evolução dos investimentos em exploração e produção de óleo e gás na África (em inglês)

Fonte: Wood Mackenzie

A Wood Mackenzie espera que o investimento, no continente, migrará efetivamente para o sul e para o leste, à medida que novos projetos saiam do papel em países como Moçambique, Namíbia, Uganda e África do Sul.

A consultoria ressalva, contudo, que muitos dos antigos desafios de se operar na África persistem. Isso inclui os riscos acima do solo, de execução de projetos, longos prazos de entrega, o domínio das estatais no continente e a ausência de mercados de gás bem estabelecidos.


GNL na África Subsaariana e petróleo na Namíbia despertam atenção

A Wood Mackenzie cita as descobertas recentes na Namíbia. Embora as campanhas de exploração ainda estejam em fase de avaliação e testes, a consultoria estima que as descobertas somem mais de 7 bilhões de barris.

“A escala desses campos lhes dará uma vantagem em termos de lucratividade, enquanto os termos fiscais também são generosos na Namíbia. Com preços de equilíbrio [breakeven] muito baixos e altas taxas internas de retorno, essas e outras oportunidades vantajosas parecem destinadas a prosperar”, cita a consultoria.

A África Subsaariana se destaca pelo gás. O interesse pelo GNL ressurgiu, nos últimos 15 meses, na região – que se tornou um local de destaque para projetos de liquefação embarcada (FLNG).

A África, segundo a Wood Mackenzie, possui quase 700 trilhões de pés cúbicos de recursos de gás descobertos – mais do que o suficiente para satisfazer a demanda doméstica.

A expectativa é que o fornecimento africano de GNL dobre na próxima década. Um destino em especial para esse gás é a Europa, que busca fontes de suprimento alternativas à Rússia.

Os conflitos armados e a priorização do gás doméstico para geração de energia elétrica, contudo, são apontados como barreiras para as exportações de gás africano.

De acordo com um levantamento da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) sobre as rodadas de licitação de áreas exploratórias em curso, no mundo, há poucas oportunidades abertas na África hoje – para este ano, a única oferta é a de blocos terrestres em Angola.

Para 2024, a expectativa é que a Líbia volte a licitar áreas – o que o país não faz desde 2007.


As idas e vindas da Petrobras na África

A Petrobras selou a sua saída da África em 2020, por meio da venda da PetroÁfrica, por US$ 1,45 bilhão. Encerrou, na ocasião, um ciclo de quatro décadas no continente – período no qual a petroleira brasileira passou por dez países africanos diferentes, na maioria deles sem sucesso.

Quando sacramentou o desinvestimento, a Petrobras produzia, na Nigéria, cerca de 35 mil barris diários de petróleo – menos do que a companhia produz, em alguns casos, num só poço do pré-sal.

O primeiro destino da Petrobras na África, contudo, foi Angola, em 1979, ainda durante o regime militar, num contexto de uma década marcada pela independência do país africano e pelo segundo choque do petróleo – o que estimulou as petroleiras a buscarem a diversificação de reservas.

A segunda investida na África só ocorreu duas décadas depois, em 1998, já no governo FHC, quando a petroleira brasileira entrou na Nigéria – justamente onde a empresa teve o seu maior sucesso no continente.

A internacionalização da Petrobras, na década de 1990, se deu num contexto bem diferente do atual: a companhia ainda não havia descoberto os grandes recursos do pré-sal e, sem expectativas de contar com suficientes reservas de óleo e gás no Brasil, se lançou rumo à África e Bolívia, por exemplo.

Foi com Lula, nos anos 2000, e no início do governo de Dilma Rousseff, contudo, que a presença da Petrobras na África se acentuou, acompanhando os passos da política externa, sobretudo de Lula – que diversificou as relações internacionais do Brasil e pregava a cooperação Sul-Sul.

Entre 2004 e 2011, a companhia entrou na atividade de exploração de óleo e gás na Tanzânia, Líbia, Moçambique, Guiné Equatorial, Senegal, Namíbia, Gabão e Benin. A empresa, no entanto, jamais produziu nos demais países.

Com o pré-sal no centro de sua estratégia, a Petrobras foi aos poucos tirando a África de seu radar. Foi nesse contexto que, em 2013, a Petrobras formou uma joint venture com o BTG, para investir, junto com um parceiro, e não mais sozinha, na Nigéria. A operação foi, inclusive, objeto das investigações da Lava-Jato.

Não foi só a presença na África que foi revista pela Petrobras desde a crise pela qual a companhia passou a partir de meados da última década. Desde 2015, a estatal saiu de países como Chile, Paraguai, Uruguai e Japão.

A presença internacional da estatal brasileira, hoje, se resume a ativos de exploração e produção nos EUA, Argentina, Bolívia e Colômbia.

André Ramalho

André Ramalho

Jornalista com 13 anos de experiência na cobertura do mercado de energia, é o editor responsável pelo site da agência epbr
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